Terapeuta de casais explica como construir relações mais equilibradas
CARATINGA – Com população estimada em 87.360 habitantes, Caratinga registra índices que revelam muito sobre a vida afetiva de seus moradores. Os dados mais recentes apontam uma taxa de 5,2 casamentos por mil habitantes e 4,8 divórcios por mil habitantes, números que evidenciam relações cada vez mais desafiadas pela rotina, pelas expectativas e pelas transformações emocionais da vida contemporânea.
Em 2024, foram registrados 457 casamentos no município, número próximo ao de 2023, que contabilizou 448 uniões. Já no campo das separações: 416 divórcios em 2024, sendo 390 judiciais e 26 extrajudiciais. No ano anterior, 2023, foram 467 divórcios, dos quais 442 judiciais e 25 extrajudiciais.
Os números ajudam a compreender um cenário em que o bem-estar não está apenas no corpo ou na rotina, mas também — e sobretudo — na qualidade das relações. Quando o relacionamento adoece, o emocional costuma ser o primeiro a sentir. É a partir dessa realidade que a terapeuta de casais Marinalva Soares analisa como expectativas irreais, falhas na comunicação e indisponibilidade emocional impactam a vida a dois, e aponta caminhos possíveis para relações mais equilibradas, conscientes e saudáveis.
Psicóloga, neuropsicóloga, facilitadora de Constelação Familiar, advogada, terapeuta integrativa, mestre em Reiki, pós-graduada em Meios Adequados de Solução de Conflitos e Direito Sistêmico e em Abordagens Transdisciplinares Sistêmicas, Marinalva traz uma visão ampla e humanizada sobre os desafios contemporâneos dos vínculos afetivos — e sobre como cuidar das relações também é cuidar do bem-estar.
Como definir um relacionamento saudável?
Um relacionamento saudável é aquele em que há respeito, comunicação clara, confiança e espaço para crescimento individual e conjunto. Casais saudáveis conseguem lidar com conflitos de forma construtiva e mantêm a conexão emocional mesmo em momentos difíceis. O amor existe, mas a relação não depende apenas dele: envolve cuidado, compromisso e presença consciente.
As pessoas esperam demais do outro? Existe relacionamento perfeito?
Sim, muitas pessoas depositam expectativas irreais no parceiro, acreditando que ele deve suprir todas as necessidades emocionais. Relacionamento perfeito é aquele que você aceita a imperfeição do outro. Somos humanos, com falhas e limites. O que existe é parceria, empatia e disposição para crescer juntos, aprendendo a lidar com diferenças e imperfeições.
Quais são as maiores queixas que chegam ao seu consultório hoje?
As queixas mais comuns incluem, dependência emocional, falta de comunicação, rotina desgastante, distância emocional, brigas recorrentes e dificuldades de reconexão após traumas ou mágoas passadas. Muitas vezes, os casais chegam buscando respostas sobre como se reconectar ou melhorar a convivência diária.
O que significa estar emocionalmente disponível para um relacionamento?
Estar emocionalmente disponível é estar presente, acolher o outro e também se permitir ser visto, mesmo com vulnerabilidades. Significa ter consciência de suas emoções, lidar com elas e não projetar inseguranças no parceiro. É oferecer atenção e intimidade de forma genuína, sem fechar o coração para a relação.
Pessoas podem amar, mas não estar disponíveis? Como identificar isso?
Sim. É possível amar alguém profundamente, mas não estar disponível. É muito comum a pessoa estar indisponível para se relacionar por emaranhamentos no sistema familiar de origem. Isso significa colocar mais energia no passado em situações que não são possíveis de solucionar. O que causa muito desgaste energético comprometendo a relação atual. E ainda medos, traumas, inseguranças ou sobrecarga emocional.
Toda relação passa por crise?
Sim. Crises fazem parte do ciclo natural de qualquer relação. E muitas vezes elas trazem uma virada na vida do casal se forem bem aproveitadas. O que muitas vezes por falta de maturidade, desistem de seguir com a relação. O que diferencia casais que se fortalecem de outros é a capacidade de enfrentar o conflito com diálogo, empatia e comprometimento.
Algumas pessoas encerram uma relação e rapidamente engatam outra. A repetição rápida de vínculos pode indicar uma dificuldade de estar só?
É um medo de encarar a própria responsabilidade por aquele término. Muitas pessoas colocam toda responsabilidade no outro quando o relacionamento não dá certo. Mas eu sempre digo que os dois têm responsabilidade no que dá certo e também quando dá errado. A pessoa busca segurança imediata em outro vínculo, sem processar perdas anteriores, o que pode gerar repetição de padrões prejudiciais. Mas o luto é extremamente importante para ter um tempo de maturação suficiente, para ficarem realmente livres para um próximo relacionamento. Caso contrário ficam presos energeticamente ao relacionamento anterior, ficando então indisponíveis para uma relação saudável.
Por outro lado, algumas pessoas demoram muito para se abrir a outro vínculo. Como diferenciar autopreservação saudável de bloqueio emocional que impede uma nova experiência?
A autopreservação saudável ocorre quando alguém se dá tempo para curar, refletir e aprender com experiências passadas. Já o bloqueio emocional é caracterizado por medo excessivo, desconfiança constante ou resistência em criar intimidade, mesmo quando há potencial de relação segura. A diferença está na capacidade de discernir e se permitir avançar quando seguro.
Por que algumas relações terminam no papel, mas continuam emocionalmente ativas?
Presenciei muito isso como advogada de família. Os casais se divorciavam e não queriam aceitar que o amor ainda permanecia. No coração não é possível excluir ninguém. E isso os levavam a muitos conflitos por guarda ou pensão alimentícia, uma forma “perfeita” de manter o contato entre o casal, ainda que seja por meio de conflitos. Traumas, hábitos e emoções não resolvidas podem manter os parceiros conectados mesmo após a separação formal.
Muitos casais buscam terapia às vésperas de um divórcio. Ainda dá tempo?
Sim, quando os dois estão dispostos e se comprometem a olhar para a crise de uma outra forma. Tem muitas dinâmicas disfuncionais que atuam em um relacionamento e que desgastam a relação. Por exemplo, muitos casais não dão a devida importância a um aborto, e por ter certeza que a relação perde muita energia com isso. Vínculos energéticos com parceiros anteriores, e como já disse, emaranhamentos com a família de origem.
A terapia pode salvar uma relação que chegou nesse ponto?
O que salva é a disposição do casal em mudar a forma de agir e se comunicar. A força é sempre do casal. O que o terapeuta faz é mostrar onde está a causa do problema e orientar para um caminho mais saudável. Mas a força e decisão é sempre do casal.
Quando é a hora de insistir — e quando é a hora de partir?
Não tem uma regra, o casal sente quando é para continuar ou não. Mas se há desejo de reconexão, pode sim ser restabelecida a confiança, respeito e admiração.
Quais hábitos simples fortalecem um relacionamento no dia a dia?
Comunicação diária, mesmo que curta, saber se comunicar e saber ouvir o outro, presença, pequenos gestos de cuidado, reconhecimento do esforço do outro, resolução de conflitos sem acusações e principalmente para aumentar a intimidade e conexão momentos de diversão e conexão juntos
Quando procurar um terapeuta de casal?
Quando os padrões de conflito se repetem, a comunicação não flui, a intimidade diminui ou o casal se sente emocionalmente distante. Buscar ajuda não é sinal de fracasso, mas de responsabilidade e cuidado com a relação. Quanto antes o casal busca apoio, mais rápido e profundo é o efeito da terapia.











