CARATINGA- Na última quinta-feira (2), o professor Cláudio Leitão comemorou 70 anos, mesmo ano em que a Rede de Ensino Doctum completa 85 anos de atuação. As datas emblemáticas se cruzam com a história do crescimento e desenvolvimento de Caratinga.
Com o objetivo de celebrar esta trajetória, o professor está desenvolvendo um projeto multicultural que resgata a memória de sua vida e, consequentemente, da região.
LIVRO
O projeto conta com um livro de memórias que está em produção desde dezembro do ano passado. O objetivo não é ser um registro biográfico, mas sim um resgate da história a partir de sua ótica. “Todo mundo que me conhece sabe que sou muito verbal. Sou mais de falar do que de escrever e a fala, o canto, sempre foram as duas formas de me expressar, comunicar. Mas, existia uma demanda que partiu primeiro dos meus filhos, depois de amigos, que eu sempre contava muita história, muitos casos que envolviam nossa cidade, pessoas da Educação, Política… Eles ficavam me cobrando já há muito tempo que eu escrevesse um livro”.
A obra, que conta com a edição do consultor de Comunicação, Juliano Nery, será dividida em 10 capítulos que reúnem fotos, registros e um olhar pessoal a respeito da expansão da Rede de Ensino Doctum, das mudanças no cenário educacional contemporâneo e dos fatos históricos nos quais o professor vivenciou. “Tudo aquilo que habita minhas lembranças, do que fiz, do que vivi, senti, me emocionei, trabalhei. Estamos no oitavo capítulo. São sete anos em cada capítulo. É claro que meus primeiros sete anos precisaram do apoio das minhas irmãs. Elas me ajudaram a escrever um pouco como era esse menino que nasceu na casa do reverendo Uriel e da dona Mariana, sou o quinto. Sempre fui uma pessoa de muito compromisso com a sociedade, com a comunidade, o motor da minha vida partiu da indicação de um País tão desigual. Tudo que fiz, faço, todo caminho que tomei é realmente para que pudéssemos ter uma sociedade mais igual, feliz e justa”.
Dentre os fatos históricos que estão citados, a ditadura, a Constituição de 1988 e a retomada da democracia. “Posso dizer que participei de uma forma muito efetiva nesses movimentos. Até nesse capítulo a gente brinca com as três coisas: família, militância e trabalho. Mas, aí ficava invertido: militância, família e trabalho. Vai ser muito legal porque tem informações ali que acho que é possível a partir delas refletir sobre o que estamos vivendo hoje”.
Ele enfatiza uma trajetória de muita luta. “Lutei contra a ditadura, participei do processo de início da democratização, mas, vi também um recuo daquilo que esperávamos que a democracia brasileira caminhasse, aprofundasse a participação popular de uma forma efetiva organizada em cada canto do País, para garantir esse processo. Não só falo isso, como cito exemplos aqui na nossa cidade de desmonte da participação popular”.
Para Cláudio, isso causa “muita dor”, pois o levou a ficar 16 anos sem votar. “Acho que democracia e política não é eleição. Eleição é um elemento pequeno às vezes, de um processo de democratização. Então, é refletir porque nossa democracia está tão ameaçada e tão frágil. Por que não avançou como devia avançar?”.
Leitão frisa que sua história de luta é motivo de honra. “Tenho muito orgulho disso, entreguei 15 anos da minha vida a uma militância, inclusive clandestina, expondo a minha vida, por acreditar que a democracia, o diálogo, o amor, são fundamentais. O ódio não constrói nada. É a coisa capaz de destruir tudo. Só o amor constrói. É um amor de querer bem ao outro, à sua comunidade, ao seu País, àqueles que passaram o que passaram para chegar ao Brasil amordaçados, acorrentados. O querer bem é fundamental. Não acredito em nada que se apresente de forma odienta. Nada disso vale a pena. Para mim a vida é a coisa mais importante, é o dom maior. Como diz Lenine, a vida é tão rara, a vida é tão cara”.
MÚSICA
Durante sua trajetória, a música também sempre esteve presente. Por isso, Cláudio Leitão, em parceria com vários amigos, e participação especial do seu sobrinho e musicista Nathan Leitão, está produzindo um projeto musical que vai acompanhar a obra literária.
O objetivo é reunir canções que marcaram a sua vida e, a partir de diferentes formatos culturais, contar a sua história. A ideia é disponibilizar o acesso em um QR Code no livro, para que o leitor tenha a experiência da leitura aliada às canções. “O violão sempre me acompanhou desde o início da minha juventude, sempre cantei. Outra cobrança era gravar e sempre fui postergando isso. Mas, agora, chegando aos 70 anos resolvi, até devido à pandemia, ficando mais em casa, mais reflexivo. Não que eu saiba tocar, nunca tive aula. Sempre toquei violão com muita emoção, expressava através do canto e música. Gosto de cantar, expressar meus sentimentos, minha indignação, minhas bandeiras, minhas convicções”.
Professor Cláudio explica o projeto musical foi trabalhado paralelamente como se fosse a trilha sonora de sua existência. “Quando estava fazendo serenata aos meus 16 e 17 anos em Caratinga, que músicas eu tocava? Eu tocava muito essa ou essa… Também as músicas de protesto, de luta…Pensando nesse repertório de músicas durante a vida, já estou com umas oito gravadas em estúdio, às vezes, sozinho outras com participação de amigos e parentes”.
Reforçando sua natureza musical, Cláudio Leitão cita Lenine, com a canção “Envergo, mas não quebro”. “Uma múscia de muita sabedoria, que diz: Eu posso ir até ao fundo do poço, mas volto depois sorrindo. Até o final do ano espero estar concluindo e divulgando esse projeto para minha querida cidade, esse cantinho do mundo que brinco com outros. Perguntam: “De onde você é?”. Respondo que sou da capital do mundo. Eles riem, perguntando onde é a capital do mundo. Caratinga, claro. Do meu mundo”.
CASARÃO DAS ARTES
Além do livro e das músicas, o professor está produzindo também um trailer inspirado em um dos capítulos da obra. A produção audiovisual tem duração de cerca de 15 minutos e reúne imagens, entrevistas e fotografias do acervo pessoal da família Leitão e da Rede Doctum.
O diretor e roteirista do documentário é Américo Galvão. O projeto multicultural vem coroar um trabalho de resgate da cultura e da memória do povo caratinguense, realizado há muitos anos pelo professor e idealizador da Fundação Cultural Casarão das Artes.
Desde sua inauguração em 2012, o espaço pertencente à Doctum abriu as portas para acolher os mais diversos projetos artísticos: teatro, música, cinema, literatura, palestras, artes plásticas e dança. Além disso, o espaço abriga grandes obras, como as de Millôr Fernandes. No acervo pessoal do cartunista, o público tem contato com a vida e a obra dele. Foram doados, por Ivan Fernandes, filho do escritor, mais de cinco mil livros de Millôr para a Fundação.
A valorização cultural que o espaço proporciona será lembrada pelo aniversariante. “Vou falar da semente, das ideias iniciais do Casarão das Artes. Sempre fui militante da cultura de alguma forma. Senti nossa cidade precisando desse grande reforço. É um dos projetos que mais superou minhas expectativas, que me dá um grande orgulho e talvez um dos mais sólidos para continuar. A arte é fundamental, permanente. A cultura e a história. E quero tocar lá no Casarão, vamos treinando. Já aplaudi tanta gente lá, quero ser aplaudido lá também (risos)”, finaliza Cláudio Leitão.