Empresa está buscando extração de bauxita na área do Caparaó, atingindo mais de 20 municípios
SANTA BÁRBARA DO LESTE – Após as tragédias de Mariana em 2015 e Brumadinho e 2019, as atividades das mineradoras passaram a representar temor para grande parte da sociedade.
Não é diferente para municípios que fazem parte da região do Caparaó, diante do interesse de uma empresa na extração de bauxita, minério destinado à produção do alumínio. Levantamentos apontam que, ao todo, 25 municípios dessa região estão na rota da mineradora, sendo 22 deles situados em Minas Gerais (Manhuaçu, Simonésia, Luisburgo, São João do Manhuaçu, Santa Margarida, Manhumirim, Pedra Bonita, Divino, Sericita, Orizânia, Alto Jequitibá, Matipó, Caratinga, Lajinha, Santana do Manhuaçu, Mutum, Santa Bárbara do Leste, Caputira, Caiana, Faria Lemos, Fervedouro e Caparaó) e outros três no Espírito Santo (Muniz Freire, Ibatiba e Brejetuba).
De acordo com Marcelo Teixeira, representante de Santa Bárbara do Leste na Comissão Regional de Enfrentamento à Mineração, a apreensão dos moradores começou com as primeiras movimentações da mineradora em Manhuaçu. A prefeitura de Manhuaçu revogou 13 certidões de conformidade expedidas em 2020, abrindo o caminho para a extração da bauxita em áreas do Córrego Palmital, Manhuaçuzinho, Manhuaçuzinho de São Sebastião, Córrego Manhuaçuzinho, Palmeirinhas, Monte Alverne, Serra Monte Alverne, Córrego Monte Alverne, Córrego dos Pintos/247, Córrego dos Dutras, Córrego dos Pintos/270 e Fazenda São Pedro do Avaí e Fazenda Titã.
Marcelo começou a participar de reuniões em outubro de 2021, mas, a comissão existe desde 2019. “O assunto da mineração vem muito antes, desde a década de 90, porém, veio ganhando força de uns tempos para cá. A gente sabendo que nosso município está sendo ameaçado por uma mineradora, que está assediando muito nosso município querendo a retirada dessa pedra bauxita, ficamos com medo, claro, porque todas as famílias serão impactadas, tanto da área rural quanto urbana”.
Para Marcelo, muitos serão os impactos que devem ser pensados neste tipo de projeto. “A água do solo será afetada, nossas matas que já não são em grandes quantidades, também serão afetadas e estamos em busca de soluções. Vamos tentar unir todo o povo de Santa Bárbara do Leste. Para isso também tivemos aqui um encontro no último sábado que foi muito importante, uma formação, justamente para conscientizar as pessoas do risco que o município de Santa Bárbara está correndo”.
A preocupação se estende também para outras localidades, por isso, Marcelo acredita que deve haver um esforço coletivo. “Estamos lutando para que a mineração não venha para o nosso município, porque ele é muito rico na agricultura familiar, produz bastante água, é rico em nascentes, inclusive a nascente do Rio Caratinga também é aqui no município de Santa Bárbara do Leste. Pensando nisso estamos procurando defender nosso município, buscarmos alternativas e para isso vamos nos unir igreja católica com outras igrejas, nossa Câmara de Vereadores, as associações, o município e a área urbana”.
MEIO AMBIENTE
Célio Maia, secretário de Agricultura e Meio Ambiente, classifica a questão como “bastante complexa” e chama atenção para o que está sendo questionado em relação à mineração. “Queremos deixar claro é que não somos contra a mineração. Somos contra a forma como se aplica a mineração hoje, com muitos impactos. Sabemos que a mineração é de utilidade pública e tem um poder muito grande na nossa vida, os carros, os utensílios de uma casa, tudo são através da mineração, especialmente do que está se falando em extrair aqui em Santa Bárbara do Leste e na região do Caparaó, que é a bauxita. Mas, o impacto desse tipo de mineração que é utilizado no País hoje é muito agressivo ao meio ambiente, traz danos não só ambientais, mas, também sociais. E é isso que queremos deixar claro. Santa Bárbara, por ser essencialmente agrícola, o impacto vai ser muito grande”.
Ele também destaca uma preocupação regional se tratando de uma possível atividade de mineração nos municípios do Caparaó. “Outro detalhe que queremos chamar atenção não só Santa Bárbara está correndo risco. Vejam bem, nós somos a caixa d’água de Caratinga, costumo dizer que o xixi que nós fazemos aqui afeta Caratinga, Santa Rita e toda a bacia do Rio Caratinga. Então, estamos mobilizados nesse sentido e no que depender do nosso município, a forma como está sendo aplicada as minerações, vamos tentar de toda a maneira não deixar isso acontecer, porque o impacto é muito grande”.
Célio ainda acrescenta que é preciso pensar em danos irreparáveis que podem ser provocados, a exemplo de casos que ficaram famosos e que ainda repercutem em todo o País, “Vemos hoje Brumadinho, o pessoal de Mariana, o impacto que eles já sofriam durante a mineração, antes do rompimento da barragem e agora pior ainda. Ainda não foram ressarcidos de danos e o que é pior, as vidas que se perderam e a gente não quer isso aqui para Santa Bárbara, priorizamos a vida aqui no nosso município. Vamos enfrentar de forma razoável, sensata, porque queremos uma mineração que não impacte a vida e para nós o impacto será imenso, pois, sobrevivemos da agricultura familiar. E a agricultura familiar dá safras infinitas, a mineração dá uma safra só. Essa safra única, os problemas ambientais ficam com a gente e os problemas sociais vão permanecer”.
Se tratando de recursos hídricos, a atividade de mineração também apresenta preocupação para os moradores de Santa Bárbara do Leste. “O lençol da nossa região é muito raso, superficial, então, qualquer tipo de extração vai contaminar nossos lençóis. E sabemos que isso é irreversível, o lençol uma vez contaminado, vai estar sempre contaminado. Não queremos isso, depois eles vêm, retiram a matéria daqui, levam e nós ficamos com os prejuízos. Por isso queremos conscientizar a população, dependemos de água, se a mineração é de utilidade pública, a água é essencial à vida do ser humano”.
APOIO DA IGREJA CATÓLICA
Padre Valcy Ribeiro Soares, pároco em Santa Bárbara do Leste, destaca o apoio da igreja católica também no sentido de impedir a atividade mineradora. “No dia 9 de abril, último sábado, promovemos uma manhã de estudo e reflexão de enfrentamento ao processo de mineração em nossa região, tendo a participação de representantes de cada uma das comunidades de nossa paróquia, bem como do legislativo e executivo de nosso município. O principal ponto de defesa é a Demarcação da Região do Caparaó como um Território Livre de Mineração. Sabemos que se trata de uma região com grande relevância ecológica e um importante patrimônio hídrico, sendo referência na produção de alimentos, destacando assim o que conhecemos bem de perto: a riqueza de nossa agricultura familiar. É de extrema importância avaliar os impactos (negativos) socioambientais e culturais provocados por esse tipo de atividade. Para isso, faz-se necessário um envolvimento sério e responsável de todos os setores da sociedade de modo que toda e qualquer decisão a esse respeito vise não apenas um benefício particular e imediato, mas o bem de toda a comunidade”, finaliza.