Foi sondado pelo Vasco, mas preferiu descansar e esperar o encerramento dos campeonatos estaduais. Ficar mais perto da família, reciclar, cuidar da saúde. Volta no brasileiro.
Abraço para todos de Caratinga. tenho amigos e familiares na cidade. Tenho afinidade com a cidade.
Ney Franco, o senhor é formado em educação física. Essa formação é fundamental nos dias de hoje para ser técnico de futebol?
No Brasil não existe uma escola de treinadores. Geralmente os treinadores se formam pela experiência adquirida dentro de campo, no caso os ex-jogadores, e treinadores que saem das escolas de educação física. Penso que os dois profissionais quando tem conhecimento técnico tem capacidade e desenvolver bons trabalhos. Mas quem tem essa oportunidade de estudar, principalmente essa parte teórica do futebol, a metodologia de treinamento, ter esse conhecimento teórico, facilita muito seu trabalho no dia a dia. Comigo isso foi fundamental para minha formação e por isso consegui trilhar um caminho deste as categorias de base a chegar dirigir equipes da Séria A do futebol brasileiro é porque tive esse embasamento adquirido na universidade. Eu que não sou um ex-atleta tem me ajudado muito e penso que esse é o caminho da maioria das pessoas que sonham em ser treinadores de futebol.
Sua primeira grande conquista foi com o Ipatinga, quando se sagrou campeão mineiro em 2005. Como foi o processo de montagem daquele time vencedor?
Foi um projeto vitorioso. Fiquei à frente do Ipatinga por um ano e meio. Foi um projeto desenvolvido em parceria com o Cruzeiro. Na época eu era treinador do sub-20 do Cruzeiro e através do Zezé Perrella, juntamente com o Eduardo Maluf (na ocasião gerente de futebol do Cruzeiro que hoje trabalha no Atlético) e o Itair Machado (presidente do Ipatinga), foi feito um trabalho para aproveitar alguns jogadores da base do Cruzeiro que não estavam tendo oportunidades no time profissional. O Itair Machado achou a ideia boa e foi uma parceria que deu certo. Iniciamos o trabalho no final de 2004. Além da comissão técnica, vieram 16 jogadores do Cruzeiro. Foi um trabalho muito bem feito. Vencemos o campeonato mineiro de 2005, no ano seguinte o Ipatinga chegou a semifinal da Copa da Brasil, eliminando equipes como Santos, Náutico e Botafogo. Depois foi eliminado pelo Flamengo em dois confrontos muito difíceis. Ainda chegou a final do campeonato mineiro, mas perdeu para o Cruzeiro.
Em seguida foi trabalhar no futebol carioca. Existem muitas diferenças entre trabalhar em Minas e nos outros grandes centros futebolísticos do Brasil?
Com o time profissional, em Minas só trabalhei no Ipatinga, embora tenha trabalhado no Cruzeiro e no Atlético nas categorias de base. Tanto as equipes mineiras quanto as cariocas são de muita tradição. Mas acredito que essa diferença hoje está na parte estrutural. Hoje Minas Gerais tem uma ligeira vantagem. Cruzeiro, Atlético e o próprio América, que disputa a Série B, tem uma ótima estrutura física e me parecem estarem mais organizados economicamente do que as equipes do Rio de Janeiro. Logicamente isso facilita o trabalho dos profissionais que estão nestes clubes. Mas não podemos nunca desprezar a tradição dos clubes cariocas e a projeção que eles dão aos profissionais. O certo é que quem trabalha nestes clubes mineiros e cariocas tem a oportunidade de colocar seu nome no cenário nacional e tem a possibilidade de fazer bons trabalhos.
O senhor tem uma ligação forte com as categorias de base. Qual sua avaliação do trabalho que hoje é feito com os jogadores em formação?
Acredito que Brasil e Argentina são os celeiros do futebol mundial em termos de lapidação. São países que lançam muitos jogadores no mercado. Mas acredito que possa ter uma melhora na qualificação desses atletas brasileiros. Digo que passei por experiências positivas nas categorias de base. Como disse anteriormente, já trabalhei no Atlético e no Cruzeiro, onde tive uma passagem com muito sucesso. Foram quase dez anos de trabalho. Além de conquistar títulos, ajudamos na revelação de jogadores da base e contribuímos para a formação desses atletas.
Ainda falando em categorias de base, poderia nos contar um pouco das campanhas vencedoras em 2011, quando dirigindo a seleção brasileira de juniores que foi campeã sul-americana e mundial?
Foi uma experiência muito positiva. Foi uma seleção que mais jogadores que saíram da base estão jogando no profissional. A maioria dos jogadores daquela seleção está jogando em grandes clubes do Brasil e do exterior. Goleiro Gabriel hoje joga na Itália, os laterais Alessandro e Danilo jogam no Porto/POR, o Juan hoje é o capitão da Inter de Milão. Cassimiro também joga fora do país. O volante Fernando, que era do Grêmio, está no exterior. Felipe Coutinho (Liverpool), Lucas (Paris Saint Germain), Oscar (Chelsea) que joga na seleção principal. Neymar que hoje um dos grandes jogadores do futebol mundial, Dudu que foi para o Palmeiras e vários clubes do futebol brasileiro o queriam. É um jogador de um potencial enorme. Além do Alan que joga na Europa. Conseguimos montar uma seleção muito forte e foi a seleção que mais jogadores vingaram no futebol. Fiquei feliz porque tivemos critério e fizemos boas convocações. Fizemos bons treinamentos e preparamos bem a equipe, que foi muito vitoriosa. Sinto-me orgulhoso por ter o título sul-americano e também mundial da categoria e feliz por ver que esses jogadores conseguiram vagas em grandes times.
