Por Paula Lanes
CARATINGA – Pequena, por ter apenas 1,18m de altura, mas grande na mentalidade, na alegria de viver e nos sonhos. A jovem Daniela Ferreira Costa, 24 anos, é filha de Daniel Armond e Conceição Ferreira. Ela tem dois irmãos, Sidnéia, 35, e Sidnei, 38. Daniela foi vítima de uma malformação congênita da coluna vertebral chamada mielomeningocele. Quando nasceu, o médico disse que Daniela, conhecida pelos amigos e familiares como “Dani”, teria apenas 15 dias de vida. Mas sua vontade de viver era muito maior, mesmo sendo uma bebê, que tinha nascido com as pernas bem finas e pequenas e os pés tortos. Os pais de Dani sempre tiveram muita fé e não aceitaram a palavra do primeiro médico, saíram em busca de ajuda, até chegarem ao Rio de Janeiro, onde a menina foi operada e somente aos quatro anos começou a andar, o que seria impossível. Daniela foi vencendo muitas barreiras, nunca aceitou ser chamada de “coitadinha”. Anda com dificuldades, o que não é empecilho para cursar o 7º período de Psicologia. Seu maior sonho é ter um carro adaptado, para ter mais liberdade para um dia poder retribuir aos pais o cuidado, amor, carinho; passeando com eles, viajar e levá-los pra visitar os parentes e amigos que moram outras cidades.
Durante toda a entrevista Dani não fez uma reclamação da vida e o sorriso no rosto é algo que nunca lhe falta.
Quando seus pais descobriram que você tinha algum tipo de problema?
Segundo minha mãe, a gravidez foi tranquila, no final ela sentiu algumas dores, mas de acordo o médico estava tudo bem e nem era preciso fazer ultrassom. Quando nasci, aqui em Caratinga, ele viu que para baixo da cintura, os membros eram finos, os pés tortos, mas mesmo assim não sabia dizer o que era. Da cintura para cima era tudo normal.
Como seus pais fizeram para ter um diagnóstico correto?
Nós morávamos na roça, Córrego Boa Esperança, perto de Sapucaia, distrito de Caratinga. Minha avó morava aqui na cidade. A princípio o médico que fez o parto da minha mãe disse que eu teria 15 dias de vida, mas ela não desistiu e me levou para Belo Horizonte, no Hospital da Baleia. Tinha menos de um ano, eu não sentava, as pernas eram dormentes. Segundo a minha mãe, também não descobriram em BH o que eu tinha, disseram que era problema na bacia e não tinha cura. Um primo nosso, o Toninho, disse que me levaria para o Rio de Janeiro, quando eu tinha três anos e meio. Minha mãe conta que fui para operar e o médico disse que tivesse tratado quando nasci as sequelas seria bem menores.
Qual o nome da deficiência física que você tem?
Os médicos do Rio de Janeiro descobriram que eu tenho mielomeningocele, também conhecida como espinha bífida aberta, é uma malformação congênita da coluna vertebral da criança em que as meninges, a medula e as raízes nervosas estão expostas. Nessa época eu tinha pouco mais de dois anos. Eu tinha três caroços que ficavam expostos, segundo minha mãe saía pus e tinha mau cheiro e dava febre, nem aguentava deitar. Os médicos disseram que eu precisava operar e quando tinha quase quatro anos precisei operar. Tiraram os caroços, que eram a espinha que ficou exposta. Fiquei internada no Rio, um mês e sete dias.
E depois da cirurgia? Como foi?
Voltei para Caratinga, fiquei um tempo na casa da minha avó. Com quatro anos, eu não andava, nem engatinhava. Uma vizinha disse que eu precisava ir para a APAE (Associação de Pais e Amigos os Excepcionais) para fazer fisioterapia e comecei a andar. Até hoje faço fisioterapia lá. Eu ficava na escolinha lá, até os sete anos, mas a professora disse eu poderia ir para uma escola normal, pois minha inteligência era muito boa, não tinha problema nenhum com aprendizado.
Como foram sua infância e adolescência? Onde estudou?
Para estudar em Sapucaia, meu pai me levava nas costas até o ponto de ônibus, nunca gostei de faltar. Quando criança sonhava em andar de bicicleta, então minha irmã amarrou meus pés no pedal e consegui, fiquei muito feliz. Estudei em Sapucaia até a 5ª série e depois viemos para a cidade e estudei na Escola Princesa Isabel até terminar o segundo grau. Brincava normalmente, mas as outras crianças me colocavam vários apelidos, de baixinha, anã, tampinha de garrafa e olhavam meu jeito diferente de andar. Chequei em Caratinga aos 12 anos, fui muito bem recebida na escola Princesa Isabel, não tive problemas com a deficiência.
Sofreu ou ainda sofre algum tipo de preconceito?
Algumas pessoas me olham e dizem: “coitadinha dela”. Mas eu tenho pena da forma que pensam, pois não sou “coitadinha”.
Quais suas maiores dificuldades?
Tenho dificuldades para andar, canso muito, sinto muitas dores nos pés e na coluna, pois ando com a ponta dos pés e as ruas não ajudam, possuem muitos buracos.
