Liberdade tem cheiro de campo

Há 10 anos, Poliana Tupinambá decidiu deixar o agito de São Paulo para morar em uma chácara em Caratinga

CARATINGA — Há entrevistas que são feitas em mesas de escritório, outras em corredores de eventos. Mas há aquelas que acontecem onde a vida respira mais fundo. A jornalista Nohemy Peixoto, do DIÁRIO, esteve com a também jornalista Poliana Tupinambá no lugar onde, há dez anos, ela decidiu reinventar a própria história: uma chácara acolhedora, silenciosa e viva, na região do Aeroporto, em Caratinga. Ali, onde o vento passa leve e o verde se impõe sem pedir licença, Poliana recebeu a equipe chamando tudo de “meu cantinho”. Ao final da conversa, posou para fotos em sua rede — o lugar onde descansa o corpo e a mente.

A mudança, como ela mesma narra, não foi planejada. “Bem… 180 graus de mudança. A decisão não partiu de mim”, diz, sorrindo com quem ainda se surpreende com o próprio caminho. Morando no coração de São Paulo — a poucos passos da Paulista, a poucos minutos da Sé — ela imaginava que sua vida seguiria entre o concreto, o barulho e os planos urbanos. Mas algo a chamava de volta.

“Deus estava dando um toque para eu voltar para Caratinga”, conta.

Foi então que uma soma improvável de memórias, coincidências e intuições moldou o destino: um ensaio fotográfico feito meses antes em uma chácara, a foto que apareceu no Facebook justo quando ela pedia a Deus uma casa onde se sentisse bem e o valor exato que ela desejava pagar. “Eu não acredito muito em acaso… Mas, para quem acredita, tudo bem. O fato é que a foto apareceu, e eu sabia: era aquela”.

Poliana alugou a casa ainda em São Paulo, antes mesmo de conhecê-la. Veio com mudança, coragem e um noivo com quem não se casou — e desde então vive sozinha, em liberdade. “Eu vivo a liberdade”, afirma. “Eu gosto da minha companhia. Quando estou comigo, penso: ‘Enfim, sós’”.

Ela fala da natureza como quem fala de alguém íntimo. Dos pássaros que “conversam o dia inteiro”, das maritacas que narram a manhã, do verde que entra pela janela como bênção diária. “Eu gosto de pôr o pé na grama. Isso faz um bem enorme. Aqui eu vejo o céu mais bonito, a chuva mais bonita, a lua mais bonita”.

Caratinga lhe deu vizinhos que ela chama de “meio família”: quem traz banana, partilha broa, deseja bom dia como quem doa um pedacinho de si. “É outra realidade. Mais acolhedora”. E, ao mesmo tempo, um sossego raro: “Aqui ninguém fica cuidando da vida de ninguém”

Viver no campo fez nascer um livro que jamais sairia em São Paulo. Fez nascer silêncio, foco, concentração — coisas preciosas para quem tem TDAH. Fez nascer fé mais profunda. “Aqui eu aprendi a olhar mais para dentro, a me conectar mais com Deus”.

Ela também defende a natureza e faz um apelo para que ninguém corte árvores desnecessariamente. “O que traz o bem-estar está relacionado às árvores. É informação que o corpo capta. Se tira isso, perde o sentido”.

E quando fala sobre colocar os pés no chão molhado da grama após a chuva, seus olhos brilham com a mistura de ciência e encantamento: “Isso é ouro. A comunicação do corpo com a terra é instantânea. Ele equilibra o organismo. Até o sangue fica menos viscoso. É muito benefício. É como um banho de saúde”.

Poliana não romantiza tudo: mantém sua aversão a sapos, mas até nisso há humor. “Tem cobra? Eu vou lá ver. Agora, sapo… alguém tira, por favor (risos”.

Aos 45 anos, vive sem pressa, sem medo, sem remédios e sem arrependimentos. Diz que a vida tem fases — e que aquela, de São Paulo, cumpriu seu propósito. Esta, no campo, lhe devolveu o bem-estar que nem sabia que procurava.

Antes de a equipe ir embora, com o sol descendo suave atrás das árvores, ela deixou um recado para quem sonha com essa mesma mudança, mas ainda hesita: “Se você sente que vai gostar, venha. Esse é o sexto sentido te avisando. Morar no campo além de terapia é terapêutico. É muito bom. É liberdade, é silêncio, é saúde… é Deus”.

O “cantinho” acolhedor, silencioso, feito de paz

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