Alim Rocha de Abreu*
A vida é uma bênção, uma dádiva de Deus. É um bem de tamanha magnitude que faltam acepções capazes de retratar concretamente o seu significado. De fato a vida é muito mais do que palavras sobre a quais poetas, menestréis, gênios, sonhadores ousaram discorrer no intuito de defini-la plenamente. Outros, simplistas, compreendem a vida de maneira inusitada, nivelando-a ao comum, como se o mistério da existência consistisse apenas em nascer, crescer e morrer. Contudo, a interpretação de um tema amplo e controverso não se esgota nas divagações ou impressões pessoais, acalentadas no universo subjetivo ou em crenças individuais. O viver – em sentido amplo – estende-se por caminhos tortuosos, intempestivos, desafiadores e, por conseguinte, fascinante.
Cada dia vivido nos dá a oportunidade de nos descobrirmos um pouco mais – a nós próprios – e também às demais pessoas que nos cercam. A experiência de vida exerce papel importantíssimo nesse conceito de aprendizado, e deveríamos, por conta disso, valorizar melhor aqueles cuja existência foi abençoada com a longevidade. Nesse particular questionamos: sabemos lidar condignamente com os nossos idosos? A sociedade tem agido corretamente com esta camada da população? Somos respeitosos, compreensivos e reverentes com os nossos cidadãos mais vividos?
A importância do idoso na sociedade é gigantesca, e a sua participação no contexto social cresce à medida que aumenta a expectativa de vida da população, como no Brasil. Contudo há, infelizmente, discrepâncias entre o discurso do que seria politicamente correto e a realidade afigurada. Basta atentarmos aos fatos, que comprovam comportamento diverso. Senão vejamos: apesar dos avanços essa parcela vulnerável da população ainda precisa de muito apoio. Do desrespeito à violência física, são alarmantes e preocupantes os números que apontam para o abandono dessas pessoas. “É proibido envelhecer neste país? É muito comum, nos sinais de trânsito, partir dos apressados, dos intolerantes com a própria existência, uma agressão verbal que dói nos ouvidos de quem a escuta: Sai da frente, velho! – esteja o idoso ao volante de um carro, dirigindo educadamente ou atravessando a faixa de pedestres. Isso na rua, à vista de todos. Por que não dentro de casa, longe dos sentidos de quem defende a vida até o fim? Acabou-se a convivência, acabou-se o respeito. E não é nesse caminho que deveria caminhar a humanidade” (Arnaldo Viana – Jornal Estado de Minas de 02/10/08).
Nas sociedades orientais, o idoso é extremamente valorizado pela sua sabedoria, mas, no mundo ocidental o principal valor é o consumismo, por consequência aqueles que pararam de produzir são desprezados. Afirmação constatada pelo elevado número de denúncias de agressão relatadas na Subsecretaria de Direitos Humanos. A maioria delas provocada dentro de casa, por parentes cuja ocultação do fato se mantém porque os agredidos não registram queixa. Não querem ver seus filhos atrás das grades.
Dentre as mazelas do mundo, uma das mais abjetas, sem dúvida, repousa no comportamento dessa gente que se mostra incapaz de respeitar, valorizar, amar os idosos. Não se trata de favor, mas de um dever conferir-lhes carinho, atenção, paciência. Referimo-nos ao resgate do humano como princípio de vida, como sistema e método pelos quais poderemos caminhar de cabeça erguida, sem os entraves da vergonha a ferir a nossa consciência quando vêm à tona relatos dessa natureza. Humanidade! Essa palavra parece que perdeu o sentido. O que significa? Do que ela é feita? O racional e o irracional confundem-se, nivelando-nos por baixo… e isso, convenhamos, não é humano e nem digno.
Viver consiste num exercício diário de cidadania. É uma trincheira na qual deveríamos praticar a solidariedade como norma e não como exceção. O criador de todas as coisas, que é Deus, nos presenteou com o dom da vida, e poderíamos fazer dessa prenda ainda mais prazerosa honrando os nossos “velhos”, compreendendo as suas limitações, amparando-lhes com o nosso afeto. O abandono, o desprezo, a exclusão configuram também uma forma de agressão, e não deveríamos agir assim. É imperioso erguermos uma bandeira em defesa desses heróis da existência, a fim de que um dia possamos na velhice dizer aos mais jovens: “Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé.” Vivi!
__________________________________________________________________________________
ALIM ROCHA DE ABREU é poeta, escritor, compositor, cantor e instrumentista. Graduado em Matemática pela Faculdade de Filosofia e Letras de Caratinga. É funcionário da Cemig há 31 anos. Membro das Lojas Maçônicas Fraternidade Acadêmica de Caratinga e Obreiros de Caratinga. Membro Efetivo da Academia Maçônica de Letras do Leste de Minas Gerais-AMLM