Ildecir A.Lessa
Advogado
A Venezuela parece que passou o país a ser mais conhecida devido sua crise interna de ruptura. A situação da Venezuela está exposta na mídia brasileira, diariamente. O tema da crise da Venezuela é amplamente discutido no Brasil, principalmente por tratar-se de um país vizinho, e que tem provocado forte fluxo de refugiados. Além disso, o governo socialista do atual presidente Nicolás Maduro é alvo de críticas recorrentes na mídia brasileira.
Mas, onde começou a crise na Venezuela? Numa reflexão, para entender suas origens é preciso fazer uma retrospectiva histórica, já que os acontecimentos recentes se somam aos acontecimentos históricos para construir a realidade atual do país. A República Bolivariana da Venezuela é um país da América do Sul, que faz fronteira com o Mar do Caribe, com a Colômbia, com o Brasil e com a Guiana. O país se situa em um território conhecido por suas grandes reservas petrolíferas, sendo que o petróleo e suas variações representam cerca de 96% das exportações do país, levando os governos venezuelanos, historicamente, a utilizarem o mesmo como foco das políticas econômicas.
Nessa reflexão histórica, observa-se que, a partir do governo de Juan Vicente Gómez (1908-1935), quando as reservas de petróleo começaram a ser exploradas, consolidando o Estado Nacional Venezuelano como o principal exportador mundial de petróleo para os EUA, o que fez com que o país desenvolvesse uma forte dependência com o mercado estadunidense. A Venezuela se beneficiava do aumento do preço do barril, como, por exemplo, na década de 70, quando as Crises do Petróleo foram responsáveis por grandes aumentos no preço dessa commodity, já que a oferta do mesmo estava diminuindo, gerando prosperidade para o país durante a presidência de Carlos Andrés Pérez, de 1974 a 1979. O então presidente anuncia uma série de ajustes de caráter liberal – inclusive um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) -, que resultaram em um aumento dos preços dos combustíveis e das passagens. Insatisfeito, o povo foi às ruas no movimento conhecido como “Caracazo”, o qual aconteceu em fevereiro de 1989 e deu respaldo para uma tentativa de golpe. Nesta tentativa, participou Hugo Chávez, que foi preso. Quando foi solto, concorreu às eleições presidenciais e foi eleito em 1998. Hugo Chavéz ocupou o cargo de presidente da Venezuela durante 14 anos, eleito por 3 mandatos seguidos, e governou o país com base em ideais diferentes dos governos passados, mas ainda assim o petróleo era o principal produto de exportação venezuelano. Apesar de Chávez como presidente, havia grupos de oposição na própria população venezuelana. Isso pode ser visto pela tentativa de golpe de Estado que sofreu em 2002, quando a crise na Venezuela era política.
O ex-presidente venezuelano manteve a economia e as exportações do país com base no petróleo, não diversificando os setores significativos de exportação de produtos. E, por isso, enquanto os preços dos barris de petróleo estavam em alta, a Venezuela conseguiu lucrar muito com a exportação deste produto. Durante os anos que esteve como presidente, nacionalizou setores estratégicos (reservas de petróleos, telecomunicações, eletricidade, etc.), de grande importância para a Venezuela. Ao fazer tudo isso, acabou por contrariar e afastar investimentos internacionais no país. Em meados de 2011, Chávez faz um anúncio na televisão afirmando que estava com câncer, tendo que fazer diversas operações e portanto precisando se ausentar no governo. O então Ministro das Relações Exteriores, que seria seu vice na candidatura de Chávez do ano seguinte, Nicolás Maduro, passou a ganhar destaque, tendo que ser o representante oficial do governo em múltiplas ocasiões. Em 2012, houve uma nova eleição para escolher o futuro presidente do país. Chávez teria como principal adversário o então governador do estado de Miranda, Henrique Capriles. Essa foi a eleição mais disputada. Mesmo assim, Hugo Chávez é escolhido pelos venezuelanos para continuar seu mandato por mais 6 anos.
No entanto, dois meses após ser empossado para o seu quarto mandato seguido, Chávez morre, tendo assim que ser feita uma nova eleição. Maduro é escolhido como o candidato para seguir o legado chavista, enquanto Capriles é novamente o candidato da oposição. A eleição novamente é disputadíssima, mas Maduro se elege por uma pequena diferença. A produção venezuelana desacelerou porque a PDVSA, empresa estatal de petróleos de Venezuela, sofria com infraestrutura precária, devido a já mencionada falta de investimentos no setor industrial e aos escândalos de corrupção.
Em 2014, protestos populares tomaram conta das ruas em oposição ao governo de Maduro, que repreendeu fortemente a população. Não há como explicar a crise na Venezuela sem falar das sanções econômicas impostas ao país pelos Estados Unidos. A rivalidade com os Estados Unidos se intensificou, e o país começou a aplicar fortes sanções econômicas à Venezuela. Em Janeiro de 2019, a autoproclamação do líder do Parlamento venezuelano como Presidente Interino levou à uma enorme escalada da crise na Venezuela. Agora, o país vive um contexto ainda mais complexo: possui dois presidentes reconhecidos internacionalmente, cada um apoiado por diferentes países. Juan Guaidó, o presidente autoproclamado, é fortemente apoiado pelos Estados Unidos, que pressionam cada vez mais pela queda do governo de Maduro. Somente assim, pode-se entender um país em ruptura, como a Venezuela.