Município de Caratinga e comissão interventora do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora buscam reorganizar repasses e tornar a unidade como referência em alta complexidade
CARATINGA- A Maternidade Grimaldo Barros de Paula reabriu as suas portas às 15h do último sábado (7). Não trata-se de uma retomada completa de serviços disponibilizados pela unidade, pois isso demanda recursos financeiros disponíveis. Mas, para a comissão interventora e a Prefeitura de Caratinga, que é responsável pela gestão plena de saúde, este é um passo importante para que o Hospital Nossa Senhora Auxiliadora (HNSA) possa se reerguer.
Para falar sobre as movimentações em torno da reabertura da maternidade e expectativa de reativação das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) neonatal e adulto foi realizada uma coletiva de imprensa na manhã de ontem. Participaram entrevista, a diretora interventora do HNSA, Flávia Eugênia de Souza; o secretário de Saúde, Wagner Barbalho e o prefeito de Caratinga Wellington Moreira.
De acordo com Flávia Eugênia, a maternidade tem como propósito o atendimento tanto para as gestantes de risco habitual quanto para as de alto risco. No entanto, como não há ainda recursos suficientes para garantir o funcionamento das UTIs neonatal e adulto, a maternidade reabriu somente para as grávidas de baixo risco, ou seja, que não apresentam maior risco de complicações.
Além destes partos, as gestantes que vão até a unidade com queixas de algum tipo de dor ou outro mal-estar, são avaliadas pela equipe. “Estamos reabrindo um lugar onde nascem pessoas. É um renascimento dessa maternidade. Tudo está correndo bem até agora, estamos com a equipe completa, porém, a gente ainda precisa ajustar algumas coisas. Hoje o que a gente conseguiu ofertar de imediato para não prejudicar ainda mais as parturientes é o risco habitual, que são parturientes que não vão precisar provavelmente de CTI (Centro de Terapia Intensiva) para elas e nem para os bebês. Até por uma questão de repasse e adequação. Hoje a gente conta com seis leitos de UTI neonatal e seis leitos de UTI adulto. Pactuado para o hospital são 10 leitos de UTI adulto, porém, com o déficit financeiro que a casa vem sofrendo, têm alguns equipamentos que ainda estão em manutenção”.
A despesa da maternidade gira em torno de R$ 600.000. Como apoio para que estes serviços sejam ativados novamente, o hospital espera contar com uma contratualização junto a Caratinga e outros 12 municípios da microrregião de saúde. A proposta do Ministério Público foi de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que determina o valor de R$ 1 por habitante. “Acredito que após a reunião de semana passada, tão logo ocorra os repasses do teto MAC (teto para incremento da Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar) e com assinatura do TAC per capita, a gente consiga remontar a equipe, pagar, para que os plantonistas retomem os plantões e a gente consiga abrir. Hoje é uma questão financeira, a princípio. A gente tem o programa da Rede Resposta que entra como parte, temos as pactuações da contratualização que entra com outra parte e agora com a assinatura desse documento, que é uma complementação dessa defasagem do SUS, juntando todos esses convênios a gente consegue manter ela (maternidade) em pleno funcionamento”.
No entanto, de acordo com informações do próprio MP, fornecidas ao DIÁRIO, o documento já foi assinado por alguns municípios. Outros sinalizaram interesse de assiná-lo, mas ainda não o fizeram. Flávia destaca que esse entendimento entre os municípios é muito importante para que o hospital possa retomar o seu pleno funcionamento. “Estou aguardando a ata de assinatura e pagamento dos prefeitos, até o momento somente o prefeito de Vargem Alegre realizou o pagamento. Mas, será em torno de R$ 203 mil dependendo se os 13 municípios assinarem o TAC. Então, esse valor oscila, se tiver uma menor adesão, teremos também uma defasagem que vai implicar numa nova discussão com o secretário e o prefeito da plena. Entendo que os municípios têm essa dificuldade de repasse assim como eu. É um momento de se haver parceria entre os municípios, uma fala única para que a gente possa mais rapidamente possível colocar a maternidade de alto risco para funcionar, considerando o perfil das parturientes aqui da micro”.
Flávia Eugênia ainda ressaltou que para essa reabertura foram necessárias algumas mudanças envolvendo número de funcionários e reajuste no valor pago aos plantonistas. “Houve uma redução drástica de valor de plantão, a gente teve que reajustar, não é fácil, mas é uma realidade. Tive que reduzir folha de funcionário, esse hospital estava inchado, então houve cortes drásticos. É claro que a gente também trabalha algumas questões com os conselhos, entidades de classe que nos cobram volume de pessoas por leito, mas nesse momento a gente tem que trabalhar com o que é possível. Não adianta ter uma estrutura dessa toda fechada e decaída. Então, essa renegociação é uma proposta colocada inclusive para os funcionários”.
