DIÁRIO conversou com três delas, que contaram suas histórias de vida. Um dos relados é movido pela alegria, mas os outros mostram mães em busca de atenção
CARATINGA- Elas vivem em um lar. Mas, um lar que não é de origem. Um lar sem filhos, sem qualquer presença da família. Algumas escolheram estar lá, outras, não tiveram opção. Os muros as separam da rua e da convivência social.
O DIÁRIO foi conhecer a história de mães que residem no Lar dos Idosos Monsenhor Rocha, situado no Bairro Santa Cruz. Um abrigo que oferece assistência especializada, cuidados personalizados e amparo físico, mental, social e espiritual para estes idosos.
A reportagem chegou ao local na tarde desta quarta-feira (8) e foi gentilmente recepcionada pela assistente social Silvânia Aparecida da Rocha. Ela informou que grande parte das idosas que residem no local é solteira e não teve filhos. Mas, ao longo do tempo, em diálogo com a profissional, foram surgindo interessantes histórias.
Na caminhada pela varanda, corredores e demais espaços do Lar, sorrisos sinceros, acenos e era possível perceber o anseio daqueles idosos por interação. Visitantes são excelentes oportunidades para conversar e ter mais contato com pessoas diferentes das que eles convivem.
Nilza e o filho Pedro
A primeira parada da reportagem foi em uma sala onde repousavam três senhoras. Ao fundo, deitada na cama, sorridente e alegre, estava Nilza Ferreira da Silva, 74 anos, conhecida como “Nilza do Fuade”. Ao escutar o movimento de pessoas chegando ao local, mais que depressa, ela exclamou o nome do filho: Pedro. O motivo é que ele vem todos os dias visitá-la e como a assistente social Silvânia destacou, eles são muito unidos.
Ela conversou com a jornalista Nohemy Peixoto e fez questão de enaltecer as qualidades do filho. “O Pedro é muito educado, não responde ninguém, ele é bom demais. Não bebe, não fuma. Igual a ele não existe. Nossa, ele não me larga, onde eu vou ele está atrás”.
Sobre morar no Lar dos Idosos, ela se mostra satisfeita e responde positivamente. “Gosto daqui, gosto dos meninos que moram aqui. Eles todos são bom pra gente”.
Questionada sobre o Dia das Mães, uma empolgação toma conta de Nilza e ela responde mais que rapidamente. “Agora no Dia das Mães é o Pedro que vai me dar um presente. Vou deixar pra ver o que ele vai trazer pra mim, ele dá presente bom”.
Poucos minutos depois, Pedro Victor Ferreira da Silva chegou para visitar a mãe, como de costume. Ele não tem condições de morar com Nilza e tratar de todos os cuidados de saúde que ela precisa, mas, sempre se preocupa com ela com todo carinho. Sua cadeira ao lado da cama fica reservada para conversar e trocar afeto com a pessoa mais importante de sua vida. “Minha mãe é maravilhosa, ela cuidou de mim, a gente teve uma convivência muito boa, até que ela precisou vir pra cá por motivos de saúde, mas, não deixo de vir aqui dia nenhum, só quando não é possível mesmo. Amor de mãe e de filho não pode esquecer nunca. Ela é maravilhosa, devo minha vida a ela por inúmeras coisas. Que ela tenha um Dia das Mães maravilhoso e que ela melhore a cada dia mais”.
Na despedida da reportagem, ela fez questão de pedir que a equipe voltasse para visitá-la e exclamou: “Essa menina é tão boazinha, né?”, se referindo a jornalista.
“Ele não vem, ninguém vem me ver, parente nenhum, ninguém…”
O DIÁRIO seguiu para outro quarto, onde estava sozinha, deitada em sua cama, a idosa A.M.S, 71 anos. Com um olhar triste, ela aceitou conversar com a reportagem e contar sua história. Ela revelou que teve três filhos, mas, que dois faleceram. “O meu filho mais velho era um menino muito peralta. Ele saía para jogar bola, um dia ele cismou de ir para a cachoeira e morreu afogado. E o mais novo morreu novinho, com cinco meses. Então só tenho o do meio”.
Diferentemente da primeira história relatada, A.M.S não recebe a visita do filho. E falar sobre isso deixou a idosa bastante emocionada. O olhar e a voz embargada se resumiram em uma palavra: solidão. “Ele não vem, ninguém vem me ver, parente nenhum ninguém. Saber onde ele está eu sei, que ele trabalha e onde ele mora, mas, de convivência não. Depois que fiquei doente fui para a casa da minha irmã, lá no Anápolis. Fiquei lá uns anos e depois ela me trouxe pra cá. Não conheço meu neto. E minhas sobrinhas não vêm me ver. Sinto muita saudade do meu filho (lágrimas), saudade da minha casa”.
Segurando as mãos da repórter, A.M.S se despediu com um aperto leve, quase não era possível sentir o seu corpo. Lhe faltavam forças após chegar ao ápice da dor de reconhecer que sua companhia hoje se restringe aos muros daquele Lar.
“Falo que nem tenho filho. Eles me abandonaram, não quiseram cuidar de mim”
Retornando ao corredor, muitas senhoras sentadas nos sofás, assistindo TV, conversando… Uma delas estava sendo cuidada por uma funcionária que lhe trançava os cabelos. Em especial, uma estava quieta e serena. A assistente social Silvânia entrou novamente em ação, chamando-a para o refeitório: “Quero te contar um segredo. Você quer falar sobre o Dia das Mães?”. Ela acenou positivamente. Assim, com a reportagem, S.A, 75 anos seguiu para uma mesa onde também relatou um pouco de sua história.
Ela disse que antes de morar no Lar dos Idosos Monsenhor Rocha, residiu em um outro asilo. “Eu vim pra cá para ver se melhorava para mim, porque não estava me sentindo bem no outro, graças a Deus estou sentindo muito bem aqui”.
S.A teve cinco filhos, mas, questionada sobre eles, se revela um triste relato. “Falo que nem tenho filho. Eles me abandonaram, não quiseram cuidar de mim. Falaram que eu tinha que arrumar minha vida quando eu era nova, para ter minhas coisas agora na velhice, assim que eles falavam para mim. Não me deixava entrar nem na casa deles, fiquei do lado de fora do prédio”.
São cinco filhos, cinco chances. Mas, por mais que S.A tenha esperado por anos, ninguém cruzou o portão do Lar dos Idosos. Não há contato. “Nenhum vem ver. Fico é mudando de casa, de lugar, porque às vezes um lugar está ruim, mudo para um outro e fico assim. Eles estão muito bem, trabalham por conta própria, têm apartamento que é deles e quando fui conversar com eles nem no condomínio me deixaram entrar”.
Sobre o Dia das Mães, para S.A é um domingo comum, sem novidades. Apesar do sofrimento, a fala da idosa externa a aceitação de uma realidade que não conseguiu mudar. “Eu choro, não gosto nem de falar. Choro, porque eu queria eles pertinho de mim, não para dar nada, mas, para ficar perto deles. Estou aqui, se não fosse aqui eu estava na rua. Minha família agora é aqui”.
Esse diálogo e a reportagem se encerraram com um olhar triste de S.A e um afago.
*Os nomes de A.M.S e S.A não são revelados nessa reportagem de modo a preservar a identidade das idosas e de seus familiares