Você trabalha?
Não, pois fico mais por conta dos estudos. Estou no 7º período de psicologia, estudo no UNEC, lá no Bairro das Graças e me formo no meio do ano de 2017, tenho 50% de desconto.
Como faz para ir e voltar da faculdade?
Tenho uma amiga que passa aqui na porta da minha casa de carro, me leva para a faculdade e me traz. Quando ela não vai, ligo para algum outro colega e ele me busca.
Consegue ajudar sua mãe com afazeres domésticos?
Sem problemas, apesar de ter 1,18m, por conta da deficiência física, sempre lavei vasilhas para minha mãe. Se alguma coisa estiver em local mais alto, pego um objeto para puxar, mas faço tudo normalmente.
Em que área da Psicologia pretende atuar?
Ainda não pensei, existem muitas áreas. Já pensei em trabalhar na APAE. Quero fazer concurso público, depois abrir minha própria clínica.
Como é sua vida sentimental? Tem facilidade para arrumar namorado?
Não, mas também não estou procurando por namorado agora.
Você é vaidosa?
Demais. Para a entrevista não sabia se passava mais maquiagem ou menos, não queria que ficasse exagerado. Hoje (sexta-feira) é dia de fazer as unhas. Gosto de me cuidar.
Qual seu maior sonho?
Ter meu carro. Terei liberdade, mas tem que ser adaptado e é caro, não temos condições de comprar, meus pais são aposentados, cuidam das despesas da casa, fica impossível. Já escrevi uma carta para programas de TV para me ajudarem, pois ter um carro seria como ter asas. Gosto de passear, frequentar clubes, gostaria de viajar para Fernando de Noronha, poder levar meus pais para passear, não ficar incomodando as pessoas pedindo caronas. Queria muito que alguém me ajudasse a realizar esse sonho.
Você já tem a carteira de motorista?
Há um ano tirei a carteira. Aos 18 anos comecei a procurar autoescola aflita para tirar carteira, mas não tinha carro automático adaptado. Na época o dono da Autoescola Unida disse que era caro para obter o veículo deste, mas aos 23 anos voltei lá e para minha surpresa já tinha. Comecei na outra semana e passei em tudo da primeira vez.
Entenda mais sobre a deficiência física que Daniela possui:
A mielomeningocele, também conhecida como espinha bífida aberta, é uma malformação congênita da coluna vertebral da criança em que as meninges, a medula e as raízes nervosas estão expostas.
Não se sabe ao certo o que causa a espinha bífida. Assim como acontece com muitos outros problemas de saúde, esta condição parece resultar de uma combinação de fatores genéticos e ambientais, como histórico familiar de malformações da coluna vertebral e deficiência de ácido fólico.
Normalmente, durante o primeiro mês de gestação, os dois lados da espinha dorsal se fecham sobre a medula espinhal e todos os nervos e meninges que a acompanham. A coluna vertebral protege a medula, impedindo que ela sofra quaisquer tipos de danos. Quando ocorre qualquer tipo de malformação congênita em que não acontece o fechamento completo da coluna vertebral, dá-se o nome de espinha bífida.
Na mielomeningocele, a coluna vertebral do bebê permanece aberta ao longo de várias vértebras na parte inferior ou no meio das costas. Devido a esta abertura, as membranas e a medula espinhal sobressaem-se no momento do nascimento, formando um saco nas costas do bebê. Em alguns casos a pele cobre este saco, mas, normalmente, os tecidos e nervos estão expostos, fazendo com que o bebê esteja propenso a uma série de infecções que podem colocar em risco sua vida.
O comprometimento neurológico na mielomeningocele é comum, incluindo alguns sinais e sintomas:
– Fraqueza muscular das pernas, às vezes envolvendo paralisia
– Perda de controle e demais problemas intestinais e da bexiga
– Insensibilidade parcial ou total
– Convulsões
– Problemas ortopédicos, como pés deformados, quadris irregulares e escoliose
– Hidrocefalia
– Presença de pelos na parte posterior da pélvis (região sacral)
Tratamento de Mielomeningocele
O tratamento para mielomeningocele exige uma cirurgia de emergência até 48 horas após o nascimento.
Realizar a cirurgia precocemente pode minimizar o risco de infecções associadas aos nervos expostos e também pode ajudar a proteger a medula espinhal de algum trauma adicional.
Durante o procedimento, um neurocirurgião coloca a medula espinhal e tecido exposto dentro do corpo do bebê e os cobre com músculo e pele.
A cirurgia também pode ocorrer antes da criança nascer. Este procedimento, o chamado cirurgia de pré-natal, deve ocorrer antes da 26ª semana de gestação. Nele, o neurocirurgião opera a coluna do bebê quando este ainda está no útero da mãe. Alguns médicos defendem este tipo de cirurgia alegando que, após o nascimento, a função dos nervos expostos do bebê pode ser ainda mais comprometida. No entanto, essa operação oferece riscos à mãe e aumenta o risco de parto prematuro e também de aborto.