Margareth Maciel de Almeida Santos
Advogada e doutoranda em Ciências Sociais.
Pesquisadora CNPQ
– “Estou me sentindo órfã!”. Foi assim que minha arrumadeira se expressou para mostrar sua indignação com a situação do país. Ela me relatou que está se sentindo perdida, sem pai e sem mãe, que não sabe em quem confiar: – Vim de João Pessoa para tentar uma vida melhor aqui no Rio, estou com medo de tudo…
Sabemos que o nosso país, Estado Democrático de direito, está em risco, além de enfrentar sérias dificuldades políticas e econômicas. E posso dizer que as coisas pioraram muito depois do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, diante da ilegitimidade de Temer. O povo não o reconhece como presidente, já que não o elegeram para presidente, além de estar ocupando um cargo que foi consequência de um “golpe”. Isso tudo está refletido na violência que se impera inclemente a cada segundo em nosso país. E como se não bastasse, os poderes da República passaram a se desentender e se confrontar, colocando em risco os propósitos do Executivo. A presidência do Brasil ficou enfraquecida após o impeachment de Dilma.
A própria classe que bateu panelas para o afastamento de Dilma, hoje bate panelas para a PEC do teto dos gastos e a reforma da Previdência, principal projeto do governo Temer. Para alguns a PEC se for aprovada, o país dará um salto na economia, e para outros seria retirar da Constituição Federal o capítulo dos direitos econômicos e sociais, ficar sem investir em educação e saúde por 20 anos representa uma afronta ao povo brasileiro.
Para entender como a PEC é de grande importância para o governo Temer, relatarei aqui a história de Renan Calheiros, presidente do Senado Federal. Vejam bem:
O ministro Marco Aurélio Mello tomou a decisão de afastar o senador Renan Calheiros da presidência do senado, e esse se recusou a cumpri-la, levando para o STF a responsabilidade de decidir sobre a liminar que o afastou.
Como assim? Recusou a cumpri-la? Renan se recusou a cumprir uma decisão do órgão máximo de Justiça no país e até receber a notificação das mãos de um oficial do poder Judiciário?
Recebi uma mensagem através de telefone, onde Cunha faz uma crítica à posição do STF dizendo que é só bater o pezinho e falar que fico! É hilário receber esse tipo de mensagem diante da gravidade do caso. E se a moda pega? Temos que admitir que o povo brasileiro sabe ter não só inspiração, mas acentuado humor ao assumir sua decepção e infelicidade.
A verdade é que o caso Renan, após ter aberto uma crise institucional, ganhou a guerra entre os poderes. Saiu vitorioso no Supremo Tribunal Federal que reverteu a decisão liminar que o afastava do cargo de presidente do senado.
Renan estava a nove dias de deixar o cargo, 11 processos contra ele no Supremo. No entanto, segundo a mídia, o crime que o levou a virar réu foi a pensão da amante paga por empresa privada, mas que teria ocorrido há nove anos atrás. Tal fato levou ao STF concluir que Renan é réu, mas não cometido no atual mandato e poderia permanecer no cargo. “Que glória para Renan”!
Ainda se discute que Jorge Viana do PT, quem seria o substituto de Renan, caso viesse a ser afastado, poderia atrapalhar a votação da polêmica PEC do teto dos gastos, já que o PT, é contra tal projeto. Assim, o senado recorreu ao STF contra o afastamento do senador, pois o poder Executivo, já havia solicitado à sua base para que votassem matérias de relevância institucional como é o caso da citada PEC 55, de 2016. Temer precisa de apoio político para a aprovação das reformas.
O que está em jogo é o destino da economia e da sociedade, e o pior é que existe o risco de se instalar um clima de crise duradouro, o que poderá agravar as desavenças políticas sem desatar as controvérsias econômicas. Já se falaram que em 2017, as coisas ficaram ainda piores.
O problema está muito embaixo, muito mais embaixo, quando se transfere para a sociedade pagar a conta do rombo, o pagamento das dívidas, que esses mesmos políticos que estão no controle, foram os autores da construção da atual crise que assola o Brasil. Os políticos estão desmoralizados, mas continuam ditando as regras.
Assim se explica a volta de Renan para o cargo, entretanto sendo impedido de substituir o presidente da República, caso isso possa se apresentar como realidade. É um pouco confuso entender isso, já que ele pode ser o presidente do senado brasileiro.
Lembramos que foi protocolado o pedido de impeachment do presidente Michel Temer sob a acusação de tentar interferir numa decisão do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para beneficiar o ex-ministro da Secretaria do Governo, Geddel Vieira Lima. Uma manobra para retirar o embargo do órgão de preservação do patrimônio, para ser construído um apartamento de luxo em Salvador, onde Geddel adquiriu o imóvel.
Parece que nada muda…
Nesse quadro de tantas crises, sejam elas, econômica, política, institucional e principalmente ética, eu não sei mesmo como consolar minha arrumadeira… A partir de sua indignação posso dizer que eu também estou me sentindo sem pai e sem mãe, insegura, diante do mal-estar aflorado no coração do povo, já que nem os exemplos de prisão parece não ter força para mudar a mentalidade dos políticos.
As pessoas do bem, sonham com uma ética na política brasileira, mas está, na atual conjuntura, se apresenta longe de ser vivida! Uma pena…