A carga tributária brasileira hoje gira em torno de 31,64% do PIB, abaixo da carga tributária média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 33,9% do PIB. Para termos uma ideia comparativa, os Estados Unidos têm uma carga tributária de 25,4% e o Japão de 24,3%. Considerando o aspecto global, o Brasil tem uma carga tributária alta, mas dentro da média dos países desenvolvidos, especialmente se considerarmos que comparativamente, sem discutir a qualidade dos serviços prestados, temos mais obrigações sociais públicas, universais e “gratuitas”, do que Japão e EUA.
Isso não quer dizer que o sistema tributário brasileiro seja justo ou que não devemos reformá-lo. A situação é que diante do quadro fiscal do governo nacional, dos estados e dos municípios a discussão não passa pela redução de receita tributária. Nem mesmo o Governador Zema, eleito com essa bandeira de redução dos tributos e filiado ao Partido Novo, que defende redução a todo custo, não tem se comprometido com essa pauta. Pelo contrário, o Governo de Minas Gerais fez diversas atualizações de base de cálculo sobre a substituição tributária, o que elevou a arrecadação.
Tenho falado em diversos simpósios, palestras e eventos que o foco deveria ser um só: simplicidade tributária. O cidadão e o empreendedor, que já paga muito imposto, tem uma dificuldade enorme de saber o quanto deve pagar. Além disso, o sistema privilegia diversos segmentos em detrimento de outros.
O Brasil passou mais de 10 anos debatendo se a crocs era um sapato ou uma sandália. Em 2009, a importadora da cros foi autuada porque classificou seu produto como sandália e teve que pagar uma multa. Passou, então, a classificar seu produto como sapato, conforme a decisão da CAMEX. Em 2017, foi autuada novamente, porque classificou seu produto como sapato. Segundo o fiscal, era sandália. Na justiça, depois de longa discussão, decidiu-se que crocs era uma sandália. O direito tributário consegue transformar a celebre disputa entre biscoito e bolacha numa decisão a ser tomada por ministros de tribunais superiores.
As discussões tributárias judiciais somadas chegam a 5 trilhões de reais. A tabela tributária de importação tem mais de 10 mil códigos. Contadores, advogados, consultores são contratados e, muitas vezes, custam mais do que o tributo. Nem eles se sentem à vontade com isso e com a instabilidade do sistema. Um mero despacho fiscalizatório demora anos para ser analisado pela justiça. Em alguns casos, por juízes abarrotados de processos das mais diversas temáticas.
Uma vez recebemos uma visita de um advogado tributarista inglês em um escritório que trabalhei. Quando ele viu o arquivo dos processos em curso, se assustou. Na Inglaterra, um escritório de grande porte teria menos do que 5% do estoque de processos que tínhamos.
O sistema brasileiro, além de caro, é um Frankenstein. Nem os Municípios, Estados e Receita Federal se entendem sobre as regras. Além disso, há um número enorme de regimes especiais, deduções, créditos e débitos, créditos presumidos que tornam o sistema complexo, injusto, regressivo e caro.
Se o sistema fosse, pelo menos, mais simples, já destrava muito a indústria e o comércio, gerando empregos, produtos e girando a economia. E posso apostar que se a gente tivesse um sistema mais neutro, com menos deduções, mais linear, com menos diferenciações entre produtos, segmentos, setores e com menos escolhidos e privilegiados, teríamos mais arrecadação em razão da melhora do ambiente econômico com um ônus menor para todos os brasileiros.
Jamir Calili – advogado, professor de direito da UFJF/Gv e vereador em Governador Valadares