* Cláudia Cardoso da Cruz Gomes
Todos os dias nos deparamos com questões polêmicas: sejam elas na família, no ambiente de trabalho ou na roda de amigos, que rendem inúmeros comentários que, às vezes, se estendem às redes sociais se transformando em um debate acalorado. Tais questões, normalmente, são rotuladas, por alguns, como preconceituosas e por outros como liberdade de expressão. Conceitos separados por uma linha bastante tênue. Define-se por liberdade de expressão o direito de se manifestar livremente ideias e opiniões, conceito presente em todo estado democrático que no Brasil é garantido pela Constituição Federal.
Por outro lado o preconceito é definido como um prejulgamento de caráter inflexível, atingindo o extremo da indiferença e do ódio. Quando se fala em preconceito, é pertinente relacioná-lo com a palavra discriminação que se origina do Latim discriminare, que significa: “dividir, separar, determinar uma diferença”. Ideia preconcebida, manifestada geralmente na forma de uma atitude “discriminatória” diante de pessoas, lugares ou tradições, considerados como estranhas ou diferentes. As formas mais comuns de preconceito são: social, racial e sexual, em relação a negros, mulheres homossexuais e outros grupos.
De um modo geral, o preconceito parte de uma generalização superficial, criando modelos fixos para determinados grupos sociais, por exemplo, é um preconceito dizer que: “os jogadores de futebol são analfabetos”, ou também é preconceito dizer que “as mulheres são menos inteligentes que os homens”.
Quando o preconceito atinge o ápice é comum sair do campo do deboche, como é o caso das piadas que têm como personagens pessoas de grupos sociais marginalizados, e entrar para o campo da rejeição e da agressividade.
Neste sentido, observa-se que, pelo caráter superficial que lhe é próprio, o preconceito se constitui como um erro. Um erro que faz parte de um imaginário e não de um conhecimento, ou seja, não possui nenhuma base racional. Portanto, uma atitude negativa em relação a um determinado grupo já pode ser considerada como um comportamento preconceituoso, mesmo que alguns grandes nomes da história tentem, em nome da ciência, usar a genética para justificar tais ideias.
Felizmente, muitos preconceitos já estão, em nossa sociedade, sendo questionados e já são considerados como crimes.
No entanto o preconceito linguístico, ou seja, discriminar alguém pela linguagem que usa, como qualquer outro tipo de preconceito, também irracional e sem uma justificativa, muitas vezes, ainda, não é considerado como preconceito, apesar de ser, cada vez mais, alimentado pela própria sociedade. Lamentavelmente o preconceito linguístico no cotidiano ainda não é considerado uma forma de preconceito e nem como liberdade de expressão apenas é considerado como algo natural, isto é, discriminar alguém pela linguagem que usa para se expressar é natural e aceitável.
Mas defender que há uma unidade linguística, no Brasil ou qualquer outro lugar, ou seja, que todos devem falar da mesma forma, ou que brasileiro não sabe português, ou ainda, que português é difícil são alguns dos mitos que sustentam o preconceito linguístico, muito comum na sociedade brasileira.
Tudo isso pode ser atribuído à confusão que se faz entre a língua e a gramática da língua, que muitas vezes é imposta pela escola em defesa de uma forma de linguagem única, que é a norma culta. Desta forma nega-se a cultura de uma região, sua linguagem e consequentemente as pessoas que nela vivem.
Entretanto, é importante ressaltar que as pessoas podem se expressar através da norma culta, considerada padrão, ou da linguagem que utilizam em sua comunidade ou região, devendo a norma culta ser ensinada na escola, mas sem recusar a linguagem que o aluno traz de suas raízes, de forma que essa linguagem, que é parte de sua cultura, não seja discriminada e considerada como errada.
É preciso que a escola, em especial o professor, entenda que ensinar a norma padrão ao aluno é um dever da escola e que se trata de um direto de todo cidadão, pois é a norma culta que ele usará para se posicionar em muitas circunstâncias sociais, nas quais exigirão dele o uso de uma língua padrão.
Finalmente ainda é preciso que a escola tanto quanto a sociedade reconheçam mais esta forma de preconceito, bem como a linha tênue que separa o preconceito e a liberdade de expressão.
*Cláudia Cardoso da Cruz Gomes é Coordenadora do curso de Letras e professora dos cursos de Letras e Pedagogia do Centro Universitário de Caratinga – UNEC
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