Sarau promovido pela Escola Estadual Isabel Vieira teve como foco o Romantismo. Evento foi marcado por música, teatro e muita poesia, além de revelar para Caratinga seus ‘Novos Românticos’
CARATINGA – Um singelo verso de Álvares de Azevedo (1831/1852) talvez resumiria o espírito daqueles que participaram do Sarau do Romantismo da Escola Estadual Isabel Vieira: “Só tu à mocidade sonhadora…”. Mas essa mocidade sonhadora que esteve nas dependências do Instituto Hélio Amaral, no Bairro das Graças, na manhã da última quarta-feira (8), luta contra estes tempos ásperos, contra estes tempos digitais. Essa mocidade não apenas sonha, ela põe em prática seus sonhos. Essa mocidade sonhadora os realiza. Sejam bem-vindos, Novos Românticos.
O Romantismo é um estilo de época. Apesar de ter surgido na Alemanha, o fato histórico que motivou o aparecimento desse movimento artístico foi a Revolução Francesa, um acontecimento importante para toda a Europa. Ele é caracterizado pelo subjetivismo, excesso sentimental, idealização e fuga da realidade. O Romantismo teve seu apogeu no Século XIX, sendo marcado pelo sentimentalismo e pela idealização amorosa.
ALÉM DA POESIA
E o evento teve ambientação especial. Em um lugar do Instituto Hélio Amaral foram dispostos bancos e mesas, com xícaras de chá em cima delas. Essa ambientação provocou nos participantes uma experiência de imersão numa época, mas sem tê-la vivido. Os livretos contendo as poesias feitas pelos alunos deu um ar romântico e cativante.
E o Sarau do Romantismo não apresentou apenas poesias, foi algo abrangente com música, dança e teatro. Entre um número e outro, professor Robson extraía de um computador versões instrumentais e comoventes para clássicos recentes do pop, como as canções ‘Iris’ do Goo Goo Dolls e ‘Love Story’ da diva Taylor Swift.
O público gostou do apuro nas apresentações teatrais. A caracterização dos personagens e a desenvoltura dos alunos foram dignas de aplausos. Dentre as encenações, trecho de ‘Iracema’ de José de Alencar.
E uma das idealizadoras e organizadores do Sarau do Romantismo, ao lado da professora de História, Cláudia Cristina Sousa Silva; é a professora de Língua Portuguesa, Thaís de Lima. E como nos versos de Casimiro de Abreu (1839/1860), “Simpatia — é o sentimento /Que nasce num só momento, sincero, no coração”. Thaís de Lima era pura simpatia com o que via, seu coração sincero estava contente ao ver o trabalho de seus alunos, a quem os chama carinhosamente de “meninos”, sendo reconhecido.
Ela trabalhou o tema com seus alunos e esse trabalho rendeu um livreto com poesias. “Além da poesia, a gente deu oportunidade dos nossos meninos se expressarem. A adolescência é o momento de eles mostrarem as emoções. E aqui eles tiveram essa oportunidade através do nosso livreto, da arte, da música e da apresentação das peças teatrais, de mostrarem aquilo que estão sentindo”, descreveu a professora.
Chamou atenção as apresentações das peças teatrais. A professora Thaís de Lima relatou que os ensaios foram árduos, mas valeram muito a pena. “Os meninos conseguiram se identificar com vários personagens. Eles entraram mesmo naquilo que tinha que fazer e graças a Deus, deu tudo muito certo”.
A professora pondera que este evento tende a se repetir todos os anos, afinal, foi acesa a chama da cultura. “É o primeiro Sarau do Romantismo da Escola Estadual Isabel Vieira, mas pretendemos fazer todos os anos e contando com as novas gerações”.
Sobre a escolha do tema ‘Romantismo’, Thaís de Lima explicou: “O Romantismo é dividido em três fases. Nós sabemos que tem o amor pela pátria, que tem a fase ultrarromântica, que tem a fase abolicionista. E os meninos, cada um deles se identificou com fases diferentes. Nós escolhemos o Romantismo porque através dele os meninos conseguiram expressar suas emoções, eles conseguiram serem eles mesmos”, enalteceu a Thaís de Lima, professora de Língua Portuguesa da Escola Estadual Isabel Vieira.
ARTE COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DO SER HUMANO
O diretor Vagner Aquino Zeferino, que foi até ‘mestre de cerimônia’ em determinados momentos do Sarau, destacou a importância da arte para os alunos. “É com grande prazer que a Escola Estadual Isabel Vieira está promovendo o Sarau do Romantismo. Trata-se de um projeto que a escolha tem planejado a bastante tempo e que ele traz consigo algo muito importante na educação que é o protagonismo do aluno, ou seja, o aluno fazendo”.
Vagner Aquino destacou que este trabalho resgatou a questão das épocas. “A professora trabalhou muito bem todas as etapas do projeto e hoje estamos na culminância. E é um prazer muito grande de como gestor da escola, participar deste evento maravilhoso, que contou com a participação de pais, alunos e de toda comunidade escolar. Os alunos brilharam nas apresentações. Sabemos que a arte é um dos maiores instrumentos que temos para que haja promoção do ser humano e a construção do conhecimento que é a razão de toda escola”.
