Adenilson Souza Cunha Júnior*
Todo início de ano letivo é assim, recebo dezenas de ligações dos amigos para saber o que penso sobre matricular a criançada – seus filhos – mais cedo na escola, para que eu ajude a esclarecer as melhores propostas pedagógicas, indique escolas que adotem melhores projetos, etc. Como pano de fundo, sempre a preocupação de que as crianças tenham contato cada vez mais cedo com a educação formal e sejam melhor “preparadas” para a vida. Aliás, esse é o mote de todo marketing que tem se constituído em torno das instituições privadas de Educação Infantil: utilizar a acepção da palavra preparação como sinônimo de sucesso, realização e obviamente aprovação futura em exames de larga escala como o ENEM e nos vestibulares das melhores universidades do país. No entanto, a nossa preocupação enquanto educador é com a lógica da educação como negócio tem produzido uma Educação Infantil escolarizada.
A primeira etapa da Educação Básica vem aos poucos deixando de ser orientada como referência os documentos da área: um espaço de socialização, interação e trocas, onde se brinca, imagina, fantasia e deseja para se antecipar conteúdos sobre alfabetização e matemática, estabelecendo, ainda que de forma invisível, um “currículo” a ser observado pelos educadores com uma finalidade quase sempre comum, que é a de alfabetizar a criança cada vez mais cedo. Na verdade, esses efeitos negativos vêm se consolidando e ganhando respaldo através de uma política equivocada, induzida pelo atual governo com sua Base Nacional Curricular que considera que nossas crianças devam estar alfabetizadas até os sete anos de idade.
A Educação Infantil possui uma trajetória que necessita ser resguardada. Essa etapa da educação precisa ser alicerçada em práticas pedagógicas que procure estimular a curiosidade das crianças, através de ambientes lúdicos, onde o jogo, o brincar e o brinquedo sejam ferramentas que provoquem o desenvolvimento cognitivo e afetivo das crianças. Para além disso a Educação Infantil é um espaço onde as potencialidades motoras, de cooperação e interação, autonomia e desejos se manifestam. O desenho, a música, a pintura fazem parte desse emaranhado universo que deve colocar a criança como protagonista do processo de aprendizagem e produtora de cultura, sempre valorizando a infância como etapa primordial para o desenvolvimento das crianças.
Escolarizar a Educação Infantil incide em retirar das crianças o direito de ter infância, reduzir a escola de crianças pequenas a um mero espaço de transmissão de conteúdos e impedir condições vitais de construção da identidade, autonomia e criatividade.
ADENILSON SOUZA CUNHA JÚNIOR é professor adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Pedagogo, Mestre e Doutor em Educação. Membro da Loja Maçônica Rei Salomão nº 1561, de Belo Horizonte e da Academia Maçônica de Letras do Leste de Minas.