Dona Dulce conta história da igreja católica no Esplanada
CARATINGA- Cor Marie Dulce, 82 anos, reside há 76 anos no Bairro Esplanada. Somente na Rua Lamartine foram 41 anos. Quando o assunto é a fundação da Paróquia Nossa Senhora do Carmo, o nome de Dona Dulce sempre é lembrado como quem conhece a história, participou da fundação da igreja e ainda se envolve ativamente com as atividades. Por isso, ela foi entrevistada pela reportagem, para relembrar toda esta história marcada pela fé.
Dona Dulce lembra que antes da construção da igreja católica do Esplanada, os fiéis tinham que se encaminhar para a Catedral, que era a única opção. “Monsenhor Rocha, que era muito amigo da minha família, rezava um rosário às 5h30 no domingo, que era acompanhado das famílias mais tradicionais da cidade, as pessoas mais ricas. Mas, ele dava muita atenção aos pobres e ele era muito amigo da gente. Um dia a mamãe falou com ele: ‘Monsenhor, está tão difícil vir aqui’, porque ela ficou aleijada de reumatismo muito tempo. Ele falou assim: ‘A gente podia arranjar um jeito de fazer uma capela lá em baixo para vocês”.
Ela afirma que o bispo à época era dom João Batista Cavati, que dirigiu a Diocese de Caratinga no período de novembro de 1938 a outubro de 1956. Ele foi a Roma conversar com o papa, no Vaticano conheceu o provincial dos Carmelitas Descalços na Itália. “Então, começaram a conversar e ele pediu ao provincial para mandar padres aqui para Caratinga. Mas, acabou o negócio lá, o bispo veio embora e o monsenhor foi ali na Rua dos Operários, bem pertinho da Vila Joviano, era um barracão muito grande, grande na acepção da palavra, para nós era grande porque a nossa igreja não existia. Ele alugou esse barracão e começou a armar para começar a paróquia”.
Nesse barracão improvisado, a igreja dava seus primeiros passos. No entanto, Dona Dulce fala sobre um episódio que deixou monsenhor Rocha chateado. “Teve um cara de uma outra religião, que falou com o dono que se tirasse o monsenhor de lá e alugasse o barracão para ele, pagaria o dobro. O dono do barracão foi falar com o monsenhor, que respondeu: ‘Nós temos contrato por um ano. Esse ano vou ficar aqui, o ano que vem eu saio’. Ele insistiu que tinha que sair. Vai em casa em casa e busca uma garruchinha, dessas de cabo de guarda sol, feita em casa e chegou e falou com o monsenhor assim: ‘O senhor vai sair daqui nem que seja no tiro’. O monsenhor foi atrás do sacrário e tirou um 38: ‘Vamos ver quem atira melhor?’. O homem foi embora. Monsenhor ficou ali, mas triste com aquilo”.
Com o passar do tempo o espaço já não comportava o número de pessoas que buscavam as celebrações pela manhã e à noite, aos sábados e domingos, principalmente as missas dominicais. Foi assim que a igreja mudou-se para outro imóvel, ainda modesto, mas que comportaria as atividades da igreja católica. “A capela começou a encher, mas ele viu aquela má vontade e conversando com Manoel Gonçalves de Castro, era o Manoel Espanhol, que a gente falava, o Manoel disse: ‘Tem esse barracão ali, se o senhor quiser arrumar ele não vai pagar aluguel nenhum. O senhor pode ficar’. Ele foi para esse barracão e começou a trabalhar”.
Neste momento, o provincial da Itália mandou dois padres para a igreja do Esplanada: frei Arcanjo Ruzzi e frei Inácio de Santa Teresa. “As Irmãs Carmelitas da Divina Providência arranjaram para eles um cômodo, ali onde era o antigo campo de patinação de Caratinga, hoje é o Bradesco mais ou menos. Não falavam uma palavra em português, as Irmãs também não entendiam e elas tinham muito dever, porque o Colégio Nossa Senhora do Carmo era o melhor da cidade nessa época. Elas tinham muito serviço e todas as famílias tradicionais levavam os filhos para estudar lá. Tinha o internato, o externato e o semi-internato. A escola era muito boa, grande, com professores muito bons, as Irmãs eram as professoras fixas e tinha muitas pessoas maravilhosas lá dentro, como, por exemplo, professor Jarbas Rezende, muito antigo ali”.
