Ildecir A.Lessa
Advogado
Sabe-se por percepção crítica que, informações falsas, boatos, fofocas ou outras formas de comunicação que, não verdadeiras, são tão antigas quanto o homem. Aquilo que vem, como parecendo uma inocente brincadeira de criança, uma mentira pode provocar desentendimentos políticos ou religiosos, gerar ganhos ou perdas econômicas, difamar ou caluniar alguém, influenciar a tomada de decisões e, em alguns casos pode até colocar em risco a vida do homem.
As mentiras podem ser proliferadas, atingindo um número maior de pessoas, por meio do velho boato. Claire Wardle do First Draft News, identifica sete tipos de notícias falsas: Sátira ou paródia (“sem intenção de fazer mal, mas tem potencial para enganar”), Falsa conexão (“quando as manchetes, visuais das legendas não dão suporte a conteúdo”), Conteúdo enganoso (“má utilização da informação para moldar um problema ou de um indivíduo”), Conteúdo falso (“quando o verdadeiro conteúdo é compartilhado com informações falsas contextuais”), Conteúdo de impostor (“quando fontes verdadeiras são forjadas” com conteúdo falso), Manipulações de conteúdo (“quando informação genuína ou imagens são manipuladas para enganar”, como fotos “adulteradas”), e Conteúdo fabricados (“conteúdo novo é 100% falso, projetado para enganar e fazer mal”). O cuidado deve ser redobrado.
Somente no Delfos Google 3,5 bilhões de buscas são feitas por dia. Hoje são mais de 3,4 bilhões de pessoas conectadas. No Brasil, são mais de cem milhões. Nessa ciranda de buscas desenfreadas e ansiosas, está a lente vigilante da Lei. A simples utilização indevida da imagem já constitui-se em nítida violação punível, onde a pessoa lesada pode buscar reparação cível. Se a utilização da imagem também vem com dados pessoais da pessoa “clonada”, surge a capitulação do crime de falsa identidade, previsto no artigo 307 do Código Penal. Quando presente o interesse de prejudicar direito ou criar obrigação, configura-se um crime mais grave, que é a falsidade ideológica, prevista no artigo 299 do mesmo Código. Ainda na seara penal, no que se refere aos aspectos penais, caso a divulgação da notícia falsa seja praticada com ciência do embuste e intenção de ofender alguém, poderá configurar crime contra a honra: calúnia, injúria ou difamação, conforme previsão do Código Penal.
O certo é que, a disseminação de fake news através da internet representa grande desafio para a Lei. Isto, desde a atribuição da autoria delitiva até a remoção de conteúdo. O ambiente podre, das redes sociais é propício para a disseminação desse tipo de conteúdo, pois o algoritmo que o governa busca conteúdos que agradem aos usuários e, depois, estes mesmos tratam de pulverizar essas notícias, sem verificar a fonte, apenas porque o conteúdo os agrada no âmbito de suas convicções pessoais. Para as redes sociais, é interessante, do ponto de vista negocial, que os usuários passem mais tempo utilizando seus produtos e interagindo com seus anúncios publicitários. Nesse cenário de incertezas do recebimento de dados, as notícias falsas ganham um campo fértil para prosperar em velocidades proporcionais aos estragos causados a um indivíduo ou a um país inteiro, comprometendo, por vezes, até mesmo o processo eleitoral. Na esfera judicial, presentes os requisitos para a concessão de tutela provisória, caberá representação judicial pela suspensão do conteúdo falso, junto ao responsável por sua hospedagem.
A situação é tão grave que, já existem projetos-lei para coibir esse abuso desenfreado. O Projeto de Lei 6.812/2017, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), pretende instituir como crime a ação de quem “divulgar ou compartilhar, por qualquer meio, na rede mundial de computadores, informação falsa ou prejudicialmente incompleta em detrimento de pessoa física ou jurídica”. Já o Projeto de Lei 473/2017, de autoria do senador Ciro Nogueira (PP-PI), pretende acrescentar ao Código Penal uma nova tipificação de divulgação falsa, consistente em “divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar ou corromper a verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segurança pública, à economia nacional, ao processo eleitoral ou que afetem interesse público”. As inovações tecnológicas têm trazido grandes desafios a legislação penal.
Na seara de fake news, a velocidade de propagação urge a tomada de medidas eficazes visando minorar os danos sofridos por terceiros. Várias iniciativas têm sido debatidas sobre esse tema, tais como: criação de grupos de trabalho, proposições legislativas, reuniões com provedores de aplicação de internet, agências de checagem de fato, utilização de inteligência artificial e aprendizado de máquina para detecção e combate aos bots, dentre outros. Não obstante, a divulgação de boatos, atos criminosos e mentiras tem ganhado espaço na internet, sendo repetido assim, a velha cena do antigo boato, agora, travestido de fake news.