Thelma Regina Alexandre Sales
Ninguém é perfeito até que você
se apaixone por essa pessoa.
Cupido é uma figura popular e antiga que tem origem na mitologia greco-romana. Na imagem, o deus alado tem como alvo o coração, onde uma flecha o atravessa. Provavelmente o coração foi escolhido como símbolo da paixão por causa da taquicardia e da sensação de fogo no peito quando encontramos com alguém que julgamos ser nossa cara-metade. No entanto, toda essa importância atribuída ao coração, na verdade, é de responsabilidade da cabeça. Todas as sensações da paixão ocorrem no cérebro e resultam da combinação de componentes bioquímicos, fatores culturais e genéticos que provocam sintomas intensos e avassaladores em todo o corpo. Os mais evidentes são o aumento da pressão arterial, da frequência respiratória e dos batimentos cardíacos, a dilatação das pupilas, os tremores e o rubor, os suspiros, suores e olhares perdidos, além de falta de apetite, redução da concentração e memória e insônia.
A dopamina é uma das responsáveis pelas descargas de emoções para o coração e artérias. Conhecida como o neurotransmissor da alegria e da felicidade ela é liberada no organismo para potencializar a sensação de que o amor é perfeito e maravilhoso. Nessa situação ocorre euforia, coragem e disposição para realizar novas tarefas. O tempo é curto para tudo o que leva à insônia e à inapetência. A paixão supre quaisquer necessidades. O mecanismo cerebral da paixão é idêntico ao de se viciar em cocaína, onde se observa o desejo de que aquele momento nunca acabe. Da mesma forma que a paixão pode causar dependência quando nos enamoramos, ao nos distanciarmos nosso organismo responde com sintomas similares ao da abstinência.
Pesquisas recentes demonstram que algumas estruturas do cérebro se mostram mais ativadas em pessoas apaixonadas: o núcleo caudado, a área tegmentar ventral e o córtex pré-frontal, zonas ricas em dopamina e endorfina, que juntos estimulam os circuitos de recompensa, os mesmos que nos proporcionam prazer em comer quando sentimos fome e em beber quando temos sede. Assim, até com contatos distantes, apaixonados liberam mais endorfina e dopamina, responsáveis pela sensação de prazer.
Outras moléculas, como a feniletilamina e a noradrenalina, participam da química da paixão. A noradrenalina auxilia a memória para novos estímulos. Por isso, apaixonados lembram-se de detalhes triviais quando na presença de seus amados (ex. roupa, voz, atos). Hormônios, como a oxitocina e vasopressina, responsáveis pela formação dos laços afetivos mais duradouros e intensos (ex. mãe e filho), também tendem a aumentar nas fases agudas da paixão e predispõem posteriormente uma relação estável. Mais um elemento envolvido com o processo da paixão foi identificado em 2005. Trata-se do NGF (o mesmo que causa sudorese nas mãos), que está elevado nos primeiros meses.
Já a serotonina, que acalma e tem efeito contra o estresse, está diminuída em cerca de 40% no cérebro dos apaixonados, percentual próximo à redução desse neurotransmissor no transtorno obsessivo compulsivo (TOC). Esta pode ser a explicação para o pensamento incontrolável, atitudes inesperadas e fixação numa única pessoa na fase aguda da paixão. A diferença para o TOC é que na paixão há normalização das taxas de serotonina em semanas ou alguns meses e o organismo se adapta para dar oportunidade a um sentimento mais sólido, que é o amor, ou não. A serotonina ainda está diminuída nos apaixonados em função do aumento da produção de hormônios sexuais, que facilitam a aproximação e a formação de pares estáveis.
A paixão desembarca no cérebro a partir da adolescência, assim como tudo na vida tem tempo para começar e terminar. E não poderia ser diferente, pois as alterações químicas são tão intensas que se durarem tempo demais, o organismo entra em colapso.
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Thelma Regina Alexandre Sales – Nutricionista e Médica – Especialista em Psiquiatria – Especialista em Terapia Nutricional/SBNPE – Especialista em Nutrição Clínica/UECE – Especialista em Saúde Pública/UNESCO – MBA em Gestão de Negócios/UNEC – Mestre em Meio Ambiente, Saúde e Sustentabilidade/UNEC – Professora do Centro Universitário de Caratinga. Atua em Psiquiatria, Clínica Médica e Urgência.