Graziela Angelo, editora e apresentadora do JORNAL DA 89 FM, fala da relação notícias/internet, da profissão de jornalista e de como a Rádio Cidade se adaptou a esses novos tempos
Graziela Angelo é outra de nossas referências. Começou sua carreira em 1992 como locutora. Depois apresentou telejornal local por oito anos. De 2000 a 2008 foi assessora de comunicação da Prefeitura de Caratinga; lecionou disciplinas no curso de Jornalismo das Faculdades Integradas de Caratinga (FIC), por sete anos, e retornou para o rádio para compor a equipe de jornalismo da “Cidade”, onde atua como editora e apresentadora do JORNAL DA 89.
Então ninguém melhor do que ela para fazer um panorama da relação notícias/internet. Afinal, esse admirável mundo novo da internet todos os dias nos apresenta surpresas. Graziela Angelo também fala sobre sua profissão e de como a Rádio Cidade se adaptou ao mundo digital.
A Rádio Cidade tem contato enorme com seus ouvintes, que passam informações. Como é feita a triagem das notícias que vão ao ar?
O principal critério é o mais tradicional e objetivo do jornalismo, o interesse público. Às vezes o ouvinte faz uma queixa legítima, mas que diz respeito a uma situação muito particular. Nós ouvimos e orientamos, por exemplo, a procurar a justiça ou o poder público primeiro. O importante é sempre ouvir, porque não deve-se cobrar do cidadão a compreensão plena do que é notícia para o veículo de comunicação.
Por quais processos passou a Rádio Cidade para se adaptar ao mundo digital?
No que diz respeito à estrutura, um grande investimento tem sido feito nos últimos anos na atualização de equipamentos. Mesmo antes da digitalização do rádio (processo ainda em curso no Brasil), as emissoras que pretendem disputar o mercado oferecendo um conteúdo de qualidade e agradável aos ouvidos têm que substituir microfones, mesas, processadores de som para oferecer mais qualidade no processamento e na transmissão. A Rádio Cidade tem feito isso há algum tempo. Hoje, a 89,1 FM tem um transmissor em condições de se adaptar rapidamente à tecnologia digital. São investimentos que demandam conhecimento do que há de mais moderno e eficiente no campo tecnológico e, também, programação financeira.
Falando sobre o universo da Internet, a primeira providência que tomamos na nova fase da empresa, após a desvinculação do Grupo Sistec, há nove anos, foi a implantação do site. Nele publicamos todas as matérias produzidas pelo jornalismo, divulgamos e abrimos espaço para participação nas promoções, além de outros campos de informação sobre transmissão de jogos, agenda cultural, etc. Pelo site também é possível ouvir a programação ao vivo ou ouvir e ver, ao mesmo tempo, o locutor trabalhando, através de uma câmera instalada no estúdio principal.
Pouco depois da criação do site, intensificamos as postagens na fan page, no endereço facebook.com/radiocidade89fm. Hoje, um percentual significativo do nosso público nos acompanha e interage conosco pela Internet por meio de várias ferramentas. Além de ouvir a rádio pelo site, há quem opte pelo aplicativo para smartphone e muitos participam da programação via WhatsApp. Pelo “Whats”, inclusive, sustentamos nossa atividade jornalística, municiada pelos vários grupos que integramos, contando com parcerias imprescindíveis.
Cada vez mais o uso de tecnologias se agrega ao jornalismo, assim como à vida das pessoas. Todo mundo – e qualquer um – difunde informação. A internet e as redes sociais se tornaram um antro de disseminação de mentiras e desinformações. Por que isso acontece e como o jornalismo pode ajudar nisso?
Notícias falsas ou equivocadas se disseminam, porque a Internet é aberta a todo tipo de contribuição. A facilidade de conexão entre pessoas do mundo inteiro, rápida e simples de ser operada é que fez dela o que ela é. Não é possível acabar com as fake news, mas é possível contrapor a informação apresentando a verdade, checando o conteúdo. Já vi amigo da rede social compartilhando conteúdo equivocado mais de uma vez. Se o assunto me permite, copio como resposta uma informação confiável explicando que aquilo não procede. Daí pra frente o julgamento é dele. Faço isso como amiga.