DIRETAMENTE DAS PÁGINAS DE UM LIVRO DE JANE AUSTEN
“Orgulho e Preconceito”, obra de Jane Austen (1775/ 1817), foi apresentada no Sarau. E como se brotasse das páginas deste livro, assim estava vestida Stefani Fernandes Protêncio, aluna do 3º 2. Com um longo vestido azul escuro, cabelos soltos e maquiagem discreta, sua beleza lembra a da atriz Mariana Rios. Ela contou como foi sua experiência ao participar desse projeto. Stefani declamou poesias e também narrou a apresentação de “Iracema”. Um trecho de “Orgulho e Preconceito” diz: “A distância é curta quando se tem um bom motivo”. Tímida, Stefani encurtou todas as distâncias e se sobressaiu. “Foi algo importante pra mim. Eu mesma sou uma pessoa muito tímida e esse evento ajuda a gente a vencer a timidez. A gente tem que enfrentar e esse Sarau me ajudou. Foi gratificante participar”, descreveu.
Ela literalmente vestiu a personagem. “Tem que vestir para fazer bem feito (risos)”. A aluna também escreveu uma poesia, que consta no livreto deste projeto. “Fiz minha poesia, mas não a proclamei, li outros poemas”.
Por fim, Stefani revelou que gosta mais da segunda fase do Romantismo. “O sentimento, a gente se expressa”.
Eis a poesia feita por Stefani Fernandes Protencio:
Amor não correspondido
Assisto de longe
A minha doce amada
Que por outro
Continua apaixonada
Um amor não correspondido,
Em meu coração silenciado,
Sem rumo, vou seguindo,
Toda vez que vejo você
Por ele sorrindo!
Amo-te em segredo
Não posso controlar
Espero que em algum momento
Eu por ti pare de sonhar.
ESPECTADOR ESPECIAL
E o Sarau do Romantismo contou com um espectador especial: Fernando Campos. Ele, que lecionou na Escola Estadual Isabel Vieira por 26 anos, disse que sua avaliação do evento foi a melhor possível. Fernando Campos é um amante da poesia e tem dois livros: ‘Insolvência: Fragmentos de amor e morte e um esboço de despedida’ (2016) e “Desjejum” (2017). Assim que se aposentou, ele passou seu bastão para justamente Thaís de Lima. “O ambiente está extremamente agradável, uma acolhida maravilhosa do professor Hélio Amaral com a equipe da Escola. Então, estou reencontrando vários colegas de trabalho. Conclui minhas atividades como professor na escola no ano de 2022 e esse reencontro conta com a presença dos alunos e toda essa alegria, com poesia, com música. Um trabalho feito carinhosamente para divulgar a leitura, a arte. Minha avaliação é totalmente positiva”.
O MESTRE
Sentando na primeira fileira e atento a tudo, estava o professor Hélio Amaral, um dos maiores incentivadores de cena cultural caratinguense. Em conversa com o DIÁRIO, inicialmente descreveu o instituto que leva o seu nome. “É uma instituição privada. É uma honra para o Bairro das Graças ter um instituto cultural que é uma referência em Caratinga. Desde o início, o Instituto teve uma política de aproximação com a Escola Estadual Isabel Vieira. É uma honra recebê-los e reafirmamos nosso desejo de sempre estarmos em comunicação com a Escola Estadual Isabel Vieira”.
O professor também explicou sobre o tema do Sarau. “O evento está celebrando o Romantismo, que é sobretudo, muito conhecido na Literatura. E muito divulgado no Século XIX. O Brasil tornou-se independente em 1822, quando o Romantismo estava nascendo. O Romantismo é mais ligado ao Nacionalismo e o Brasil fica independente no Século do Romantismo. O Instituto Hélio Amaral tem uma xícara romântica, com mais de 100 anos, e tem um prato também romântico. O Romantismo foi uma época muito bonita, foi a época do sentimento. Hoje nós somos modernos. E mais uma vez o Instituto está contente de ter albergado aqui esse movimento”.
Enfim, foi um dia de celebrar a vida. E como nos versos de Gonçalves Dias (1823/ 1864): “Como se lê num espelho, pude ler nos olhos seus! Os olhos mostram a alma, que as ondas postas em calma também refletem os céus; mas ai de mim! Nem já sei qual fiquei sendo depois que os vi!”. A Mocidade Sonhadora pôde ver os olhos da alma da arte neste dia 8 de maio de 2024 nas dependências da Instituto Hélio Amaral. E ninguém sai incólume diante dos olhos da arte. A arte é transformadora e está transformação é benéfica.
E saindo das letras e entrando na pintura, uma frase do pintor espanhol Joan Miró (1893/1983) resume o Sarau do Romantismo. Miró foi surrealista, mas suas palavras são realistas: “Mais importante do que a obra de arte propriamente dita é o que ela vai gerar. A arte pode morrer; um quadro desaparecer. O que conta é a semente”. E muitas sementes foram, são e serão plantadas nas salas de aula da Escola Estadual Isabel Vieira. O conhecimento perpassa gerações e novos românticos surgirão.
- Apresentação de ‘Iracema’, de José de Alencar, foi um dos pontos altos do Sarau de Romantismo
- Evento ainda teve valsa
- Alunos usaram figurino de época para as encenações
- Professores com os livretos com os poemas dos alunos
- Livreto é fruto da criatividade dos alunos
- As professoras Cláudia e Thaís, idealizadoras e organizadoras do Sarau do Romantismo
- Professora Thaís de Lima mostra satisfação com o êxito do projeto
- Diretor Vagner Aquino Zeferino
- Sarau do Romantismo ajudou Stefani Fernandes Protêncio a vencer sua timidez. Ela conversou com a reportagem do DIÁRIO
- Fernando Campos foi professor de Língua Portuguesa durante 26 anos na Escola Estadual Isabel Vieira
- Professor Hélio Amaral, um dos maiores incentivadores de cena cultural caratinguense