Pensa em voltar a seleção?
Todo treinador pensa em dirigir a seleção brasileira. Essa experiência na seleção de base no futuro pode pesar ao meu favor. Mas para chegar a seleção temos que ter um bom trabalho dentro dos clubes. Tenho que evoluir muito em minha carreira de treinador. Mas tenho a esperança de que no futuro que essa oportunidade de ser um treinador da seleção brasileira. Avalio que o Brasil está muito bem servido de treinador. O Dunga está fazendo um bom trabalho. Porém quem sabe no futuro possa assumir um cargo que é um dos mais importantes do futebol mundial.
Depois o senhor dirigiu o São Paulo, onde foi campeão da Copa Sul-americana. Mas parece que houve uma divergência de opinião com o Rogério Ceni. Ficou alguma mágoa dessa passagem pelo São Paulo?
Não ficou nenhuma mágoa. Eu peguei o São Paulo numa época onde ele estava há três anos sem conseguir um título. Fiquei um ano no clube e foi um período difícil em termos de campeonato brasileiro. Tiramos o time de zona intermediária na tabela e terminamos o campeonato brasileiro de 2012 em quarto lugar. E neste mesmo ano conseguimos o título da Copa Sul-americana para um clube que estava a algum tempo sem ganhar títulos. Como na vida temos os momentos bons e ruins, no ano seguinte veio o desgaste no cargo. Em 2013 disputamos a Libertadores e passamos da primeira fase e pegamos o Atlético/MG num momento muito bom. Fomos eliminados e após essa eliminação a diretoria optou por retirar alguns jogadores do elenco. Após este período de retirada dos atletas e essa eliminação e perdemos o controle do trabalho. Foi uma mudança boa para o clube e na minha interpretação foi bom pra mim também. Saí do São Paulo e fui para o Vitória. Realizei um bom trabalho no time baiano em 2013.
Quanto ao Rogério Ceni houve um atrito num determinado momento, mas isso já foi superado. Ele ainda segue jogando e jogando bem. Eu sigo minha carreira e são dois profissionais que se respeitam.
O senhor acredita que existe falta de respeito dos clubes para com os treinadores. Os dirigentes brasileiros são imediatistas e não aceitam um trabalho em longo prazo?
Na realidade a cultura do futebol brasileiro está muito em cima de resultados. E quando este resultado não vem, o dirigente acha que é mais fácil trocar uma peça do que outras peças. Então o treinador brasileiro na sua formação tem que saber lidar com este tipo de pressão. Acredito que no futuro essa cultura do futebol brasileiro possa mudar. Clubes, torcida e mídia entenderem que qualquer clube em alguns momentos vai passar por algum momento de turbulência. Temos que saber que no Brasil, onde o futebol é muito equilibrado, nenhum clube irá ganhar todos os títulos. Então vai chegar um momento onde um treinador poderá cumprir seu contrato de três ou cinco anos. Penso que isso esteja próximo, enquanto esse momento não chega, temos que nos adaptar e conviver com essa corda bamba. O jeito é ter tranquilidade e inteligência pra lidar com este tipo de pressão.
O Cruzeiro está mantendo o técnico.
Sim. Mas desde o início o trabalho do Marcelo Oliveira deu certo. Ele não passou por nenhum momento de turbulência dento do Cruzeiro, embora não tenha ganhado o campeonato brasileiro de 2013, mas a direção do clube foi paciente com ele. Então esperamos esse trabalho seja uma referência e que o Marcelo fique por muito tempo no Cruzeiro e continue ganhando títulos. Se não ganhar títulos em algum momento, que a torcida, critica e diretoria tenham paciência, pois ele já demonstrou que tem condições de gerir uma equipe do nível do Cruzeiro. Isso vale para qualquer treinador que ficar três ou quatro anos num clube terá condições de desenvolver um trabalho.
Ano passado o Brasil sediou a Copa do Mundo. Qual sua avaliação desta competição? Foi apresentação alguma mudança tática que tenha te chamado atenção?
Primeiramente a expectativa que tínhamos em relação a seleção brasileira em termos de Copa era a melhor possível. Imaginávamos que o Brasil chegaria entre os quatro primeiros, mas forma como o Brasil perdeu, algo que ninguém imaginou. Agora temos que pensar no futebol brasileiro, refletir o que está acontecendo. Crescemos ouvindo que o futebol brasileiro é o melhor do mundo, que o brasileiro é o povo mais apaixonado pelo futebol, mas isso tudo não é mais uma realidade. Hoje temos países jogando futebol no mesmo nível do que o nosso e alguns momentos até superior. E essas torcidas tem a mesma paixão ou até mais do que a nossa. Então temos que ter um carinho especial na formação do nosso atleta. Não só na parte técnica, tática e física, mas na parte emocional. O futebol está equilibrado, temos trabalharmos fortes, termos uma metodologia de trabalho que prepara melhor o nosso atleta. E o atleta tem que se envolver com sua formação. Assim poderemos continuar no topo do futebol.
Qual clube joga melhor hoje?
Penso que são os clubes mineiros. O Cruzeiro é bicampeão brasileiro e o Atlético ganhou a Copa do Brasil jogando muito bem. Mas acredito que a temporada de 2015 será muito equilibrada. Além de Cruzeiro e Atlético, acho que o Corinthians vem forte, Palmeiras está reformulando o seu plantel. E com o Osvaldo Oliveira no comando tem toda condição de fazer um bom trabalho. O Internacional sempre esperamos um time forte. O time tem bom elenco. São essas equipes que vejo com melhores condições, mas logicamente dentro do campeonato brasileiro possa surgiu outras equipes que briguem pelo título.