A moradora conta como a igreja depois começou a funcionar no atual terreno, em um espaço que foi doado. “Eles tinham que vir para o Esplanada, mas não tinha lugar para ficar. Então, o senhor Manoel Gonçalves, não sei como ele arranjou na cúria; o dom Cavati, conseguiu uma casa ali na subida do morro, pertencia à família do seu Juquinha Maria, então, a Ordem comprou a casa para os padres. Mas, eles continuaram ali em baixo naquele barracão. Um fazendeiro chamado José Lopes, mas todo mundo chamava carinhosamente de Juca Lopes, tinha uma fazenda muito grande e muito bonita ali, fez a doação para o monsenhor daquela área toda”.
A área é ampla e hoje é ocupada pela Paróquia Nossa Senhora do Carmo e outras instituições, como dona Dulce faz questão de enumerar. “Começa no muro do grupo Dom Carloto e vai até lá em cima, na Rua da Piedade. O campo do Esplanada é da igreja, a quadra de vôlei da escola é da igreja, a escola funciona em prédio da igreja. Aquela frente ali, a prefeitura disse uma vez que é dela, mas não é, é da igreja. Tanto que eles fizeram o Cruzeiro do Carmelo ali, ainda pertence à igreja”.
Nascia a primeira capelinha denominada Nossa Senhora do Rosário, por volta de 1947. Ainda não tinha as dimensões e a imponência da Paróquia atualmente, mas, foi erguida com muita dificuldade e esforço da comunidade. “A igreja era tão pequena, que a hora que estava fechada, parecia um paiolzinho. Para a missa abriam as duas portas, o altar tomava conta da distância da igreja todinha. Ali nós ficamos muito tempo, minha mãe se sentia na obrigação de trabalhar pela igreja. Ela fazia aquela barraca de coelhinho durante o Mês de Maio. Mês de junho, era o mês do coração de Jesus, ela continuava; quando era em agosto, falava que estava quase passando as férias e ficaria naquele mês. Ficava agosto, setembro, quando era outubro, era mês de Maria outra vez, ela ficava até o fim daquele mês pelejando para arranjar dinheiro para fazer a igreja ali. E a gente naquele aperto”.
Muitas pessoas da comunidade contribuíram para que aos poucos as obras da igreja fossem concretizadas, como cita. “Tínhamos, por exemplo, o seu Pedro Leiloeiro, que era um homem muito bacana e que ajudava muito com os leilões. Aliás, o lugar do leilão era maior que o da igreja (risos), de tão pequena que era a igreja. Apareceram pessoas, como, por exemplo, a dona Iracema Andrade, Silvina; Lalá, chamava Dinorá Cevidanes, a irmã dela Diná Cevidanes; tínhamos homens como o senhor João Cassiano e muitos, mas muitos outros, que ajudavam demais; o senhor Silvestre Pereira, senhor Manoel Gonçalves. Achava muita graça que chegava a hora do leilão, não sabia falar direito, porque ele (Manoel) era espanhol mesmo, veio pequeno para o Brasil. Leilões deram bastante ênfase na construção daquela igreja”.
Desde 1942 morando no bairro, Dona Dulce tem muitas histórias para contar e se orgulha de sua família ter feito parte de toda essa história. “A guerra de 45 atrapalhou mais ou menos até 1950. Passamos uma vida difícil, mas graças a Deus todo mundo que trabalhou e quis venceu. Tudo que tem naquela igreja tem a mão da mamãe, aquele Cristo na cruz, nós trouxemos de Aparecida do Norte, cada um carregando um pedaço, porque ele é todo desmontável; castiçais antigos tudo a mamãe que deu; aquele sacrário que frei Carlos mandou de mármore de Carrara, mamãe vendeu cinco colchas de crochê para ajudar a comprar”.
A Paróquia Nossa Senhora do Carmo, situada à Praça Frei Arcanjo Ruzzi, 01, tem data de criação a 16 de julho de 1952. Atualmente, tem como pároco frei Everaldo Abril Pontes e vigário paroquial frei Odair Madero.
Comunidades/Capelas:
- Nossa Senhora Aparecida (Alto das Palmeiras)
- Nossa Senhora Aparecida (Alto Lage)
- Nossa Senhora Aparecida (Rio Preto)
- Nossa Senhora da Piedade (Piedade de Caratinga)
- Nossa Senhora do Carmo (Córrego dos Manducas)
- Nossa Senhora da Imaculada Conceição (Córrego do Marcial)
- Nossa Senhora do Rosário (Bairro do Seminário)
- São João da Cruz (Córrego do Lage)
- Santa Teresinha (Córrego do Lage)
- Senhor Bom Jesus (Córrego do Lage)
- Senhor Bom Jesus das Palmeiras (Córrego das Palmeiras)
- Nossa Senhora das Graças (Bairro Nossa Senhora das Graças)
- São José (Bairro Zacarias)
- Nossa Senhora Aparecida (Córrego do Purgatório)
- São José (Fazenda Rio Doce)