Já como jornalista penso que os veículos de comunicação devem fazer jus à reputação que têm. As pessoas acessam páginas de empresas jornalísticas, porque esperam encontrar ali informação de credibilidade. Em meio à velocidade de produção de conteúdo, a checagem dos fatos, o compromisso com a mensagem postada, veiculada ou impressa nunca deve ser comprometido. Essa sim é uma boa estratégia de combate à desinformação.
Como a senhora analisa o futuro da profissão de jornalista?
Não consigo ver claramente esse futuro. O que vejo agora é um número muito reduzido de pessoas se interessando pela profissão. Atribuo esse comportamento, principalmente, ao mercado de trabalho. As profissões mais almejadas são aquelas que prometem prosperidade financeira. O jornalismo está muito longe do topo dessa lista. Concursos públicos com bons salários, quando surgem, são para pouquíssimas vagas, quando não para uma única. Os poucos que investem na carreira estão mais concentrados nas grandes cidades, focando no trabalho em assessorias ou nas grandes empresas.
A senhora é a favor da obrigatoriedade do diploma para jornalistas?
A questão já está até desgastada, de tão debatida. Muitas pessoas associam a não obrigatoriedade do diploma ao esvaziamento das faculdades. Como disse anteriormente, pra mim, esta não é a primeira causa. Os cursos de jornalismo já vinham fechando muito antes disso, enquanto as salas de publicidade, propaganda e marketing continuavam cheias. São poucas as vagas, o mercado paga mal. É isso.
Quanto ao diploma, propriamente, defendo a formação educacional. É evidente que o jovem que passou pela faculdade está mais preparado para a função e o que mais precisamos neste país é de EDUCAÇÃO. Sem ela não há avanço. Quando se despreza um diploma para qualquer profissão, a meu ver, está se desvalorizando a educação.
Mas é preciso considerar o contexto. Acho que no interior, por exemplo, o diploma para as empresas não deva ser essencial. Há pouca mão de obra qualificada. Se o candidato tem boa redação e aptidão para o ofício, com o passar do tempo, ele pode se transformar em um bom repórter, redator ou, quem sabe, até editor. Graduados das escolas de Letras ou História, por exemplo, normalmente têm grande afinidade com o jornalismo e podem se desenvolver bem nesta área.
Já quem almeja colocações mais elevadas, em veículos especializados, de atuação nacional ou abrangência internacional, ou mesmo quem quer exercer a profissão com excelência, a faculdade de jornalismo é pouco. Conheço jornalistas de rádio (um veículo que “aparentemente” exige menos) com mais de uma pós-graduação e mestrado.
Existia aquela premissa de que o jornalismo deveria ser isento e não tomar partido. Mas hoje o que vemos é cada vez mais os veículos no Brasil tomando partido. O que pensa disso?
Precisa ficar claro o que é “tomar partido”. Falando dessa maneira parece algo como defender seu time de futebol no bate-papo da esquina. Veículo de comunicação não deve “tomar partido” nesse sentido, porque estaria defendendo uma posição por interesse particular, privado. Em alguns casos, infelizmente, “toma-se partido” por motivação financeira. O papel da imprensa é informar, expor a realidade, orientar, contextualizar, conscientizar. Quem influencia determinada tendência de opinião com “segundas intenções” não faz a boa imprensa.
Porém, falando exclusivamente da nossa realidade, se a imprensa brasileira se limitasse a apenas informar perderia a oportunidade de ampliar a visão do público, esclarecendo questões que ele, sozinho, dificilmente conseguiria alcançar. A opinião com um forte tempero de análise contribui para a cidadania. É isso, por exemplo, que estamos vendo com frequência em vários programas jornalísticos que têm se debruçado sobre a Operação Lava a Jato. Graças a comentaristas e analistas conseguimos compreender o que tem motivado as várias fases da operação, fazer associações entre os nomes citados e perceber o impacto dela no nosso cotidiano. Esse é só um exemplo de uma contribuição extremamente importante que o jornalismo pode e DEVE dar.
