1980 deu Flamengo
Aquele abraço amigo do esporte, amigo da bola. Vamos reabrir o baú de lembranças dos campeonatos brasileiros. Se a década de 70 ficou conhecida como colorada pelas três conquistas do Internacional/RS, a década seguinte foi Rubro-negra. Chegamos aos anos 80. Para quem assim como eu, começou a se interessar por futebol nessa época, posso dizer que somos muito felizes por termos tido a oportunidade de ver grandes times e muitos craques por todos os lados. Se hoje os times conseguem ter um ou no máximo dois bons jogadores, na década de 80 cada equipe contava com pelo menos meia dúzia de craques. Até times considerados pequenos tinham suas estrelas.
A CBD foi desmembrada e surgiu a CBF. Os clubes mais tradicionais passaram a pressionar a recém-criada confederação a reformar o Campeonato Brasileiro, que vinha crescendo ano a ano em número de participantes, tendo chegado ao recorde de 94 clubes no ano anterior.
Finalmente, a CBF decidiu dividir o campeonato em três divisões: a Taça de Ouro (com os 40 clubes mais fortes da época), a Taça de Prata e a Taça de Bronze. Mas, ao aplicar de forma particular as recomendações da Fifa sobre acesso e descenso, a CBF criou um inédito mecanismo de “acesso intermediário”, no mesmo ano das competições: as quatro equipes melhor classificadas na primeira fase da Taça de Prata passariam a disputar a segunda fase da Taça de Ouro. As demais equipes da Taça de Prata permaneceriam na sua competição, disputando o título do torneio, e ainda duas vagas para a Taça de Ouro do ano seguinte, que acabaram ficando com Londrina e CSA/AL.
Decisão Flamengo 3 x 2 Atlético
Não é exagero afirmar que Atlético e Flamengo eram os principais protagonistas do futebol brasileiro nos anos 80. Serviam de base para a seleção brasileira e dominavam o cenário nacional. O Galo que já havia conquistado o campeonato em 1971 e batido na trave contra o São Paulo em 77, chegava mais uma vez a decisão.
Por outro lado, antes de 1980, o Flamengo só havia feito campanhas modestas no campeonato nacional. Em nove edições, a grande participação havia sido um quinto lugar em 1976, e em mais da metade das campanhas o time foi eliminado sem poder sonhar muito, ficando fora até da lista de dez melhores. Mas a equipe que abriu a série de conquistas dos anos oitenta estava verdadeiramente infernal na trajetória daquele título pioneiro. O Flamengo enfileirou uma sequência de 17 jogos consecutivos sem perder – entre a inesperada derrota para o Botafogo da Paraíba na primeira fase e o 1 a 0 sofrido para o Atlético na ida da final – e terminaria a campanha marcando 46 gols em vinte e dois jogos. A decisão contra o Atlético reunia, de fato, as duas melhores equipes da competição: o Galo tinha números muito parecidos com os do Fla, terminou o campeonato com a mesma quantidade de gols feitos e, embora tenha perdido um jogo a mais, também venceu uma vez mais que os cariocas. No somatório de todas as fases, os dois times somavam inclusive a mesma quantidade de pontos – e as duas finais, juntas, também foram um empate agregado de 3 a 3. O Flamengo levou a melhor por igualar os resultados porque nas semifinais havia vencido suas duas partidas contra o Coritiba, enquanto o Atlético venceu uma e empatou a outra contra o Inter. Um público de 154.355 pessoas foi ao Maracanã ver a conquista rubro-negra, num jogo em que os atleticanos jamais engoliram a expulsão de Reinaldo, que jogava lesionado e mesmo assim conseguiu fazer o gol de empate. Na mesma entrevista que mencionei domingo passado sobre a final de 77, Reinaldo falou também sobre a expulsão em 1980: “Ele marcou um impedimento que não houve. O Júnior foi cobrar e eu passei na frente bem na hora, sem querer. O Aragão me deu amarelo. Ele virou e do nada, me deu cartão vermelho, alegando que eu o xinguei. Mas nem dirigi a palavra para ele”. A versão do árbitro José de Assis Aragão é que Reinaldo tinha tomado cartão amarelo ao tentar retardar o jogo, passando na frente do impedimento e ainda chutando a bola pra longe, depois seria substituído estaria fazendo cera (retardando a mudança) já que o empate favorecia o Atlético. Quando foi falar pra ele apressar, foi xingado por ele e por isso a expulsão. Um fato curioso é que no intervalo o técnico Cláudio Coutinho leu uma carta de Rondinelli chamado pela torcida Rubro Negra de “deus da raça”. O zagueiro tinha fraturado o maxilar no jogo do Mineirão e estava hospitalizado. Mas, em carta pediu ao companheiros pra ter raça e ir pra cima deles.
Uma das maiores decisões de campeonato de todos os tempos. O Flamengo tinha um a mais em campo, mas não no placar. Precisava da vitória em 90 minutos. Só não podia dar os espaços que deu. Aos 30, Raul evitou a virada mineira, dividindo bola com Pedrinho na intermediária. Nunes caía pelos flancos, mas ninguém aparecia na área. Nem Zico. Tita circulava mais e abria o corredor para Toninho. Adílio entrara bem. Júlio César partia para cima, e criava bons lances. O Maracanã seguia em silêncio e nervoso como o Flamengo. O lateral Geraldo errava quase tudo, mas Cerezo jogava por todos os atleticanos. Só não conseguiu controlar outra inexplicável saída de Osmar para o ataque. O Galo com o placar nos pés, um jogador a menos, e o zagueiro partiu para o ataque, aos 36…Tentou lançar Pedrinho na direita, mas perdeu a bola, já no campo rival. Júnior retomou e tocou para Andrade, que lançou Nunes aberto à esquerda, para cima de Silvestre, que teve de cobrir Osmar. O inexperiente Geraldo foi fazer a zaga central desguarnecida por Osmar. Nunes tentou cruzar a bola que bateu no peito de Silvestre. Voltou para o ‘João Danado’. Nunes fingiu que cruzaria de novo, saiu pela esquerda e bateu. João Leite caiu antes, sem esboçar reação. Gol do título. Flamengo 3 a 2 e o Maracanã explode de alegria.
Campeões: Em pé: Andrade, Marinho, Raul, Rondinelli, Carlos Alberto e Júnior; Agachados: Tita, Adílio, Nunes, Zico e Júlio Cesar.
Colunista Rogério Silva ao lado de Rondinelli e Nunes