Eugênio Maria Gomes
No primeiro dia útil do mês de agosto, recebemos a notícia sobre a “nova” prisão do senhor José Dirceu, desta vez em função da “Operação Lava Jato”. Novidade mesmo na história foi prender quem já fora condenado e deveria, então, estar preso.
E foi na manhã deste mesmo dia, ao receber a ilustre visita da amiga e presidente do Centro Espírita Bezerra de Menezes, senhora Ana Maria dos Anjos, que também recebi a inspiração para escrever sobre o assunto. É que ela, após o meu comentário sobre a nova prisão do condenado no processo denominado de “Mensalão”, disse-me o seguinte: “Eles não têm vergonha na cara, mas a gente fica com vergonha prá eles”.
Ela está certa. Impressionante como ex e atuais ministros, senadores, deputados, prefeitos, empresários e profissionais de toda espécie são processados, detidos sem que se perceba neles o menor sinal de vergonha. Eles dão entrevistas, circulam pelas ruas, como se nada estivesse acontecendo. Falam de milhões daqui, milhões de lá, em contas e mais contas no exterior, em “laranjas”, como se estivessem passando uma receita de bolo. A tal “Delação Premiada”, que é o coroamento da “semvergonhice” do sujeito e ele presta o seu depoimento com aquele risinho sarcástico, cínico, como se estivesse prestando um grande favor ao Brasil.
Sinceramente, quando assisti à cena do Dirceu saindo de casa – onde cumpria prisão domiciliar por conta da pena recebida em um julgamento-, escoltado pela Polícia Federal, com destino à prisão preventiva – por conta de outro processo que também o investiga por suspeita de corrupção – fiquei com vergonha. Fiquei com vergonha por ele, pelas pessoas, por mim e pelo Brasil.
Fiquei com vergonha, principalmente, depois que li a reportagem sobre Julie Hamp, a cidadã americana que assumiu um dos mais altos postos da Toyota, no Japão. Contratada para ser a primeira alta executiva da gigante japonesa, a americana foi flagrada na Alfândega de Tóquio transportando o analgésico oxicodona, proibido no Japão. Como lá – diferentemente do acontece aqui, no Brasil -, o que é proibido é levado a sério, ela foi presa e teve que se explicar. Mais: além de estar respondendo a processo foi imediatamente convidada a se demitir da empresa, apenas trinta dias após a sua mudança para a principal cidade da maior área populacional do planeta.
Julie perdeu um dos empregos mais almejados do mundo por conta de remédios para dor de cabeça. Aqui, são milhões e milhões de dólares extraviados e os responsáveis só largam o osso depois que são instados a dormirem na cadeia. Aliás, o próprio Dirceu, enquanto hóspede do CPP – Centro de Progressão Penitenciária – em Brasília recebeu verbas do “Petrolão”, conforme ficamos sabendo agora.
Sim, eu estou com vergonha. E a minha vergonha nada tem a ver com questões políticas, partidárias. Até porque, dos candidatos a presidente da república nos últimos pleitos, ainda não se levantaram dúvidas relativas à honestidade, apenas, sobre a Marina Silva. Sinceramente, espero que seja “ainda” mesmo. Menos porque sou adepto de suas ideias e mais para poder ter alguém na Política nacional que sirva de referência para alguma coisa. Eu fico com vergonha por todos os condenados, por todos os investigados e, até, por todos os citados nos processos e que não se dão ao trabalho de vir a público provar – não apenas rebater críticas – sua inocência.
Outro ponto que me causa vergonha e desafia o meu entendimento é o fato de políticos sempre tidos como sérios, paladinos da Justiça, perseguidos pelo “Regime Autoritário”, recebidos pelo povo como heróis, donos de uma biografia invejável, considerados “salvadores da Pátria” se enveredaram nessa podridão criada pelo desejo do poder, do dinheiro. E o que dizer de tantos empresários, empregadores, considerados como detentores de uma inteligência acima da média, empreendedores e que, agora, se apresentam como corruptores, cujos negócios só foram adiante por conta da propina que distribuíram com quem lhes fornecia serviços? Vergonha!
Essa vergonha que me queima o rosto justifica o não entendimento da falta de vergonha de todos eles! Envergonho-me, também, de mim mesmo, por perceber a minha complacência com tudo isso.
Além da vergonha, tenho medo. A impressão que tenho é que foi puxado um fio de novelo de lã, daqueles bem grandes e que apenas parte dele foi desenrolada. Não sei onde isso vai dar, mas pressinto que não será em coisa boa.
Espero apenas, que toda essa podridão a que assistimos diariamente nos possibilite reconhecer que a causa de todos esses males, não se deve a D. João VI, como alguns dizem, numa alusão de que os males nacionais se instituíram desde o aparecimento do país. Espero apenas que, finalmente, possamos reconhecer que a causa de todos esses males está na forma como nós, cada um de nós, conduz sua vida, seu comportamento para com o outro, para com a comunidade e para com a Nação, pois uma nação próspera e íntegra só se constrói com cidadãos íntegros, com cidadãos honestos!
Eugênio Maria Gomes é escritor, professor e pró-reitor de Administração da UNEC.