* Kelly Aparecida do Nascimento
Tenho uma filha bebê. Ela é o meu maior amor, tenho por ela um sentimento positivo e incondicional que não tem fim. Desde que nasceu tudo que faço na vida é pensar na felicidade e no futuro dela. Em pouco tempo de experiência posso dizer que filhos são o mais importante de tudo que temos em nossas vidas.
Certo é que essa minha fala é comungada pela maioria dos pais, que apresentam sentimentos semelhantes em relação aos seus filhos. Pais amam profundamente, sofrem pelos seus filhos e dão a vida por eles. E o amor é o sentimento puro que rega a ligação dos primeiros em relação aos segundos, demonstrado por um vínculo afetivo intenso, capaz de doações próprias, que vai até o sacrifício. O amor dos pais é expresso através de carinho, de ternura, de cuidado e de zelo.
Aos pais atribui-se ainda a responsabilidade de que sejam referenciais de integridade para os filhos, que tenham a honestidade como princípio do caráter, entre outros tantos comportamentos que sejam positivos. Precisam abrir um canal de comunicação seguro com seus filhos. Essa responsabilidade é infinitamente grande, notadamente no momento histórico de redefinição do conceito de família.
Apesar de toda essa “carga” atribuída aos pais, a maioria desses filhos nunca faria/fará as mesmas coisas pelos seus genitores. Como afirma Melissa Salles: “Filhos? A realidade é que você sentirá o maior amor do mundo por eles e esse mesmo amor eles nunca sentirão por você”. Dura realidade, mas as estatísticas não falham e apontam para esse caminho.
Essa prosa sobre a relação entre pais e filhos me remete às lembranças das rodas de modas de viola que acompanhei durante toda a minha infância e adolescência vividas na roça. Meu pai, grande admirador das músicas sertanejas raiz, sempre pedia para que os violeiros tocassem a clássica moda “Couro de boi”, de autoria de Teddy Vieira e Palmeira, muito conhecida na voz dos saudosos Tonico e Tinoco. A letra dessa música me chama muita atenção pela realidade da história que conta, embora tenha sido escrita em 1954. Assim ela inicia: “Conheço um velho ditado desde os tempos dos zagaio, diz que um pai trata dez filhos, dez filhos não trata de um pai” (…). A moda discorre sobre um pai idoso que foi morar com o filho, mas a sua esposa exigiu que o mandasse embora. Então, o filho vai falar com o pai para sair de sua casa e lhe dá um couro de boi para lhe servir de coberta onde ele fosse dormir. Ao ver o avô partindo o neto de 8 anos vai atrás dele e chora lhe pedindo um pedaço do couro. O avô comovido divide o artefato ao meio e o entrega para o menino. Ao voltar para casa o pai lhe pergunta o que fará com aquele pedaço de couro e a moda assim é finalizada com a fala do filho ao seu pai: “um dia vou me casar, o senhor vai ficar veio e comigo vem morar. Pode ser que aconteça de nós não se combinar esta metade do couro vou dar pro senhor levar”.
Esse final da música soa como uma súbita pancada e resume-se no fato de que os filhos de hoje parecem não perceber que os idosos de amanhã serão eles e que também poderão incorrer da mesma experiência que condicionam os seus idosos pais. Isso significa que hoje são eles a entregar um couro de boi; no entanto, em um futuro próximo, estão suscetíveis a recebê-lo de seus filhos, que ora poderão se espelhar nas atitudes e comportamentos que assistiram dos seus pais, na situação de filhos, com os seus avós. Talvez esta lição possa transformar, mesmo que tardiamente, a forma com que filhos percebem os idosos pais e futuramente a si mesmos. Se não aprender pelo amor, quem sabe pela dor da experiência de receber um pedaço de couro de boi em um tempo futuro.
Enfim, os idosos de hoje são os pais que há algumas décadas criaram seus filhos, a maioria das vezes, com muito sacrifício, dificuldades e renúncias. Apesar disso, ocorre que as tendências atuais ainda apontam caminhos como os descritos na moda “Couro de boi”. Conforme dizia Shakespeare, “ter um filho ingrato é mais doloroso do que a mordida de uma serpente”…
Por isso, filhos, de todas as idades, convido-os a compor a minoria das estatísticas, comportando-se como uma prole agradecida, contribuindo como exemplo positivo aos filhos que já tem ou que virá a ter. Como diz o velho ditado: quem planta colhe! E colhe exatamente o que plantou.
Diante disso, sempre que tiver uma oportunidade, diga a seus pais que os ama e o quanto eles são importantes na sua vida. Saber que seu último gesto em relação a eles foi de carinho e de amor será fundamental para a tranquilidade da sua consciência. Você não sabe o aconchego que seu coração terá se o inesperado acontecer, já que os últimos momentos são os mais lembrados junto aos nossos que partiram para a outra vida.
*Profª M.Sc. Kelly Aparecida do Nascimento Bacharel e Licenciada em Educação Física. Licenciada em Pedagogia. Mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade. Professora do Centro Universitário de Caratinga – UNEC.
Mais informações do autor (a), acesse: http://lattes.cnpq.br/12867154411002