CUMPLICIDADE

  • Eugênio Maria Gomes

O termo “cumplicidade” encontra vários significados nos dicionários da Língua Portuguesa, podendo referir-se às relações de afeto com outra pessoa ou se relacionar à coparticipação em um ato criminoso. O certo é que se trata de um elo forte, de intimidade mesmo com outra pessoa, seja para o bem, seja para o mal.

Minha história de vida está recheada de momentos de cumplicidade com alguém. Graças a Deus, sempre relacionados ao bem e, às vezes, a algumas brincadeiras com os outros. Na infância tive grandes amigos, todos muito mais velhos do que eu. Enquanto escrevo esta crônica, imediatamente me vem à memória a imagem de alguns dos muitos amigos que fiz na infância: “Narim”, Sr. José Alves e “seu” Neguinho.

O Narin – não sei exatamente o nome dele – era pai da Penha e da Maria Isabel, marido da dona Filinha. Uma pessoa de bem com a vida, que cresceu, mas permaneceu com a criança viva em seu peito até a sua morte. Éramos cúmplices em assustar as pessoas, nas piadas e nas brincadeiras de mau gosto, inclusive. Certa feita nós colocamos fogo em um jornal que estava sendo utilizado por uma mulher, protegendo sua “poupança” em uma arquibancada de circo. Por pouco não cancelamos o espetáculo!

O Sr. José Alves era casado com a D. Zinha, pai da Professora Geralda da Rocha Pena, avô do Francisquinho, do Helinho, do Flávio, do Cássio, da Maria Inêz… Éramos grandes amigos, cúmplices nas rezas do terço, nas reuniões da Conferência Santa Isabel, na guarda da chave e nos cuidados com a capelinha do Limoeiro.

O Sr. Neguinho era casado com a D. Alaíde, pai do Demerval, da Mirtes, da Elmita… Ele morava em frente à minha casa e sua residência era meu porto seguro para fugir das chineladas da minha mãe. Éramos cúmplices na “contação” de casos, cúmplices em provar as sopas e os doces da D. Alaíde e nas risadas das piadas sem graça que um contava ao outro.

Fui cúmplice das minhas irmãs, durante meses, escondendo seus namoros dos meus pais, assim como fui cúmplice, em diversas ocasiões, de pessoas que foram e ainda me são muito caras. Cúmplice na amizade, cúmplice no amor. Cúmplice na alegria, cúmplice na dor.

A cumplicidade vivida no casamento acentuou-se após a viuvez, por conta de dois grandes desafios: o de viver, dali pra frente, sem a minha metade e o de terminar de criar os filhos sozinho. Confesso que não foi uma tarefa fácil a ser cumprida, mas certamente, foi uma oportunidade de grande crescimento para todos e de fortalecimento dos laços afetivos que nos unem. Lembro-me, perfeitamente, de ver todo o meu aparente autocontrole ser quebrado logo após retornarmos do cemitério, quando ao chegar a casa, me deitei no colo de minha filha Morena e chorei. Nascia ali uma grande cumplicidade entre mim e todos os meus filhos. Choramos juntos, sofremos juntos e nos fortalecemos para prosseguir na caminhada.

A cumplicidade foi fundamental para que, assim como a fênix, pudéssemos renascer das cinzas. Uma cumplicidade que permaneceu ao longo de nossa jornada e que permanece, ainda hoje, com um apoiando o outro, ouvindo, falando (às vezes brigando!), mas sempre dividindo espaços e respeitando limites.

Mais do que compreender o outro e do que aceitar tudo o que o outro faz, a cumplicidade pressupõe gostar, ter prazer em compreender, em aceitar e em compartilhar com o outro os mais diversos momentos e situações.

Neste domingo, comemora-se o dia dos pais. Temos aqui, um dos maiores exemplos de cumplicidade, de companheirismo, de respeito e de profundo amor entre duas pessoas.

Mais do que compartilhar a mesma herança genética, pais e filhos compartilham toda uma história de vida, todo um passado comum. Compartilham uma das mais profundas relações de afeto que podemos vivenciar. Inicialmente uma relação de dependência e de subordinação, aos poucos vai evoluindo e transformando-se em admiração, carinho, respeito e de imensa cumplicidade entre ambos.

Com o passar do tempo, obedecendo ao inevitável ciclo da vida, as posições quase que se invertem, e aquele que cuidou, começa a precisar de cuidado. Não há nada mais gratificante e mais enriquecedor, do que se ter a oportunidade de cuidar dos pais. Não se trata apenas de retribuição ou de compensação. Trata-se mesmo de uma das experiências mais intensas que um filho pode ter. Trata-se de uma das mais nobres expressões de amor verdadeiro. Implica em respeito, implica em abnegação, em resiliência, em paciência, em total doação.

Nesta data, lembre-se daquele que esteve ao seu lado durante os anos mais relevantes de sua vida. E antes que reste apenas uma imensa s

  • Eugênio Maria Gomes

O termo “cumplicidade” encontra vários significados nos dicionários da Língua Portuguesa, podendo referir-se às relações de afeto com outra pessoa ou se relacionar à coparticipação em um ato criminoso. O certo é que se trata de um elo forte, de intimidade mesmo com outra pessoa, seja para o bem, seja para o mal.

