Eugênio Maria Gomes
Ela já conhecia Paris, mas aquele convite recebido de última hora atingiu em cheio – como acontece à flecha disparada por um bom arqueiro -, a sua necessidade de espairecer e o seu gosto por viajar, principalmente para rever a encantadora Cidade Luz. As condições eram boas e, ademais, o convite era assinado por uma amiga muito especial. Mesmo sem o devido planejamento para uma viagem a uma cidade tão distante da que morava, não viu maiores problemas, já que outras pessoas do seu relacionamento também estariam na excursão.
Helô sabia, no entanto, que em Paris seria praticamente impossível compartilhar o quarto do hotel com uma de suas amigas, até porque elas eram em número de quatro, divididas em dois aposentos. Achar alguém que “combinasse” com ela, certamente seria difícil, já que os pacotes haviam sido vendidos com antecedência e as pessoas já estavam mais ou menos agrupadas, de acordo com as suas características e preferências.
Tudo transcorria muito bem, com muita alegria e diversão tomando conta da turma, até que o grupo chegou ao saguão do hotel reservado pela empresa responsável pela excursão. Problemas com o hotel? De jeito nenhum. Até para um francês, com o seu rotineiro jeito turrão de ser, a acolhida foi muito boa. Passados alguns instantes, Helô assistiu à entrada de suas amigas no elevador, enquanto aguardava a “chamada” dos demais componentes da excursão, lhes informando sobre o quarto que ocupariam.
- Helô!
- Sou eu…
- Você ficará com a Maísa
- Quem é Maísa?
– Ela já se encontra no quarto de número 923 e será informada pela portaria enquanto você sobe…
De fato, Maísa já havia sido informada sobre a sua chegada, pois mal acionou a campainha do quarto, ouviu a mensagem de boas vindas: entra!
E Helô – meio assustada – entrou no quarto… Mal conseguia enxergar a sua companheira de quarto, tamanha era a cortina de fumaça no ambiente…
- Nossa! Quanta fumaça!
- É que eu estou pitando um cigarrinho…
- Mas, aqui não e proibido fumar?
- Eles dizem que sim, mas eu não quero nem saber. Não posso descer a todo
momento para fumar…
- Mas todo mundo faz isso. Fumar no quarto é um absurdo. Se as outras pessoas
deixam o hotel para fumar, por que você não pode fazê-lo?
- Assim que você puder me ver entenderá porque não posso fazê-lo…
Aos poucos, a fumaça foi se dissipando e Helô pode visualizar a mulher deitada na cama ao lado da sua. Pela clara, sorriso fácil, dotada de péssimo hábito. Como poderia uma pessoa ser descortês a ponto de fumar em um quarto fechado, sem se importar com o incômodo causado a outrem? Afinal, o que teria a tal Maísa de especial que pudesse ser visualizado? Helô não percebeu nada de anormal, mas também não quis ser indiscreta e fazer perguntas pessoais a uma, ainda, desconhecida…
Mas, os problemas de Helô, naquela noite, estavam apenas começando, pois não obstante a diminuição do uso do fumo por Maísa, outras novidades seriam apresentadas pela companheira de quarto…
- Lolô, tá (sic) acordada?
- Lolô não, o máximo que aceito como apelido é Helô…
- Ah! Deixa de bobagens… Preciso de você…
- Para quê? Já estava entrando em sono profundo.
- Pega água pra mim?
- Como assim, pegar água pra você?
- É que eu tenho dificuldades de locomoção e, como esta cama é muito alta, fico com medo de cair…
Helô buscou água uma, duas, três vezes. Em intervalos de duas horas em cada uma das vezes que se levantou, o que significa que ela passou praticamente a noite toda por conta de Maísa, sem entender exatamente o que dificultava a sua locomoção, o que foi acontecer, horas depois…
Ajudou a “amiga” servindo o seu café e, depois, no passeio em um cit tour… Um dia inteiro carregando muleta, ajudando Maísa a subir e a descer do ônibus… E a noite chegou. Mais um período de sono intercortado por pedidos sucessivos de água, de ajuda para ir ao banheiro e de fumaça de cigarro… Muita fumaça!
No terceiro dia Helô comentou com uma de suas amigas o entrevero que estava passando. A amiga foi visitá-la no quarto e, abismada com tanta fumaça, convidou-a para dividir com ela e a sogra o quarto que ocupavam. Helô bem que tentou, mas, apesar do lençol colocado entre as duas camas – que se transformaram em uma cama e casal -, se sentiu incomodada… Principalmente com a posição a que foi forçada a ficar – olhando para o teto -, já que a sogra de sua amiga, dormindo, vez ou outra a procurava para fazer uma “conchinha”…
Por fim, sua amiga encontrou a solução junto a uma turista que havia adquirido o uso do quarto individual.
Quem não gostou da solução dada ao problema de Helô foi Maísa Não se passou uma noite sem que ela, a cada baforada, não se lembrasse de sua amiga…
Helô, também, jamais se esqueceria daquelas noites com Maísa… Em Paris!
Eugênio Maria Gomes é escritor, professor e pró-reitor de Administração do Centro Universitário de Caratinga – UNEC.