*Marcos Miguel da Silva
Desnuda de legitimidade uma considerável faceta do eleitorado brasileiro é incansável na exigência de representantes honestos no cenário político nacional. Entretanto, por possuir memória curta, se esquiva de recordar a trajetória dos votos, em especial do próprio voto, que ajudou a conduzir a classe política aos seus respectivos cargos.
A índole do povo brasileiro, salvo raríssimas exceções, sempre tendeu a usufruir daquele secular jeitinho para se obter alguma vantagem: uma promessa de emprego, um favorecimento nesse ou naquele concurso, uma informação privilegiada em certames licitatórios e, quando nada, uma gotinha de colírio em um dos seus olhos.
Ainda que seja triste, esta é a realidade. Como exigir mudanças se inexiste no íntimo de cada um de nós a predisposição de sermos a mudança que almejamos? Se quisermos mudar o Brasil, primeiro temos que mudar nossa forma de pensar, de agir e, sobretudo de fazer nossas escolhas. A política não transforma o político em ladrão, mas o nosso voto, se dado de maneira impensada e irresponsável, pode sim transformar o ladrão em político.
O brasileiro é um inveterado pecador por conta de suas paixões. Tem o hábito de entronizar o time de sua preferência, os artistas, os políticos, etc., e o faz de forma evasiva e inconsequente, sem sequer conhecer a biografia deste ou daquele que acintosamente defende de olhos vendados.
E por conta dessa desmensurada paixão, na grande maioria das vezes só quer acreditar naquilo ou naquele que lhe agrada ou que diz aquilo que deseja ouvir, ainda que desconheça seu conteúdo. Veja que a recondução aos cargos de políticos desprovidos de honradez e seriedade ocorre em proporções bem mais acentuadas de que daqueles que conduzem com zelo, honradez e probidade os seus mandatos.
É triste imaginar que o Brasil é o único país onde os poucos políticos honestos são taxados de tolos ou bobos, como se a improbidade devesse constituir a base do pragmatismo político.
Difícil imaginar que a insaciável ganância pela suposta força de um pedaço de papel, que chamamos de papel moeda, consiga sobrepor valores supremos como a ética, a moral, a honradez e a probidade. E a força falsa desse imaginário poder das cifras vem imergindo a nação em situação de lástima, como se a classe política, ora desprovida de todo e qualquer senso de patriotismo, estivesse rasgando a bandeira nacional.
Se o princípio da democracia é a soberania popular, cuja doutrina básica seria a distribuição equitativa do poder, a quem atribuir a culpa desses desmandos senão a nós – povo brasileiro, que por interesses escusos e quiçá desconhecimentos, insiste na mesmice de eleger seus representantes a troco de tapinhas nas costas e algumas poucas migalhas, que de nada servem senão para fazê-lo baixar a cabeça e ter que tolerar, por sua culpa, sua única culpa, esses dictérios e desmandos que tanto mal tem causado ao país.
Aí surgem os que tentam justificar o injustificável. E do alto de suas mentes bitoladas bradam que a culpa é da falta de investimento em educação. Sim. É verdade que falta investimento em educação. Contudo, isso não exime a culpa do povo brasileiro que insiste em eleger representantes que preferem rechear suas contas pessoais em paraísos fiscais do que investir em educação. Até porque é bem mais fácil manipular milhões de ignorantes do que um único sábio.
O senso de patriotismo e a magnânima sensibilidade capaz de nos permitir aceitar que o interesse coletivo deve sobrepor ao particular, ou seja, corrupção zero, é o requisito que falta para que nós, povo brasileiro, possamos fazer nossas escolhas com a isenção e a legitimidade que nos autoriza exigir políticos honestos.
* MARCOS MIGUEL DA SILVA – Advogado, escritor, historiador e poeta; membro da A.R.L.S. Universitária Cristal dos Três Vales – Nº 3.822 (Teófilo Otoni-MG); membro titular da Cadeira nº 15 da Academia de Letras de Teófilo Otoni – ALTO; membro titular da Cadeira nº 13 da Academia Maçônica de Letras do Leste de Minas – AMLM. Autor dos livros “RIO DAS PEDRAS – ITAIPÉ 50 ANOS” e “EU E A VIDA AOS OLHOS DA LUZ” e coautor em diversas antologias