Domingo é dia de almoçar com a família, de futebol, de ir à Igreja, de fazer qualquer coisa, ou até, dia de fazer nada, mas neste domingo é dia de votar.
Em meio ao descompromisso do domingo, um imperativo: exercer a cidadania.
O que isso significa? No sentido oficial: o poder de decidir o futuro da Nação, mas na vida real das pessoas, pode ter outros sentidos.
Com exceção dos candidatos e pessoas afins, o restante da população parece não se sentir com o poder de mudar sua vida, quiçá, o destino do país. Tamanha desesperança se reflete nas falas ou no desinteresse manifesto em diferentes classes sociais, níveis culturais e regiões do país. E o que fazer então diante do que para muitos é só uma obrigação cívica?
Vivemos num contexto em que, cada vez mais, temos acesso à informação, num bombardeio de notícias, mensagens, posts, campanhas diversas, embasadas num modelo de marketing cada vez mais eficaz. Continuamente nos são passadas imagens, ideias, que formam opiniões, criam novos comportamentos e põem abaixo antigos modelos. Isto ocorre em todos os setores da sociedade contemporânea, e também na política.
E por que então, mesmo com toda a campanha eleitoral, a impressão que temos é que as pessoas continuam e querem continuar alheias ao que se passa na política? Como se isso não lhes dissesse respeito.
A Psicologia Social estuda o processo de construção do sujeito, numa relação dialética, sendo construído e construtor da sociedade em que habita. Estuda a influência social, o processo de tomada de decisões, as relações grupais, a liderança, e tantas outras questões que podem nos ajudar a compreender, quem somos nós, diante do momento e da sociedade em que vivemos.
Vemos por um lado, pessoas cada vez mais individualistas, com necessidades de obter prazer imediato e contínuo, de ter sucesso a qualquer preço; considerando sucesso como capacidade de ter fama, posição social elevada e muito, muito reconhecimento, através de “curtidas” e da valorização pelo outro. Vivemos na sociedade do espetáculo, onde o que vale é a imagem que conseguimos passar de quem queremos ser.
Para nos sentirmos valorizados, obtermos reconhecimento contínuo, precisamos corresponder à imagem que a sociedade nos coloca como ideal. Mas, para além das relações pessoais, reais ou virtuais de nosso cotidiano, como o cidadão pode se sentir reconhecido, numa sociedade que desrespeita seus direitos mais básicos? Como se sentir valorizado num contexto de violência, desigualdade, injustiça dos mais diversos tipos? Como se destacar num contexto de competitividade feroz, onde a pessoa não vale pelo que é, mas pela imagem que consegue vender? E o que esperar dos políticos, que nos vendem imagens que sabemos não serem reais?
Notamos então a tendência à busca individualizada de saídas. Cada um se volta para suas próprias necessidades, intensificando o individualismo e a alienação de tudo que vá além do próprio umbigo. Se por um lado, os universos se ampliam no mundo globalizado das redes de comunicação virtuais, por outro, se tornam microcosmos, restringindo as pessoas cada vez mais ao universo de seu quarto, com sua TV, equipamentos diversos, cada vez mais distantes do mundo real e dos problemas sociais.
E a política então, que espaço tem nesse universo, onde o que grita são as necessidades e desejos individuais? Se estamos fechados em nosso próprio mundo, “não temos nada a ver com o resto”, não nos sentimos capazes, nem responsáveis pelo que ocorre numa sociedade, que não trata as pessoas como verdadeiros cidadãos. Como então agir como um?
Por mais que deixemos de nos comprometer, o que ocorre na sociedade nos atinge, queiramos ou não. Somos parte de um todo e a partir do momento que deixamos de assumir nossa responsabilidade na sociedade, deixamos que outros escolham por nós. Escolher deixar as coisas como estão, já é uma escolha, e somos responsáveis por ela.
Votos brancos ou nulos, por exemplo, que muitos encaram como forma de protesto, de mostrar que “não interessa o que acontecer”, contribuem para que o candidato mais forte se fortaleça ainda mais. Então não adianta, sempre seremos responsáveis por nossas escolhas, mesmo a de não votar.
Na Psicologia Humanista o homem é visto como “condenado” a ser livre. E segundo Sartre, a liberdade só tem significado na ação, na capacidade do homem modificar o real.
Construir a própria vida dá trabalho, nem sempre o resultado alcançado é o desejado, mas quando tentamos, temos a chance de acertar. Se não tentamos, o resultado já está definido. Assim na vida e nas eleições.
Bom voto, bom domingo. Se as coisas não saírem como deseja, você fez a sua parte, paciência, outros domingos virão.
* Vânia Maria O. Pereira – Psicóloga, Mestre em Psicologia Clínica pela PUC/Rio, atua em Psicologia Clínica e Organizacional, Professora no Curso de Psicologia do UNEC
Mais informações sobre o autor(a): http://lattes.cnpq.br/2342983547615432