Atualmente, a dívida com o corpo clínico é em torno de R$ 9 milhões, valor que ela considera impossível de ser quitado imediatamente. Por isso, a direção do hospital espera contar com apoio da equipe médica, que embora esteja com pagamentos em atraso, se disponibilizem a manter os atendimentos. “Queremos nos ajudem, em nossas reuniões já deixei muito claro que nesse momento todos precisam ceder um pouco. Entendo que eles passaram por um momento de sofrimento também, mas o hospital não tem condições nesse momento de assumir um passivo dos quais ele não tem entrada. Não tem de onde tirar esse dinheiro hoje. Tão logo o hospital comece a executar quem depreciou o patrimônio e a gente receba essas indenizações, vamos ratear e pagar. O que é devido é devido, mas existem contratos aqui que a gente precisa rever, são obscuros, difíceis de serem discutidos judicialmente”.
Questionada sobre a reabertura do hospital e da maternidade não terem sido feitas no mesmo período, a diretora interventora esclareceu, inicialmente, que são “fontes distintas e equipes distintas”. “Na verdade a gente reabriu o hospital com clínica médica, estamos dando retaguarda pra UPA (Unidade de Pronto Atendimento), porque precisamos sentar com a equipe cirúrgica e pediatria. Sou só uma prestadora, as decisões são dos 13 municípios e eu executo. E foi decidido por eles que a gente faria a reabertura da clínica médica para garantir a retaguarda direta da UPA”.
MUNICÍPIOS E O HOSPITAL
Após as conversas com os prefeitos da microrregião, Dr. Welington citou que os principais problemas encontrados pelos municípios em relação ao hospital era saber se os recursos seriam destinados à fonte certa. “Temos um histórico de que tantos os políticos, quanto as pessoas que trabalhavam no hospital não tinham um comprometimento primeiro com a saúde pública, atendimento às pessoas que necessitavam e com o dinheiro que aqui era colocado. Em 2013 houve a efetivação de um contrato entre a microrregião e o Hospital Nossa Senhora Auxiliadora e de lá para cá, como nós sabemos a inflação galopante, na saúde não é diferente. Não houve um aumento desse repasse, principalmente que o Estado e a União faziam para o hospital, através do gestor pleno que é a Prefeitura de Caratinga. Tínhamos o receio de colocar dinheiro no hospital e que tudo voltasse a acontecer como acontecia até então num passado bem recente”.
Mas, segundo Dr. Welington, os municípios retomaram a confiança com a presença da comissão interventora no HNSA. “Agora tivemos a certeza que a equipe da intervenção, comandada pela doutora Flávia tinha realmente um compromisso social, não político, mas administrativo em converter para a população tudo àquilo que aportava de financeiro e não tivemos dúvidas de que nós deveríamos retomar essa parceria e possibilitar realmente que o hospital talvez ainda não na sua totalidade, porque não depende só dos municípios, mas também do governo do Estado e Federal no sentido de aumentar os repasses”.
Dr. Welington ainda destacou que segundo apurado por auditorias realizadas no hospital, nos anos anteriores, “aquilo que entrava financeiramente no hospital não era gasto com a saúde”. “Eram outras finalidades, que através da equipe interventora está sendo buscado responsabilidades e a Prefeitura também, juntamente com a Câmara de Vereadores, instaurou uma comissão de auditoria para auxiliar e buscarmos os verdadeiros culpados. A gente tem certeza absoluta que quem retirou o dinheiro da saúde do hospital e, consequentemente, dos 13 municípios da microrregião, chegaremos à responsabilização dos responsáveis pelos desvios financeiros ou mau uso desse dinheiro. Faremos isso e entregaremos às mãos do Ministério Público. Aquilo que se ficou até o final de 2016 obscuro, com a utilização indevida desses recursos, as pessoas pagarão por isso”.
Para o prefeito de Caratinga, a maioria da população tem atribuído os problemas do hospital aos gestores da microrregião, o que ele afirma não ser “responsabilidade nossa”. “Tirem de onde tiraram aquilo que elas levaram de forma indevida. Terão de recolocá-lo para uso do hospital. Assim teremos o hospital funcionando na sua plenitude, de forma satisfatória, as pessoas não terão o que reclamar e vão parar de atribuir ou jogar nas costas dos municípios, dos prefeitos que assumiram as administrações nos 13 municípios em janeiro desse ano. A responsabilidade pela situação que acabou provocando o caos na saúde pública, principalmente no atendimento hospitalar, não se deve a nenhum dos 13 prefeitos da microrregião, mas àqueles políticos ou não políticos que passaram pela administração do hospital de um período talvez de 2009 até 2016, que utilizaram do hospital para fazer política, fazer dele o seu local de retirada de dinheiro e colocar onde não deveria ser colocado”.
Apesar das dificuldades enfrentadas pelas prefeituras, por exemplo, com a queda nas arrecadações, segundo Dr. Welington, os prefeitos estão dispostos a contribuir com o hospital. “Talvez o nosso posicionamento enquanto gestor da microrregião tenha causa certo impacto com aquelas pessoas que passaram pelo hospital e que fizeram dele, como se fosse seu, para tirar daqui aquilo que não lhe competia fazer. Estão assustados um pouco conosco e com a comissão interventora, no sentido de buscar culpados. Sabemos que a vida não só de Caratinga, mas de todos os municípios está deficitária financeiramente. Mas, estamos fazendo um sacrifício além daquele que nós poderíamos assumir, para que pudéssemos recolocar o hospital num primeiro momento para funcionar, ainda que de forma crescente, para que volte a acontecer de forma definitiva. Nos propusemos a abraçar a causa juntamente com a equipe interventora, para que pudéssemos ter a saúde de Caratinga no seu devido lugar”.
