DESASTRE AMBIENTAL

O verde virou cinza: danos ambientais ainda estão sendo calculados pela PM Ambiental

Incêndio consome extensa área de vegetação de Dom Lara a Dom Modesto: prejuízos à natureza e a produtores rurais

 

CARATINGA- Um cenário de destruição após um incêndio que atingiu uma extensa área de pastagem que teve início no distrito de Dom Lara e seguiu em direção a Dom Modesto.

Os danos ambientais e a área afetada ainda estão sendo mensurados pela Polícia Militar Ambiental e para se ter uma ideia, conforme os militares, esse trabalho pode levar dias para ser concluído. O fato é que foram inúmeros os prejuízos para os pequenos produtores, principalmente os que trabalham com a Pecuária. Muitos tiveram que se desfazer de sua criação. Animais ameaçados, o verde vira cinza, a vida mais uma vez consumida pelas chamas.

A reportagem esteve no local e conversou com alguns moradores que relatam a gravidade dos danos provocados. Weslen Almeida Soares foi um dos primeiros a perceber o fogo ainda na quinta-feira (16). “Tive a informação dos meninos que vieram trabalhar aqui pra mim, que estava tendo um fogo na fazenda vizinha. Fui lá na frente dar uma verificada, quando eu vi que o fogo já tinha saltado as estradas e estava vindo em direção à nossa propriedade e do meu vizinho. Voltei para minha casa, chamei uns amigos que estavam aqui no dia trabalhando e tentamos controlar o incêndio que vinha com uma velocidade assustadora. Chamas atingindo quatro a seis metros de altura, chegava a deitar na pastagem pegando 15 metros à frente quando o vento soprava nele, a pastagem da fazenda vizinha estava muito alta, densa, seca”.

Foi uma intensa força-tarefa para controlar as chamas. Mas, a situação era extremamente grave e a comunidade encontrava muitas dificuldades no trabalho. “Conseguimos contornar um pouco a situação, quando o fogo chegava nas passagens mais baixas, por exemplo, minha propriedade estava com a pastagem mais baixa, conseguimos fazer uns aceiros, jogar fogo contra fogo, apagar com bomba de vaporização. Fomos controlando, mas, ele seguia avançando, saltava estradas. Estamos na estrada que dá acesso à minha casa, deve dar uns seis metros, o fogo saltava com uma facilidade tremenda. Fizemos o serviço até mais ou menos umas 22h para conseguir segurar o fogo na minha propriedade, controlamos aqui, mas, ele seguiu noite adentro, queimando mata. De uma maneirada durante a noite, quando iniciou o dia, o sol começou a esquentar, continuou queimando. Foram dias assim, à noite esfria, dá uma controlada, durante o dia o sol voltava a esquentar, ele seguia queimando novamente”.

Weslen frisa que os moradores atuaram sozinhos, sem auxílio dos bombeiros ou brigadistas. “Contamos simplesmente com a comunidade. Não veio nenhum órgão público. Todos voluntários, pessoas com disposição mesmo, largaram o serviço, não se preocuparam se iam machucar ou ter algum problema de saúde. Tivemos envolvimento de pessoas na faixa etária de 15 a 70 anos quase, ajudando a controlar o fogo. A pessoa via o fogo, sabia das proporções que poderia tomar e vinha ajudar. É a boa vontade mesmo de todos os envolvidos”.

Moradores sem experiência no combate às chamas e sem equipamentos adequados. Mas, motivados pelo desejo de minimizar os danos ao meio ambiente e evitar que uma tragédia acontecesse. “Estava pensando aqui, eu estava ajudando a controlar o fogo com uma roçadeira e a minha roçadeira está com vazamento de gasolina. Na hora você não se atenta a essas coisas, imagina, ela poderia ter explodido comigo. O que mais estava sendo utilizado era roçadeira, mas, o que você vai fazer? É momento de desespero, você não sabe o que vai acontecer, se o fogo vai chegar na sua casa, se vai queimar seus animais. Eram pessoas correndo, prendendo animais em curral, tirando animais de pastagem. Um verdadeiro salve-se quem puder, não tem como você parar para pensar. Se parasse para pensar, o fogo passava por cima de você”.

Uma grande área foi afetada. Weslen arrisca a dimensionar parte do prejuízo provocado pelas chamas. “Vamos dizer assim que queimou da estrada principal de Dom Lara até a estrada principal de Dom Modesto, que dá acesso a Fazenda do Macaco. Uma área muito grande, em mata deve ser bem mais de 200 alqueires. Foi muita mata e mata que tem anos que está fechada, que se recuperou sozinha ao longo do tempo, que às vezes o proprietário largou o terreno pra lá e a mata recuperou sozinha”.

