O QUE SOBRA: a polêmica autobiografia do Príncipe Harry
No dia 10 de janeiro a mídia mundial direcionou sua atenção ao lançamento de um livro comprometedor: “O que sobra”, a primeira autobiografia de um membro da realeza britânica.
A curiosidade para conhecer os segredos da família real é gigantesca, prova disso é a venda de 1,5 milhão de exemplares em um único dia nos Estados Unidos e na Inglaterra. Os brasileiros não ficaram para trás! O livro ocupa o primeiro lugar da lista de mais vendidos da Revista Veja.
”O que sobra” promete entregar um relato franco do Príncipe Harry diante de fatos polêmicos que o envolvem. O livro começa no funeral do Duque de Edimburgo em tom de briga. Na ocasião, Harry vivia um conflito com o irmão e o pai – o Rei Charles III. Em seguida, o autor diz que decidiu escrever para contar a sua versão da história e desmentir boatos que circulam na mídia tradicional.
No capítulo seguinte, visita a noite do acidente que matou sua mãe. Chega a ser inacreditável descobrir que Charles sequer abraçou o filho quando contou sobre a morte de Diana.
A sensibilidade não é um ponto forte do Rei. Ele comparava Harry e William frequentemente. Dizia que William era o herdeiro e Harry apenas o reserva (ou o que sobra). Atitudes e falas do pai fizeram com que Harry se sentisse uma pessoa descartável.
Uma das lembranças mais dolorosas que Harry narra é a teoria do rei Charles sobre sua paternidade. “Papai gostava de contar histórias, e essa era uma das melhores do repertório dele. Terminava sempre com uma explosão de filosofia… Quem sabe se sou mesmo o Príncipe de Gales? Quem sabe se eu sou seu verdadeiro pai?”, narra.
O relato foi divido em três partes:
I – “A noite que me envolve” é o impacto desastroso da morte da Princesa Diana na vida do filho. Ele fala sobre sua infância e adolescência, diz ter usado drogas ilícitas em uma importante escola, comenta sobre atitudes que ganharam capas de jornais e revela ter passado vários anos pensando que a mãe estava escondida.
II – “Sangrento, mas não deprimido” passa pelos relacionamentos frustrados e pelos conflitos com a família. Além disso, retrata de forma orgulhosa as mortes pelas quais o autor foi responsável durante missões do exército. Ele comparou os talibãs mortos a peças de xadrez eliminadas do jogo.
III – “Capitão da minha alma” faz referência ao poema “Invictus” de Willian Ernest Henley. No meu ponto de vista, é a parte mais íntima e bela do livro. Harry mostra o início de sua relação com Meghan, passa pelas grosserias da imprensa britânica e (novamente) conflitos familiares, dessa vez, com foco em William e Kate. É emocionante ler a descrição do amor do Príncipe por seus filhos.
Várias cenas me chamaram a atenção. Por exemplo, o príncipe de 38 anos narrou a reação dele e de William ao saber de seu casamento com Camilla Parker Bowles. Os filhos pediram ao pai que não se casasse com Camilla. Harry também acusa a madrasta de vazar informações para os paparazzi.
Para além da lavagem de manto sujo, a autobiografia de Harry é prova de que viver de aparências não compensa e que nenhuma fama é mais valiosa que a saúde mental. Todas as imperfeições que a realeza tentou esconder por vários anos foram publicadas em 512 longas páginas.
Trata-se de uma leitura densa e cansativa. O relato é detalhado demais, principalmente nas cenas de guerra em que o autor insiste em citar os mecanismos das aeronaves que pilotou.
Levei aproximadamente vinte horas para finalizar o pequeno calhamaço. Considerando que estou de férias, fiquei satisfeito e realizado. No entanto, em outro cenário, o semestre letivo provavelmente me faria desistir nas primeiras páginas.
Não é uma leitura simples, mas pode ser interessante para muitas pessoas. Certamente é, afinal, o livro é um sucesso consolidado no mercado editorial. Destaco o ótimo trabalho desenvolvido pelos tradutores e pelo Grupo Companhia das Letras.
Daniel Dornelas
Escritor, produtor de conteúdo e acadêmico de medicina no UNEC. Apresentador do Entre Livros, programa produzido pela UNEC TV.
Saiba mais: @lendocomdaniel