Minha história de vida está recheada de momentos de cumplicidade com alguém. Graças a Deus, sempre relacionados ao bem e, às vezes, a algumas brincadeiras com os outros. Na infância tive grandes amigos, todos muito mais velhos do que eu. Enquanto escrevo esta crônica, imediatamente me vem à memória a imagem de alguns dos muitos amigos que fiz na infância: “Narim”, Sr. José Alves e “seu” Neguinho.

O Narin – não sei exatamente o nome dele – era pai da Penha e da Maria Isabel, marido da dona Filinha. Uma pessoa de bem com a vida, que cresceu, mas permaneceu com a criança viva em seu peito até a sua morte. Éramos cúmplices em assustar as pessoas, nas piadas e nas brincadeiras de mau gosto, inclusive. Certa feita nós colocamos fogo em um jornal que estava sendo utilizado por uma mulher, protegendo sua “poupança” em uma arquibancada de circo. Por pouco não cancelamos o espetáculo!

O Sr. José Alves era casado com a D. Zinha, pai da Professora Geralda da Rocha Pena, avô do Francisquinho, do Helinho, do Flávio, do Cássio, da Maria Inêz… Éramos grandes amigos, cúmplices nas rezas do terço, nas reuniões da Conferência Santa Isabel, na guarda da chave e nos cuidados com a capelinha do Limoeiro.

O Sr. Neguinho era casado com a D. Alaíde, pai do Demerval, da Mirtes, da Elmita… Ele morava em frente à minha casa e sua residência era meu porto seguro para fugir das chineladas da minha mãe. Éramos cúmplices na “contação” de casos, cúmplices em provar as sopas e os doces da D. Alaíde e nas risadas das piadas sem graça que um contava ao outro.

Fui cúmplice das minhas irmãs, durante meses, escondendo seus namoros dos meus pais, assim como fui cúmplice, em diversas ocasiões, de pessoas que foram e ainda me são muito caras. Cúmplice na amizade, cúmplice no amor. Cúmplice na alegria, cúmplice na dor.

A cumplicidade vivida no casamento acentuou-se após a viuvez, por conta de dois grandes desafios: o de viver, dali pra frente, sem a minha metade e o de terminar de criar os filhos sozinho. Confesso que não foi uma tarefa fácil a ser cumprida, mas certamente, foi uma oportunidade de grande crescimento para todos e de fortalecimento dos laços afetivos que nos unem. Lembro-me, perfeitamente, de ver todo o meu aparente autocontrole ser quebrado logo após retornarmos do cemitério, quando ao chegar a casa, me deitei no colo de minha filha Morena e chorei. Nascia ali uma grande cumplicidade entre mim e todos os meus filhos. Choramos juntos, sofremos juntos e nos fortalecemos para prosseguir na caminhada.

A cumplicidade foi fundamental para que, assim como a fênix, pudéssemos renascer das cinzas. Uma cumplicidade que permaneceu ao longo de nossa jornada e que permanece, ainda hoje, com um apoiando o outro, ouvindo, falando (às vezes brigando!), mas sempre dividindo espaços e respeitando limites.

Mais do que compreender o outro e do que aceitar tudo o que o outro faz, a cumplicidade pressupõe gostar, ter prazer em compreender, em aceitar e em compartilhar com o outro os mais diversos momentos e situações.

Neste domingo, comemora-se o dia dos pais. Temos aqui, um dos maiores exemplos de cumplicidade, de companheirismo, de respeito e de profundo amor entre duas pessoas.

Mais do que compartilhar a mesma herança genética, pais e filhos compartilham toda uma história de vida, todo um passado comum. Compartilham uma das mais profundas relações de afeto que podemos vivenciar. Inicialmente uma relação de dependência e de subordinação, aos poucos vai evoluindo e transformando-se em admiração, carinho, respeito e de imensa cumplicidade entre ambos.

Com o passar do tempo, obedecendo ao inevitável ciclo da vida, as posições quase que se invertem, e aquele que cuidou, começa a precisar de cuidado. Não há nada mais gratificante e mais enriquecedor, do que se ter a oportunidade de cuidar dos pais. Não se trata apenas de retribuição ou de compensação. Trata-se mesmo de uma das experiências mais intensas que um filho pode ter. Trata-se de uma das mais nobres expressões de amor verdadeiro. Implica em respeito, implica em abnegação, em resiliência, em paciência, em total doação.

Nesta data, lembre-se daquele que esteve ao seu lado durante os anos mais relevantes de sua vida. E antes que reste apenas uma imensa saudade, expresse seu amor, seu carinho, seu agradecimento e seu reconhecimento por essa figura que marcará permanentemente a sua vida.

Faça-o sentir que ele não está sozinho… Faça-o sentir que ele faz parte desse caminho e que, entre vocês, existe a mais doce e encantadora cumplicidade.

  • Escritor e funcionário da Funec.