Ele cita ainda os prejuízos à natureza, com animais ameaçados e tendo seu espaço depredado pela ação do incêndio. “Na minha propriedade no mínimo é visitada por quatro espécies de macaco, o barbado, o sauá, um de porte grande e o saguizinho. Lobo-guará temos aqui nessas matas, jaguatirica, mão –pelada. Meus amigos viram tamanduá rolando fogo abaixo, que já chegou do outro lado praticamente morto. Foi uma perca para fauna e flora muito grande, não tem como mensurar. E quanto tempo talvez vai demorar para recuperar, nem imagino”.

Em relação aos prejuízos, Weslen afirma que no seu caso perdeu pouca pastagem, pois, contou com esforços de amigos. “Sei de pessoas que perderam a propriedade praticamente toda, queimou além da pastagem a capinheira, canavial; quilômetros e quilômetros de cerca aqui na região estão completamente destruídos, no chão. Em minha propriedade perdi uns dois mil metros de cerca, o mínimo que devo ter perdido, um alqueire de pasto, até pouco com relação. Mas, em mata, devo ter perdido uns dois alqueires de mata”.

Weslen segue citando situações amargas enfrentadas por outros produtores e lamenta os danos. “Muitos amigos meus aqui da comunidade tiveram que vender o gado, antes que morresse. Não tinha onde colocar, venderam a preço de banana. Hoje em dia uma vaca produtora de lei está muito cara, de R$ 8 mil o cara vendeu por R$ 4 mil e fora o gado que tiveram que vender em balança, que não tá na época correta para vender, pois, está muito leve. Um gado magro. E a falta de renda que esse pessoal vai ter agora. O pequeno produtor que trabalhava com leite e foi afetado, muitos deles terão que parar. A pessoa vive disso. Ninguém tem vaca leiteira na região por hobby, é a vida da pessoa, tira o sustento e vai ficar sem renda”.

E faz uma reflexão sobre as consequências de um possível incêndio criminoso. “É muito triste você pensar que tudo é culpa às vezes de uma pessoa irresponsável, não pensa nas consequências, no que poderia acontecer com várias famílias, com as matas, os animais. Simplesmente só pensa nela, não teve o mínimo de noção de pensar no próximo. Não consigo nem imaginar como definir uma pessoa assim”.

Thales Gonçalves Maciel também foi prejudicado e relata que as chamas tomaram conta das matas de forma que assustou a comunidade. “O fogo começou a partir do terreno vizinho. A partir daí fomos lá acudir, fizemos o aceiro, mas, não conta do fogo. O fogo se alastrou para terrenos vizinhos até chegar no meu. Foi devastador, queimou meu pasto tudo, minhas criações ficaram sem pasto, tive que vender um pouco, arrumar pasto com amigos meus. Foi um prejuízo de uns R$ 25.000 a R$ 30.000 que eu tomei”.

Ele afirma que há muitos anos não acontecia um incêndio desta proporção naquela região. “São muitos bichos, morreu bastante. É um dano absurdo, incalculável. Lamentável, uma irresponsabilidade de pessoas que ocasionou esse desastre ambiental muito grande e o prejuízo para a comunidade, fauna e flora”.

O pecuarista Expedito Bragança também contabiliza o prejuízo, pois, precisou vender parte de seu gado a um preço bem abaixo de mercado, pois, os animais estavam magros, sem se alimentar desde o dia do incêndio, já que a pastagem foi consumida pelas chamas. “Eu guardo as notinhas, só para se ter uma ideia, em novembro tiramos 5.186 litros de leite; mais de 170 litros por dia. Cheguei a ter quase 190 litros por dia. Depois foi caindo, as vacas iam criar tudo agora e veio esse fogo. A coisa é feia, tive que vender esse gado a 270 arrobas. Tive que pesar na segunda, o gado já estava um mulambo, não tinha nada para comer. Passaram fome, desde quinta. Não deu tempo, lá só tinha uns brotinhos de capim”.

Expedito lamenta o prejuízo financeiro. “Eu ia entregar essa propriedade em 31 de dezembro, meu prejuízo, fiz o cálculo mais ou menos, meu gado ia dar uns R$ 110.000. R$ 70.000 a R$ 80.000 foi a perca. Vamos ver o que vão resolver, quem colocou fogo tinha que ser responsabilizado”.

Ainda nesta quarta-feira (22), seis dias após o fato, focos de incêndio ainda eram perceptíveis no local. Os militares ambientais seguiam avaliando a área afetada e investigando uma possível autoria do incêndio. Informações devem ser repassadas à imprensa nos próximos dias.