Opinião QUALIFICADA é sempre bem-vinda se devidamente identificada – numa coluna, painel de debate, editorial, comentário… O que não é ético é mascará-la em um pretenso texto informativo para persuadir a opinião pública. Se apresentada com clareza, honestidade e qualidade, presta-se um grande serviço a uma população que ainda está aprendendo a se interessar por assuntos além das editorias de polícia e esporte.
A senhora já foi professora de Jornalismo. Falando especificamente dos veículos impressos, o que eles tem de fazer para se aproximar do seu público?
Ir onde o público está e ele não está mais em casa esperando o jornal para ler enquanto toma o café da manhã. Antes disso ele já acessou o site de notícias do seu celular. Ele não está mais em pé na banca pagando pelo exemplar do dia, porque até mesmo na pequena cidade em que mora tem um site que já publicou as principais notícias das últimas horas com texto, foto, áudio e, em alguns casos, até vídeo. Seria, então, o fim do impresso? Para alguns, sim. Mas para quem encara os desafios com criatividade ainda há muito o que apresentar.
Se as pessoas estão na Internet, é pra lá que ele deve ir. O contato com o papel ainda satisfaz alguns leitores que ao longo da vida mantiveram este tipo de relação com o jornal. Mas e as novas gerações que não vão viver essa experiência? O período é de transição e adaptação para todos os veículos. O rádio passa por isso também. Temos que compreender que lugar cada um deve assumir. O que oferecer para atrair a audiência. Seriam matérias especiais? Abordagens exclusivas? Posição editorial diferenciada no mercado? Todas as possibilidades devem ser consideradas e experimentadas.
A imprensa tem realmente este poder de influir nas opiniões e decisões das pessoas?
Sim, acredito que sim. Elas se balizam muito no que veem, leem e ouvem para emitir suas opiniões. No Brasil, grande parte desse poder continua concentrado nas Organizações Globo, que praticamente unifica o discurso nacional. E até nesse aspecto a Internet colabora, abrindo espaço para difusão de perspectivas diferentes, originadas de grandes grupos representativos, das minorias e de cada cidadão, em particular.
Hoje existe uma ansiedade enorme nas redações para divulgar a notícia primeiro, mesmo sem a apuração completa. O leitor realmente quer esse imediatismo?
A Internet e as redes sociais chegaram para deixar os jornalistas ainda mais loucos! Na era da datilografia a pressão para fechar matérias e noticiários já deixava os cabelos brancos. Agora, além de garantir a produção dos conteúdos nos moldes mais tradicionais, também é preciso adaptar a informação para o meio eletrônico e isso tem que ser feito o mais rápido possível. A notícia já é velha pouco depois de ter nascido.
Ainda estamos aprendendo a fazer isso. Mas uma coisa é certa, uma nova atividade foi acrescentada à redação e, por isso, grandes empresas jornalísticas decidiram criar, já há algum tempo, editorias de redes sociais e web. São pessoas contratadas exclusivamente para alimentarem o ambiente virtual dos veículos. Um departamento que monitora a “temperatura” das notícias na Internet e adapta a produção para o formato adequado a cada ambiente – Facebook, Twitter, site, blog, etc. No interior isso é muito difícil, pois as redações são muito enxutas. A receita é se empenhar para fazer o melhor, controlando o nível de ansiedade para não comprometer a saúde (e isso não é exagero ou figura de retórica).
Uma coisa é certa, o veículo de comunicação que quiser sobreviver tem que estar na web. Não tem escolha. Como fonte considerada confiável, esse veículo deve corresponder à expectativa do internauta. E o que ele espera? Agilidade de acesso à informação, facilidade para encontrar o que deseja, objetividade e interação.