No Dia Mundial da Água, os CBHs que compõem a Bacia Hidrográfica do Rio Doce provocam uma reflexão sobre poluição nos rios e a necessidade de pensar a recuperação de forma integrada.
DA REDAÇÃO – O filósofo Tales de Mileto dizia que “a água é o princípio de todas as coisas”. Compreendemos o seu pensamento quando observamos que ela é fator fundamental para a garantia da vida e também para o crescimento econômico e social das nações. Para fomentar uma consciência e promover o debate sobre esse bem tão precioso, a Organização das Nações Unidas, instituiu 22 de março como o Dia Mundial da Água. A data foi sugerida na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, e passou a ser comemorada em 1993.
Na data, o Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce) juntamente com os Comitês de rios afluentes, propõem uma reflexão sobre a nossa relação com o recurso. A existência da água possibilitou o surgimento de cidades e o desenvolvimento da agricultura, pecuária e indústria. Porém, nossos rios, que no passado eram locais de descanso e lazer, se tornaram motivo de conflitos, além de escoar dejetos e rejeitos.
Na Bacia Hidrográfica do Rio Doce, a poluição é uma realidade crônica – vale lembrar que, segundo dados do IBGE, o Rio Doce é o 10º manancial mais poluído do Brasil, sendo que o baixo percentual de tratamento de esgotos compromete o consumo da água em seus usos múltiplos. Essa realidade foi agravada no dia 5 de novembro de 2015, devido ao rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, que espalhou uma onda de lama ao longo do curso do rio.
Diante desse cenário e da necessidade de uma nova consciência em torno da água, os CBHs reforçam que o processo de recuperação do manancial é lento e depende de todos os afluentes que integram a bacia hidrográfica. É preciso enxergar e trabalhar a região de maneira integrada, em rede.
A fim de garantir a qualidade e quantidade das águas, ações de revitalização nos rios afluentes do Doce estão sendo executadas pelos comitês. Nos próximos cinco anos, aproximadamente R$ 174,8 milhões – provenientes da cobrança pelo uso da água – serão investidos, priorizando programas ligados à recuperação de nascentes e projetos de saneamento.
SANEAMENTO EM FOCO
A promoção da universalização do saneamento é prioridade na Bacia do Rio Doce. Nos últimos anos, através do Programa de Universalização do Saneamento (P41), foi financiada pelos Comitês a elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSBs) de mais de 150 municípios da bacia que não possuíam o documento e nem recurso para sua execução. A partir de 2016, os recursos alocados no programa serão investidos na elaboração de projetos de Sistemas de Abastecimento de Água. Também será viabilizada, por meio do Programa de Saneamento da Bacia (P11), a elaboração de projetos de Sistema de Esgotamento Sanitário. Já o Programa de Expansão do Saneamento Rural (P42) trabalhará com a implantação de sistemas de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto para população rural, com aproveitamento racional e disposição adequada dos resíduos coletados.
RECUPERANDO NASCENTES
Responsáveis pela manutenção dos rios e córregos, as nascentes são essenciais para a qualidade e quantidade de água na bacia. Pensando nisso, um programa foi colocado como prioridade nas ações dos Comitês para os próximos cinco anos. O Programa de Recomposição de APPs e Nascentes (P52), que consiste no levantamento de áreas críticas e prioritárias para recomposição ou adensamento de matas ciliares e de topos de morro, além de caracterização e recuperação de nascentes e áreas degradadas. As ações do P52 serão potencializadas através de programa que será implantado na bacia: o de Controle das Atividades Geradoras de Sedimentos (P12) – que consiste na elaboração de diagnóstico específico, com mapeamento, identificação a campo, caracterização de processos erosivos e proposta de remediação de áreas degradadas geradoras de sedimentos, especialmente os relativos às estradas vicinais e caminhos de serviço das propriedades rurais.
USO RACIONAL NO CAMPO
Cientes da importância do uso consciente dos recursos hídricos no meio rural e por se tratar da principal atividade econômica da bacia, o Programa de Incentivo ao Uso Racional da Água na Agricultura (P22) foi criado com o objetivo combater o desperdício de água no campo. Através da utilização de recursos oriundos da cobrança pelo uso da água, o programa financia a instalação e acompanhamento de um equipamento que indica, de forma simples, quando e quanto irrigar: o irrigâmetro. Os participantes são indicados pelo Comitê de Bacia Hidrográfica ao qual pertencem, tendo como critérios de seleção o tipo de cultura, a localização geográfica e a zona de conflitos. Após serem selecionadas, as propriedades são visitadas por técnicos, que analisam o tipo de solo, o sistema de irrigação e as culturas exploradas. A partir das informações coletadas, o aparelho é personalizado.
Dia de Campo do Programa de Incentivo ao Uso Racional da Água na Agricultura (P22), realizado em Inhapim, na Bacia Hidrográfica do Rio Caratinga. Na região, 40 produtores rurais foram beneficiados através do programa (Divulgação CBH-Doce)
A BACIA
A Bacia Hidrográfica do Rio Doce possui área de drenagem de 86.715 quilômetros quadrados, dos quais 86% estão no Leste mineiro e 14% no Nordeste do Espírito Santo. Em Minas, é subdividida em seis Unidades de Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos (UPGRHs), às quais correspondem as seguintes sub-bacias e seus respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica (CBHs): Rio Piranga (DO1), Rio Piracicaba (DO2), Rio Santo Antônio (DO3), Rio Suaçuí (DO4), Rio Caratinga (DO5), Rio Manhuaçu (DO6). No Espírito Santo, não há subdivisões administrativas, existindo CBHs dos Rios Santa Maria do Doce, Guandu e São José.
O Rio Doce tem extensão de 879 quilômetros e suas nascentes estão em Minas, nas Serras da Mantiqueira e do Espinhaço. O relevo da bacia é ondulado, montanhoso e acidentado. No passado, uma das principais atividades econômicas foi a extração de ouro, que determinou a ocupação da região e, ainda hoje, o sistema de drenagem é importante em sua economia, fornecendo água para uso doméstico, agropecuário, industrial e geração de energia elétrica. Os rios da região funcionam, ainda, como canais receptores e transportadores de rejeitos e efluentes.
A população da Bacia do Rio Doce, estimada em torno de 3,5 milhões de habitantes, está distribuída em 228 municípios, sendo 202 mineiros e 26 capixabas. Mais de 85% desses municípios têm até 20 mil habitantes e cerca de 73% da população total da bacia concentra-se na área urbana, segundo dados de 2007. Nos municípios com até 10 mil habitantes, 47,75% da população vive na área rural. As bacias do Piranga e do Piracicaba, com o maior Produto Interno Bruto (PIB) industrial, concentram aproximadamente 48% da população total.
A atividade econômica na área é diversificada. Na agropecuária, lavouras tradicionais, cultura de café, cana de açúcar, criação de gado de corte e leiteiro, suinocultura, dentre outras. Na agroindústria, sobretudo a produção de açúcar e álcool. A região possui o maior complexo siderúrgico da América Latina, ao qual estão associadas empresas de mineração e reflorestadoras. Destacam-se, ainda, indústrias de celulose e laticínios, comércio e serviços voltados aos complexos industriais, bem como geração de energia elétrica, com grande potencial de exploração.
Possuindo rica biodiversidade, a Bacia do Rio Doce tem 98% de sua área inserida no bioma de Mata Atlântica, um dos mais importantes e ameaçados do mundo. Os 2% restantes são de Cerrado. Pode ser considerada privilegiada, ainda, no que se refere à grande disponibilidade de recursos hídricos, mas há desigualdade entre as diferentes regiões da bacia.