Thelma Regina Alexandre Sales[1]
A dependência química é um flagelo social de grandes proporções que emite um terrível sentimento de impotência à sociedade.
Uma das variáveis comprometedoras para a recuperação de um dependente químico (DQ) é a atitude incorreta perante o dependente ou a negação de que existe um problema pela família. Quando a situação se torna incontrolável, a ponto de não ser possível ignorar o fato, sobrevém a falsa crença dos familiares: a convicção de que seu DQ é diferente de qualquer outro usuário de droga e que superará a dependência utilizando-se de alternativas como praticar esporte, viajar, fazer algum tratamento paliativo e outros. Ignorando o tamanho real do problema, a família – por vezes – acaba facilitando ao usuário o uso de drogas – mesmo que inconscientemente -, protelando uma tomada de decisão que induza ao tratamento.
Não obstante o DQ seja o foco, seu tratamento deve sempre começar pela família, que precisa entender sua posição de codependência para romper com o ciclo negativo de atitudes e reações familiares dependentes.
Quando toda a família se posiciona de forma a não tolerar o comportamento do adicto, é aí que o DQ começa a pensar em se tratar. Sendo assim, é necessário que a família reinvente formas alternativas de se relacionar com o problema, por meio de orientações como as descritas a seguir:
Regra número 1 – Nunca se sujeitar às imposições do DQ. Este não tem o direito de dar fim à vida de toda a família e amigos. Crianças que crescem ao lado de pessoas adictas (que não estejam em recuperação), por exemplo, terão maior probabilidade de virem a desenvolver personalidades aditivas também. Por isso, um NÃO da família ao DQ não é ato de abandono ou crueldade. É um ato de compreensão acerca da própria incapacidade de prestar-lhe ajuda. É perceber que precisam do apoio de pessoas mais preparadas para isso. É compreender que ao ceder às manipulações do DQ as possibilidades de ajuda externa se esgotarão e em consequência se manterá um ciclo negativo que prejudicará não só o DQ, mas todos que o rodeia. O DQ precisa experimentar perdas, precisa compreender a forma insegura como dá seguimento à sua vida a fim de que possa se responsabilizar pelas consequências de suas atitudes.
Regra número 2 – Ceder aos desejos do DQ não é atitude de amor. Familiares devem ser firmes em suas decisões de tratar o DQ. Por isso, NÃO devem ceder aos seus desejos. NÃO podem negligenciar, justificar ou acobertar erros decorrentes do vício. NÃO devem permitir serem explorados e precisam ser críticos o suficiente para perceberam as diferentes formas de manipulação ou chantagens utilizadas pelo adicto. Nenhum tipo de “pacto” ou “acordo” deve ser estabelecido com o DQ.
Regra número 3 – Buscar ajuda especializada: a família deve compreender que está diante de uma doença grave e mortal, um flagelo social de enormes proporções que emite um terrível sentimento de impotência.
Regra número 4 – A família deve manter-se saudável física e emocionalmente: sensibilizar-se de que não é responsável pela dependência do familiar, mas é responsável pela forma como o mesmo se comporta diante da dependência química. A escolha de ajudar o DQ a evitar o consumo de substâncias deve ser modulada por adequado estabelecimento de limites, acolhimento, orientações e tratamento. Pessoas que convivem com usuários de drogas são mais suscetíveis às crises de estresse e distúrbios nervosos decorrentes da convivência com adictos.
Regra número 5 – Fazer exercício diário de integridade moral: o DQ não vê pessoas, ele vê “objetos”. Não por ser mau, mas por estar doente. Ele manipula para sobreviver. Não é empático e não agradece porque não vê o outro enquanto pessoa que se propõe a ajudá-lo. Por isso NÃO deve haver negociações com o DQ. Os familiares devem manter a postura da integridade moral: falar a verdade, NÃO ceder às manipulações e NÃO manipular, NÃO negociar, NÃO “comprar” a confiança do DQ (ex. “se você parar de usar eu te dou isso), NÃO se humilhar, NÃO implorar, NÃO dramatizar. NÃO ameaçar, NÃO acusar, NÃO reacender erros passados, pois isso só implicará em sentimento de raiva e frustração e não ajudará na mudança de comportamento do DQ. Também é aconselhável NÃO mascarar, NÃO desculpar e NÃO proteger o DQ das consequências naturais da adição. Do contrário, os familiares serão “cúmplices” da perpetuação dos comportamentos irresponsáveis ou inadequados do adicto. Por fim, NÃO usar “jogos de culpa” com o DQ (ex. “Se você gostasse de mim, pararia de usar drogas”).
Regra número 6 – Apostar e acreditar na recuperação do DQ: compreender que a dependência química é uma doença crônica e que, mesmo com tratamento, a personalidade aditiva do DQ estará sempre latente. Na maioria das vezes o tratamento inicial exige internação, sendo esse o primeiro passo para as demais intervenções. O tratamento não deve ser interrompido sob o risco de minar as chances de recuperação.
Regra número 7 – Após reabilitação da dependência química, o adicto requer vigilância e autocontrole para o resto da vida e em quaisquer situações. A doença produz memória, que reacende sempre que o DQ entra em contato com a droga.
Thelma Regina Alexandre Sales – Nutricionista e Médica – Especialista em Psiquiatria – Especialista em Terapia Nutricional/SBNPE, Nutrição Clínica/UECE e Saúde Pública/UNESCO – MBA em Gestão de Negócios/UNEC – Mestre em Meio Ambiente, Saúde e Sustentabilidade/UNEC – Professora do Centro Universitário de Caratinga. Atua em Psiquiatria no Núcleo de Apoio Psicopedagógico (NAP) do Centro Universitário de Caratinga e no CAPS infantil de Inhapim. Atua ainda em Medicina de Família e Urgência.