Conheça “Elos do Mau Agouro”, do caratinguense Tiago Santos-Vieira, trama inovadora de terror psicológico
CARATINGA- “Nascido na mitológica Caratinga, fez implicitamente voto de pobreza ao optar pelo jornalismo, na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF – MG). Da miséria, passou à escravidão voluntária, trabalhando com periódicos em São Paulo. Foi seu lapso temporal mais produtivo, com publicações na Rolling Stone, TPM, Riders, Diário de Guarulhos… Esse ciclo se fechou, depois de ter identificado o jornalismo como um extravaso a sua paixão pelas letras. Voltou então à Terra do Nunca, vulgo Caratinga, passando um ano trancafiado num quarto escuro. Quando viu a luz, fora aprovado em um concurso público e estava grávido de um livro. Reside hoje em Brasília, onde, após uma sanguinolenta gestação, pariu ‘Elos do Mau Agouro’ (Giostri Editora)”.
É assim que Tiago Santos-Vieira se descreve. O caratinguense se destaca em um gênero ousado e constante alvo de críticas, em meio a um cenário em que a mesmice ou como ele mesmo cita “mais do mesmo” predomina: o terror. Tiago conseguiu trazer inovação ao segmento com o livro Elos do mau agouro, “um terror psicológico com pitadas de torture porn”.
Nesta entrevista concedida ao DIÁRIO DE CARATINGA, Tiago revela mais detalhes sobre o livro, o gênero terror e sua trajetória profissional.
‘Elos do Mau Agouro’ pode ser classificado como um livro de terror? Se sim, como você analisa este gênero na literatura brasileira?
Sim! É uma trama de “terror psicológico”. Mas vou desvirtuar um pouco sua pergunta, porque minhas referências para Terror são muito mais do cinema que literárias. “Elos” é uma rapsódia cinematográfica transposta para o papel. É quase um roteiro de cinema. Ao ler, você consegue fazer um filminho mental de todas as cenas. Me esforcei muito para o texto chegar a esse formato fluído e imagético. Então em “Elos” você terá muito mais de “O Iluminado” filme, do Stanley Kubrick, que de “O Iluminado” livro, do Stephen King. Muito mais de “O Exorcista” filme, do William Friedkin, que de “O Exorcista” livro, do William Peter Blatty. Se é para citar algum expoente do Terror nacional que mexe comigo, cito o cineasta Dennison Ramalho, e seu curta-metragem “Amor só de Mãe”. É perturbador! E nunca podemos deixar de citar o mestre José Mojica Marins. Seu “Encarnação do Demônio” mudou minha concepção sobre “fazer terror” no Brasil.
Três personagens marcam o seu livro: um padre, uma noviça e um terrorista do ETA (organização terrorista pelo separatismo basco da Espanha). Poderia nos descrever como foi a concepção destes três personagens?
Em termos comerciais, para o marketing e divulgação do livro, pinço três personagens: padre Marcos Muñoz: um verdadeiro experimento de engenharia psicológica que deu errado. Ou seja: um grande “tiro no pé” aplicado pela Igreja Católica. A noviça Helena Muñoz: confinada em um monastério no País Basco (Espanha). Costumo dizer que esse monastério tem um clima de “orgia alucinógena sangrenta”. Por fim cito Comandante Cienfuegos: terrorista do grupo separatista basco ETA (Espanha): um metamorfo perante as mazelas da sociedade, de quem não posso falar muito para não estragar a trama. Mas esses são apenas três. “Elos do Mau Agouro” tem muito atores e elementos. Parece uma novela do Manoel Carlos, com aqueles 1 milhão personagens (risos). É como se “Laços de Família” fosse gravada no inferno!!! (risos).
Quanto tempo demorou a escrever o livro e de onde você busca inspiração? Hoje você trabalha como analista do Ministério da Fazenda. Porque deixou o jornalismo?
“Elos do Mau Agouro” é o somatório de mil esboços mentais, carregados de muita pesquisa e anotações, que nunca vieram à tona por conta do cotidiano como jornalista: um corre-corre na “Paulicéia Desvairada” (São Paulo) que me fazia escrever sobre tudo, menos as páginas do meu livro. Então eu tomei uma decisão muito dolorosa: me desconstruir temporariamente do jornalismo, voltar à Minas Gerais e, simultaneamente, estudar para um concurso e escrever meu livro. Graças a Deus, ou ao Diabo, consegui êxito nos dois: moro hoje em Brasília, trabalhando no setor público e publiquei “Elos”, que está tendo uma ótima aceitação no mercado.
Geralmente os críticos tendem a ser mais ‘ásperos’ com o gênero terror. Como foi a recepção ao seu livro?
Acho que essa aspereza a que você se refere não é necessariamente segmentada ao Terror. É direcionada à reprodutibilidade e à falta de inovação no segmento. Existe um irritante “mais do mesmo” no Horror. É tudo um ditame mercantil, principalmente no cinema que, além de arte, é um grandiloquente comércio, deixando de fora do “circuito pipoca” coisas realmente intrigantes como “A serbian film”. Eu fugi do “mais do mesmo” e a aceitação da crítica está me deixando em paz com o suor derramado na divulgação.
O bom da leitura é poder trabalhar as imagens na nossa mente enquanto lemos. E seu livro provoca muitas imagens. Já pensou numa adaptação cinematográfica para ‘elos do mau agouro’?
Já tenho até um curta-metragem baseado no primeiro capítulo. “Elos” foi concebido como uma espécie de rapsódia cinematográfica. Digamos que esse formato foi assim arquitetado propositalmente. Sem mais detalhes… (risos).
Quando se fala do gênero terror é praticamente impossível não citar Stephen King e Edgar Allan Poe. Você tem influências desses escritores em seus livros? Tem algum autor do gênero que você se inspira?
King e Poe são ícones! Mas como disse anteriormente: tenho muito mais de cinema, psicologia e sociologia na obra, que de literatos clássicos do terror. Coloque aí um pouco de Humberto Eco, Carl Jung, David Fincher, Quentin Tarantino, Stanley Kubrick, M. Night Shyamalan… Certa vez um amigo resumiu meu livro assim: “Jorge Mario Bergoglio, sentado no sofá, debate com Toninho do Diabo e Umberto Eco sobre um filme com roteiro de Gabriel García Márquez e Marquês de Sade (e uns pitacos de Jung). A direção divide-se entre David Fincher (Seven) e William Friedkin (O Exorcista), com fotografia de James Wan e Leigh Whannell (Jogos Mortais)”.
Essa é uma pergunta clássica feita aos escritores, mas realmente o escritor se sente ‘deus’ às vezes (risos)?
Eu estou mais para o Ceifeiro que para Deus… Tipo a Morte com sua foice, levando as almas embora… Mato todo mundo, a todo instante em “Elos”. (risos).
Você foi colaborador da Rolling Stone, revista mais voltada para cultura pop. Geralmente jornalistas que trabalham nestes veículos tendem a escrever no estilo de Greil Marcus ou Nick Hornby. Você foge à regra, porque optou por este lado mais obscuro?
Fui colaborador da Rolling Stone, fazendo crítica de música. Colaborei também com a TPM e a Riders. Trabalhei fisicamente no Diário de Guarulhos, como repórter e depois editor assistente. Digamos que, dentro do jornalismo literário/musical, venho de uma escola mais Hunter Thompson e Lester Bangs, que são sim uns caras bem obscuros (risos).