Ildecir A.Lessa
Advogado
No Brasil fragmentado, o Chefe do Executivo Nacional, conseguiu blindagem na votação da Câmara dos Deputados, que derrubou na quarta-feira (2) a abertura de uma ação penal, enquanto ele ocupar o Palácio do Planalto. Isso é sintomático porque, mesmo acusado de corrupção e acossado por outras acusações judiciais, o presidente provavelmente conseguirá blindagem do Congresso contra novas denúncias.
Não deixa de ser o Temer um presidente acusado de corrupção, sem apoio popular. As pesquisas disponíveis, de opinião, apontam para uma impopularidade nunca vista. Então, como um presidente sobrevive no cargo? A matemática eleitoral aponta para uma completa dissociação de representação política em relação ao eleitorado de modo geral. No seio do Congresso, existe algo, como uma caixa-preta imune ao que se passa fora. Isso certamente explica a razão do presidente conseguir obter uma blindagem, cuja natureza é a mesma corporação de composição parlamentar que derrubou a presidente Dilma Rousseff.
Esse tipo de blindagem foi usada com o ex-deputado Eduardo Cunha, mas não prevaleceu, foi traído por todos. Até o momento, essa corporação tem se mostrado capaz de blindar o presidente. O preço é alto, com a degradação política e a emergência de tipos políticos deploráveis. O custo Brasil da manutenção de Temer é a degradação progressiva da representação política, sobretudo quando parlamentares encaminham propostas de reforma eleitoral que vão degradar ainda mais as conquistas do Brasil no campo da representação política, como o pluripartidarismo. No Brasil, todos sabem disso, os representantes não representam os representados. Os representantes se fazem representar no governo. É uma degradação profunda do sistema de representação. Contudo, a história tem registros de que, todo sistema político tem um ponto de ruptura. Não existe sistema político perfeito. No curto prazo, a quebra será pela perda da estabilidade fiscal, porque operadores do mercado financeiro não vão tolerar a quebra fiscal. A ninguém interessa isso. Mas “essa estabilidade fiscal” é uma dificuldade para Temer, porque, para se sustentar legalmente, esse governo tem de esgarçar a questão fiscal, ser leniente, promover anistias.
Esse condomínio governista tem um alto preço. Não há amigos ali. É possível que, na segunda ou terceira denúncia de Janot, se as elites desertarem do governo Temer por um quadro de degradação fiscal e paralisia das reformas, por que mantê-lo? Se for possível colocar outra peça que assuma com compromisso de tentar recolocar o carro nos trilhos, tal como se pretendeu com a derrubada da Dilma. Foi pra isso que ela foi derrubada. A questão de Dilma ter sido derrubada por pedalada fiscal figura muito dúbia. A prática de conseguir apoio pela liberação preferencial de emendas, sempre existiu. O fator agravante é que todo mundo está sob foco da hiper-judicialização. Os juízes e promotores são cuidadores do bem público. E há um choque da classe política degradada com o sistema Judiciário hipertrofiado pela Constituição e pelas motivações políticas que esse segmento tem. Grande parte da insistência em manter o quadro atual tem a ver também com riscos do que pode acontecer com pessoas se saírem do poder. Certamente, Temer pensa nisso todo dia. A Presidência da República é um refúgio para Temer e seus assessores. Mas o que sustenta Temer não é só a degradação parlamentar e a capacidade infinita de ultrapassar limites, que todos sabem, são inaceitáveis. O inaceitável é renegociado a cada dia. Tem a ver também com a funcionalidade de Temer para grandes interesses que comandam a vida brasileira. Enquanto a classe empresarial entender que ele é fiador das reformas, isso é elemento fundamental para manutenção do governo, levando em conta que falta um ano e meio para o governo atual acabar. E qualquer quadro de substituição, mesmo que seja o deputado federal Rodrigo Maia, pode provocar incerteza, instabilidade. Se Temer ultrapassar o limite da responsabilidade fiscal, como está ultrapassando agora, esse é o ponto de risco. Esse é o ponto de quebra. Seria a inviabilização do programa. O programa do governo é apontar a proa do barco. Ao que tudo indica, vivemos um verdadeiro presidencialismo de ilusão. Um presidencialismo de decomposição, de regressão. Com a ação da corporação parlamentar, que visa defender interesses cada vez mais pessoais, com o presidencialismo de decomposição, lutando pela permanência no cargo, juntamente com seus pares, entendendo a classe dominante, que Temer é o fiador das reformas e seus interesses, vai remando até 2018, provocando a cada dia a fragmentação do País chamado Brasil!