Padre José de Fátima faz reflexão sobre o significado da consciência negra e os desafios da luta contra o racismo
CARATINGA – Termina amanhã (17), às 13h, no Bairro Santa Cruz, o “3º Fórum Regional de Igualdade Racial”, com o objetivo de debater a igualdade racial na microrregião de Caratinga. O evento é organizado pelo Cineclube Maria Sena, pelo Conselho Municipal de Políticas para a Igualdade Racial (COMPIR) e Grupo Afro São Benedito (GRUSABEN) e conta com patrocínio da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), e do Governo Estadual de Minas Gerais.
As edições anteriores aconteceram nas cidades de Dom Cavati e Manhuaçu. Em 2016, o espaço promoveu debate entre diretores de escolas, representantes da Superintendência Regional de Ensino (SRE), secretários municipais, alunos e familiares. Também participou o pastor Marco Antônio dos Santos, da Igreja Metodista de Caratinga.
HISTÓRICO
Para falar sobre o tema debatido, o DIÁRIO DE CARATINGA conversou com o padre José de Fátima Rosa, da Pastoral Afro-Brasileira da Diocese de Caratinga. Ele explica o significado da consciência negra e os desafios da luta contra o racismo, fazendo um apanhado histórico. “No que nos remete a uma reflexão mais profunda sobre a problemática da própria tomada de consciência. É um problema histórico no campo dos oprimidos. A tomada de consciência passa, sobretudo, pelas dimensões objetivas e subjetivas, que envolve percepção e aceitação de ser negro. Se perceber enquanto pertencente ao grupo, é ser parte orgânica das mobilizações que constituem o campo da luta negra. A consciência de “si” e para “si” no combate ao racismo nos mostra que não basta apenas nos aceitar como negro; é necessário ir muito mais além”.
Segundo o padre, no campo da luta, se limitar apenas na aceitação, no reconhecimento cultural e na estética negra é percorrer apenas um trecho do caminho, numa luta histórica que vem sendo travada contra o racismo. “A consciência negra nos permite ir além, unificar as formas de luta, reconhecer a forma coletiva de organização para a emancipação, definir bem as bandeiras de lutas, bem como o inimigo a ser combatido. O escravizado africano em território brasileiro queria, primeiramente, apenas ser livre, lutou incessantemente, de diversas formas por sua libertação, incialmente de forma individual contra a captura em solo africano, que se dava de forma violenta, por meio das armas, acorrentados e aprisionados”.
O padre ressalta que os escravos eram conduzidos como se fossem “mercadorias humanas”, em deslocamento até o transporte marítimo. “Chamado pela historiografia oficial de ‘navio negreiro’, consequentemente nas travessias do oceano atlântico que duravam até três meses conforme registros históricos apontam. Eram divididos em três patamares, conduziam empilhados, deitados ou sentados, porém sempre amarrados. O conflito estava instaurado e a luta sempre tencionada, uns atiravam-se ao mar, sob determinadas condições desumanas, a morte significava um ato de liberdade. Posteriormente, os sobreviventes travavam outras batalhas em solo americano. O opressor produzia suas técnicas de dominação, castigos perversos, instrumentos de tortura, legislação repressora, entre outros mecanismos de coerção. Mesmo assim, a luta era travada de formas diversas e ininterruptas e o confronto direto com o opressor mais próximo. As várias fugas, as expropriações, as primeiras formas de guerrilhas, as insurreições, por fim, os quilombos”.
CONSCIÊNCIA NEGRA
Para padre José de Fátima, em todas as fases da história do Brasil, o africano escravizado deixou o seu legado de luta e resistência de diversas formas. E todas as lutas e cultura, se apresentaram como parte fundamental da luta. “São esses processos de luta que formam a própria essência e dão significado e sentido àquilo que chamamos de consciência negra, todo esse legado nos apresenta conteúdo e forma de um risco histórico e acumulo de lutas. Na historia contemporânea, o confronto permanece constantemente contra o racismo, o genocídio, os métodos de barragem que não nos permite ascensão social e mobilidade social, contra um padrão eurocêntrico, contra o encarceramento em massa de parte da juventude negra e a todas as consequências devastadoras que são provocadas pelo racismo”.
Ele finaliza afirmando que o protagonismo do povo negro é essencial para o sucesso e avanço das lutas. “Para continuarmos a grande luta travada por nossos ancestrais desde a invasão Europeia em África, é necessário dar procedimento, o que até tem sido feito, para além da estética, dos elementos culturais, ter como ponto de partida o regate da autoestima visando a emancipação. No tempo presente, o significado da consciência negra ainda passa pelas lutas, ainda falta muito a percorrer, avançar, sem lutar não será possível darmos passos significativos na luta contra o racismo”.