E completou a esperança de “dias melhores” na saúde de Caratinga, devido à atuação de uma comissão interventiva “competente e que está buscando solucionar os problemas”. “Como disse a doutora Flávia, divergência de opiniões, pensamentos, existem muito, mas o objetivo nosso é um só. Pensamos num único sentido que é de buscar a reabertura total do hospital. Hoje temos à frente da Secretaria alguém que tem um profundo conhecimento da saúde que é o Wagner Barbalho. É importantíssimo termos pessoas que realmente conheçam da área na qual se dispuseram a atuar. E nós estamos tendo hoje na saúde a competência do Wagner, o poder de diálogo infinitamente maior até que talvez o nosso como prefeito, porque às vezes o tempo não nos é o adequado, mas tem tido essa disponibilidade de conversação”.
NOVA PROPOSTA
O secretário de Saúde Wagner Barbalho afirmou que a intenção é formalizar uma nova proposta de contratualização do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora, buscando apoio da microrregião e governos estadual e federal.
“É uma oportunidade que estamos tendo de ter um recomeço do hospital, mas pautado pelo respeito, credibilidade da assistência às pessoas e que vamos precisar contar com apoio de todos os entes, não só dos 13 municípios na qual nós já estamos contando, nesse novo projeto de reestruturação do hospital. Obviamente que há um município ou outro que tem maior dificuldade, que está sendo negociado com o Ministério Público, mas nessa proposta o hospital vai contar com cerca de R$ 200 mil da microrregião para retomar sua assistência”, comentou o secretário.
Conforme Wagner, para um hospital que conta com130 leitos e outros 10 leitos de UTI adulto e seis leitos de UTI neonatal, o recurso aportado atualmente é considerado “insignificante”. “O hospital recebe em torno de R$ 800 mil e precisa de no mínimo 100% de aporte de recursos para poder voltar a funcionar na sua plenitude. Daqui para frente o que se fizer vai ser voltado para a assistência à população. A população tem que entender que mesmo que de forma parcial, no que o hospital se predispõe a fazer, vai fazer com qualidade. Com os R$ 200 mil aportados pelos municípios, o hospital vai conseguir manter a UTI neonatal, maternidade e UTI adulto. Vamos fazer a reabertura parcialmente dentro de um cronograma daqui para frente, porque precisa da visita da Vigilância Sanitária, o hospital precisa adequar as equipes às escalas de plantões, para voltar a atender”.
Wagner ainda enfatizou que a proposta de hoje não tem nenhuma semelhança com as propostas que foram feitas anteriormente de reorganização do hospital. “Apresentamos uma negociação na Secretaria Estadual de Saúde e já houve uma primeira conversa, apresentamos uma proposta de cofinanciamento do Estado e da União. Esperamos na semana que vem já poder fazer uma nova reunião com a presença do hospital e garantir o repasse. Precisamos contar agora nesse primeiro momento com a colaboração e todos, imprensa, prefeitura, médicos da cidade, pediatras, obstetras, cirurgiões, anestesistas; todos têm que dar um voto de confiança para nós nesse momento. Pela primeira vez um prefeito assume de fato que o hospital é o equipamento de saúde mais importante que temos na cidade e região”.
O secretário ainda frisou que a Prefeitura de Caratinga e dos outros 12 municípios estão num momento de “reconstrução” do hospital. “A promotoria está à frente desse projeto junto com a prefeitura, com a comissão interventora e mostrando que através do diálogo podemos construir uma saúde adequada para nossa microrregião. São mais de 200 mil habitantes que migram diretamente para esse hospital e se a gente for contar as BRs que passam pela nossa região, serão mais de um milhão de habitantes que vão usar esse hospital”.
Inicialmente, a decisão é de reabertura do hospital adequando aos recursos repassados. Depois, o objetivo é qualificar o hospital para ser referência em alta complexidade e algumas clínicas, por exemplo, a ortopedia de alta complexidade. “Não temos e precisamos fazer esse hospital para ser retaguarda para toda a região nessa área. Isso já está sendo negociado com o Estado e o Ministério da Saúde, porque é uma demanda nossa e de todo o território”.
Por força de um decreto de estado de calamidade pública na saúde, declarado em agosto deste não, que autoriza a adoção de todas as medidas administrativas necessárias à contenção da situação de emergência no âmbito da saúde, em especial, reformas estruturais, aquisição pública de medicamentos, insumos e materiais e a contratação de serviços estritamente necessários ao atendimento da situação emergencial; o município afirmou que repassaria ainda ontem o valor de R$ 91 mil para o HNSA.