Ildecir A. Lessa
Advogado
Com a eleição deste domingo, o Brasil conhecerá seu novo presidente. Apregoa-se, numa parte da imprensa que, a vitória do extremista de direita, Jair Bolsonaro, prevista pelas pesquisas, mergulhará o Brasil numa era incerta, na qual, se todas as ameaças forem cumpridas, a democracia sofrerá um claro revés.
Para corroborar essa insensatez da imprensa, houve busca da opinião dos principais intelectuais, pensadores e personalidades da cultura da América e Europa, que avaliam a possível chegada ao poder de Bolsonaro, quais foram: Walter Salles, cineasta brasileiro “Estaríamos entrando em um período de escuridão”. Alice Braga, atriz brasileira “Se Jair Bolsonaro vencer o segundo turno das eleições será uma fissura profunda em nossa sociedade, no país e no mundo”. Sergio Ramírez, escritor nicaraguense “…surge da transformação de um eleitorado imenso, o maior e mais variado na América Latina, em uma grande escola de samba onde a mais pervertida demagogia, Deus, ordem e família, dão os passos de sua dança macabra”. Juan Villoro, escritor mexicano, “Bolsonaro representa um risco extraordinário para a América Latina e para o mundo inteiro”. Juan Gabriel Vásquez, escritor colombiano, “Jair Bolsonaro é um fascista: e seria um erro, um novo erro na longa cadeia de erros que nós, democratas, cometemos nos últimos dois anos, acreditar que é desproporcional chamá-lo por esse nome”. Jorge Ramos, jornalista mexicano, “O crescimento de Bolsonaro no Brasil reflete, infelizmente, o pior do Brasil e da América Latina”. Jorge Edwards, escritor chileno “O Brasil é um país de frequentes surpresas eleitorais.” Noam Chomsky, linguista, “A eleição de Bolsonaro será uma tragédia para o Brasil e a região”. Alberto Barrera, escritor venezuelano, “Bolsonaro ainda não ganhou e já é uma preocupação internacional”. Bernard-Henri Lévy, filósofo e escritor francês, “É preciso recordar as inumeráveis declarações racistas, misóginas, homofóbicas, belicistas e, às vezes, criminosas do candidato que hoje encabeça as pesquisas”. Beatriz Sarlo, analista política argentina, “Bolsonaro, vitorioso, soberbo e descarado, prova algumas das hipóteses que se tornaram correntes nestes anos”. Chico Buarque de Hollanda, cantor “Ainda prefiro acreditar numa vitória de Fernando Haddad. A outra hipótese seria um desastre para o Brasil e uma vergonha para os brasileiros”. Milton Hatoum, escritor, “Um eventual governo de Bolsonaro será um enorme retrocesso político e social ”. Caetano Veloso, músico, “Se Bolsonaro for eleito, estaremos de frente com as ideias mais grosseiras sobre como se deve organizar uma sociedade humana”.
Essas opiniões, em que pese a posição intelectual de cada um, não guardam conexão com o sentimento democrático do povo brasileiro. O Brasil sabe votar. Tudo começou, relativo as eleições presidenciais no Brasil com a Proclamação da República, quando o presidencialismo foi adotado como sistema de governo pela Constituição de 1891. A primeira eleição que escolheu um presidente no Brasil foi uma eleição indireta que aconteceu em 1891. Foi eleito Deodoro da Fonseca, como presidente. Mais três eleições disputadas: a de 1910, 1922 e 1930, tiveram como vencedores, respectivamente, Hermes da Fonseca, Artur Bernardes e Júlio Prestes.
Com a ascensão de Vargas ao poder, o Brasil só voltou a ter eleições presidenciais em 1945, na eleição que inaugurou o período conhecido como Quarta República. Esse período democrático da nossa história aconteceu em meio a duas ditaduras (Estado Novo [1937-1945] e Ditadura Militar [1964-1985]). Eurico Gaspar Dutra foi o presidente eleito em 1945 e inaugurou o período democrático conhecido como Quarta República. Ao longo da Quarta República, aconteceram eleições nos seguintes anos: Em 1945, Eurico Gaspar Dutra foi eleito presidente com 55% dos votos; Em 1950, Getúlio Vargas foi eleito presidente com 48% dos votos; Em 1955, Juscelino Kubitschek foi eleito presidente com 36% dos votos; em 1960, Jânio Quadros foi eleito presidente com 48% dos votos. Os presidentes na Quarta República (1945-1964) eram eleitos para um mandato de cinco anos. Não era permitida a reeleição, e o vencedor era decretado por maioria simples dos votos, assim, não era necessária a realização de segundo turno. Nesse período, a população também votava separadamente para vice-presidente, e isso fez com que candidatos de chapas diferentes fossem eleitos, como aconteceu em 1960, quando Jânio Quadros (UDN) e Jango (PTB) foram eleitos presidente e vice, respectivamente.
Com o início da Ditadura Militar, o brasileiro perdeu o seu direito de eleger o presidente. Isso foi possível pelo Ato Institucional nº 2, Art. 9º, que afirmava que a “eleição para Presidente e do Vice-Presidente da República será realizada pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal”. Em 1985, a eleição presidencial continuou sendo indireta, uma vez que a Emenda Constitucional Dante de Oliveira (Emenda das Diretas Já) foi derrotada na Câmara dos Deputados. Nessa eleição, Tancredo Neves foi eleito presidente por voto indireto, mas faleceu antes de assumir a presidência. Com isso, seu vice, José Sarney, assumiu e tornou-se presidente do Brasil. O atual sistema eleitoral foi instituído com a Constituição de 1988 e foi aprimorado com a Lei das Eleições, decretada em 1997. Nesse período da história brasileira, conhecido como Nova República, aconteceram eleições nos seguintes anos: Em 1989, Fernando Collor foi eleito presidente no segundo turno com 53% dos votos; Em 1994, Fernando Henrique Cardoso (FHC) foi eleito presidente no primeiro turno com 54% dos votos; Em 1998, FHC foi reeleito presidente no primeiro turno com 53% dos votos; Em 2002, Lula foi eleito presidente no segundo turno com 61% dos votos; Em 2006, Lula foi reeleito presidente no segundo turno com 61% dos votos; Em 2010, Dilma Rousseff foi eleita presidente no segundo turno com 56% dos votos; Em 2014, Dilma Rousseff foi reeleita presidente no segundo turno com 52% dos votos. Dilma Rousseff.
O atual sistema eleitoral do Brasil funciona de acordo com o que determina a Constituição Federal, Código Eleitoral brasileiro, e algumas leis esparsas. É dentro desse sistema democrático, já bem amadurecido no Brasil, que acontecerá o segundo turno da eleição presidencial. O Brasil sabe votar e, por isso mesmo, dispensa as opiniões desses intelectuais, que parecem desconhecer que, o que está acontecendo no Brasil é mais uma fase do ciclo republicano.
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