*Eugênio Maria Gomes
É impressionante como permitimos que uma parte significativa de nossa curta existência seja consumida por coisas tão pequenas, tão desprovidas de significado. Se pensarmos bem, passamos a maior parte do nosso tempo, envolvidos com problemas familiares, insatisfação profissional, desgaste nas relações amorosas, desentendimentos sociais e os infindáveis boletos a pagar. Enfim, estes são alguns dos “problemas” que costumam consumir o nosso tempo e energia, a ponto de nos tirar o bom humor, o apetite, o sono e, em alguns casos extremos, a vontade de viver.
Quando se consegue entender que problemas existem para serem resolvidos e que, quando chegam naquele ponto em que não há solução, solucionados estarão, passamos a ter mais tranquilidade para tentar colocar ordem na casa e encontrar caminhos que facilitem uma possível reorganização da vida.
Há noites em que o sono vai embora e você fica pensando como fará no dia seguinte. É como se quiséssemos que a noite durasse mais tempo, o suficiente para que as soluções pudessem surgir com o nascer do sol. Não é bem assim. Por mais difícil que pareça, nada é melhor do que uma boa noite de sono para que encontremos as soluções para as questões que costumam nos assolar, rotineiramente.
Minha avó sempre dizia que apenas para a morte não existia solução, mas que, mesmo assim, só não existia para nós, porque para o morto a solução era a melhor possível. Ela dizia isso referindo-se à vida Eterna. De fato, qualquer problema se apequena, quando confrontado com a morte, com a possibilidade real da perda de alguém. Escrevo este texto em plena terça-feira de carnaval. No meio da folia, de tantos motivos de alegria para alguns, e de preocupações para outros, algumas pessoas choram a dor da perda de entes queridos. Também a morte, não deixa de ser uma oportunidade de reflexão para todos nós: não sabemos quando será a nossa hora, mas temos a certeza de que ela chegará. Portanto, a dor acaba por se tornar um bom momento para que façamos um balanço, uma verificação de como estamos tocando a vida por aqui, se não estamos nos preocupando demais com bobagens, valorizando o que não importa, deixando de viver a nossa vida para viver a vida dos outros, gastando energia demais apenas para acumular bens materiais.
A vida não pode ser reduzida a um constante turbilhão de problemas e uma infinidade de boletos a pagar…
Não que problemas não existam, ou que contas deixem de chegar mês a mês. O que ocorre é que se passamos a maior parte do nosso tempo apenas dando conta disso, algo está errado, estamos conduzindo nossas vidas de forma equivocada, estamos fazendo as escolhas erradas…
Por que de tantos problemas?
Será que estamos com problemas familiares porque nos esquecemos de respeitar o espaço do outro, esquecemos que, embora unidos por laços de sangue, somos seres diferentes, com opiniões diferentes, com visões de mundo diferentes?
Será que nossas relações amorosas se desgastaram porque não as cultivamos, porque não fomos leais, porque deixamos que a rotina apagasse a chama da paixão, porque sucumbimos às tentações passageiras e efêmeras em detrimento do amor verdadeiro, seguro, tranquilo e duradouro?
Será que nossa insatisfação profissional não reside no fato de que trabalhamos naquilo que não gostamos e que não nos satisfaz, e não fomos capazes de conciliar a necessidade salarial com nossa inclinação vocacional?
Será que nossos desentendimentos com amigos e colegas não são fruto de nosso egoísmo, de nossa falta de empatia, de nossa necessidade de competição, de nossa inveja, de nosso rancor, de nossa dificuldade de perdoar as inúmeras imperfeições humanas?
Por que de tantos boletos?
Será que todas as contas que temos a pagar são, verdadeiramente, necessárias? Será que todos os bens que adquirimos e todos os serviços que consumimos, genuinamente, se traduziram em utilidades indispensáveis às nossas vidas e à nossa felicidade?
Ou será que tantos boletos representam apenas nosso consumismo, nossa mania de acumular bens e coisas pouco úteis ou necessárias?
Ou será então que todos esses boletos representam apenas a necessidade pueril e egocêntrica de ostentarmos um status que não possuímos, no afã de demonstrar para o outro o quanto “temos” ao invés de investirmos nosso tempo no quanto “somos”?
Talvez, tantos problemas e tantos boletos representem, infelizmente, que esquecemos o verdadeiro sentido da vida: Ser Feliz!
Hipotecamos nossa Felicidade em troca de prazeres passageiros, de coisas inúteis, de relações vazias, de amizades superficiais, de empregos monótonos.
Hipotecamos nossa Felicidade, tornando-nos amargos e rabugentos em troca de boletos… Intermináveis boletos…
Erramos. Mas ainda há tempo. E tudo tem solução. Ainda podemos rever nossas vidas, repensarmos nossas escolhas, mudarmos nosso destino. O futuro pode ser diferente, nosso livro da vida ainda não chegou ao epílogo.
Então, mãos à obra, pois a vida precisa ser mais do que pagar boletos!
*Eugênio Maria Gomes é escritor e funcionário da Funec.