Em meus cinquenta e cinco anos de vida, jamais poderia imaginar que a utilização de um invento do Século XVI, denominado Chávena, conhecido por um período com o nome de xícara em Portugal – onde entrou para o grupo das palavras arcaicas já no século XIX, mas é popularmente utilizado no Brasil -, poderia causar tamanho transtorno na tentativa de manuseá-lo.
Na última quarta-feira, eu e o prof. Antônio Fonseca da Silva saímos de Caratinga, conduzidos pelo Custódio Neto, motorista da Unec, rumo a Ipatinga, com destino a São Paulo, onde participaríamos do 16º Fórum do Ensino Superior Particular Brasileiro, como de fato aconteceu. Tudo parecia transcorrer absolutamente bem, com o Neto saindo no horário, realizando uma viagem perfeita e nos deixando no aeroporto a tempo de tomarmos o cafezinho, antes do check-in…
Porém, o cafezinho foi o problema… Aliás, o cafezinho não, a xícara!
Todo aeroporto que se preza tem uma boa praça de alimentação, dotada de restaurantes e lanchonetes. Tudo bem, o aeroporto de Ipatinga é pequeno, não podemos esperar que tenha tal área. Ele tem uma lanchonete. Pequena, mas parece boa. Chegamos com fome, depois de uma reunião em Caratinga que não nos permitiu almoçar antes da partida. Professor Antônio pediu o único pão de queijo existente, um café e se dirigiu ao final da varanda, no ponto mais próximo da pista de pouso e, consequentemente, mais longe do balcão. É como se tivesse pressentido a importância de tomar distância naquele momento…
Eu solicitei à atendente um café e uma esfirra de carne e, poucas vezes, tive tanto arrependimento ao efetuar uma compra, haja vista a confusão que se sucedeu. Ela me serviu o café em uma xícara transparente, própria para chá, ocupando com o líquido preto cerca de um terço de seus 300 ml. E aqui vale um registro: cafezinhos, principalmente nos aeroportos, são servidos em xícaras de porcelana branca ou em copos descartáveis apropriados, em tamanhos adequados à quantidade de líquido solicitada.
Pois bem, o café foi servido na tal xícara, apoiada em um prato de sobremesa leitoso – pois aquilo, definitivamente, não era um pires -, contendo uma pequena lâmina d’água, o que foi suficiente para provocar a “aquaplanagem da xícara” – fenômeno também conhecido como hidroplanagem, que também ocorre quando os pneus do carro diminuem ou perdem o atrito com o solo ao passarem sobre uma lâmina de fluido na pista -, no momento em que segurei o conjunto “pratinho de sobremesa versus xícara de chá” para sair do balcão.
A xícara veio em minha direção e, em um lance rápido de reflexo, saí de sua direção e deixei que ela encontrasse o solo, passando a enfeitar o limpíssimo piso de porcelanato através dos mil pedaços em que se transformou. Naquele momento, todas as atenções se voltaram para mim. Pude observá-las olhando ao redor… Todas, menos uma: o professor Antônio, prudentemente, olhava para a pista, certamente pensando “não sei que é, não conheço essa pessoa”!
Pior que ver toda aquela bagunça, causada principalmente pela minha falta de cuidado em manusear um produto servido em recipiente tão inadequado (sim, a culpa era minha, já que ninguém mais ali havia quebrado a tal xícara, mesmo sendo aquela marmota), foi receber da atendente do balcão a orientação para que eu fosse lá ao saguão do aeroporto me informar sobre quem iria fazer a limpeza da área. Lembrando que, ao se quebrar, não sobrou um canto sequer daquele espaço que tenha ficado sem um pedaço da xícara…
Mesmo sabendo que esta não era uma tarefa minha, não me chateei com o pedido. Pelo contrário, aproveitei-me dele para sair dali, o mais rápido possível. Chegando ao saguão, obviamente, ninguém sabia me informar onde eu poderia encontrar o pessoal da limpeza. A cada indagação sobre o seu paradeiro eu era informado de quem deveria acioná-los era a própria atendente da lanchonete. Passados alguns minutos, coloquei a mochila nas costas – pois até então a segurava pelas mãos -, coloquei os óculos escuros e retornei ao local do epicentro.
Lá chegando, já escutei de outro usuário o questionamento de quem tinha feito aquela bagunça toda. Disse que não sabia, mas que também nunca tinha visto uma xícara quebrar em tantos pedaços. Falei para a atendente sobre o resultado de minha incursão e ela então se dispôs a sair de seu posto e trazer duas senhoras para a limpeza do local.
Paguei pelo café não consumido, saí de Ipatinga com fome e, na condição de consumidor, fiquei com aquela sensação de não ter recebido, nem mesmo, o mínimo esperado de uma prestação de serviços. Chegando a Belo Horizonte – na conexão para São Paulo -, tomei o café expresso no compartimento e espaço adequados.
E assim, Caminha a Humanidade, parodiando o célebre filme de James Dean e Elisabeth Taylor ou a conhecida música de Lulu Santos: entre tapas e beijos, pires e xícaras, serviços e atendimentos sem qualidade…
“Não vou dizer que foi ruim, também não foi tão bom assim. Não imagina que te quero mal, apenas não te quero mais…”
* Eugênio Maria Gomes é professor, pró-reitor de Administração do Centro Universitário de Caratinga, membro da Academia Caratinguense de Letras, do MAC – Movimento Amigos de Caratinga, da Loja Maçônica Obreiros de Caratinga e do Lions Clube Caratinga Itaúna.