Quando Edward Aloysius Murphy formulou a sua teoria, pois não é uma lei, em 1949 ao dizer que “se alguma coisa pode dar errado, dará com certeza”. Podemos dizer que ele não vivia em tempos de mudanças tão intensas no clima e, portanto, podemos reformular tal teoria para: se alguma coisa pode dar errado, dará com certeza e poderá ser pior que imaginávamos.
Posso criar esse adendo devido ao caminho que vem se desenvolvendo as mudanças no clima, sendo que um de seus árduos estágios de evolução pode ser descrito pelo atual momento em que vivemos.
Como já disse em edições anteriores, acredito que estamos a caminhar para um ponto de não retorno das mudanças no clima. Em que a intensidade de modificações ultrapassa a capacidade de regeneração do sistema climático global e o resultado disso são os eventos extremos, seca ou chuva intensos, mais frequentes. Como foi visto nesta semana para a região.
Pois bem, o El Niño se desenvolveu no Oceano Pacifico. Estamos oficialmente num ano de El Niño. Acredita-se que será o mais forte desde que se iniciaram as medições em 1950.
Para quem não teve a oportunidade de saber do que se trata o fenômeno, vou fazer uma breve descrição do mesmo. O El Niño foi batizado com esse nome por pescadores da costa do Peru, pois o período de máxima intensidade é próximo ao Natal sendo descrito como a vinda do menino Jesus ou ‘El Niño Jesus’. Esse é um fenômeno climático que pode ser caracterizado pelo aquecimento das águas superficiais do Oceano Pacífico Central, inicialmente na costa do Peru e que pode se estender até a Ásia. Esse aquecimento afeta a ressurgência das águas na costa do Peru, que por sua vez reduz a disponibilidade de alimento para os peixes e resulta numa diminuição dos níveis de cardumes naquela região durante esse período.
Juntamente com o aquecimento das águas superficiais e a redução dos cardumes, o El Niño causa um enfraquecimento das células convectivas, que distribuem áreas de chuvas, baixa pressão, e secas, alta pressão, no globo terrestre. Ao afetar tais células, as chuvas em diversas regiões do globo são também afetadas.
O comportamento é distinto para diversos locais e a intensidade das mudanças na precipitação pode ser estimada em função da intensidade esperada para o El Niño em desenvolvimento.
Para este que estamos vivenciando, segundo a NOAA as chances dele ocorrer no verão e no outono são de 90 e 85%, respectivamente. Desta forma, este processo em desenvolvimento afetará o regime de chuvas não somente no verão 2015-2016, pois poderá estender-se até o outono de 2016.
Sendo assim, a crise de recursos hídricos poderia estender até o fim de 2016, algo extremamente preocupante. No entanto, pelo fato do Brasil ser um país de extensão continental, os efeitos do El Niño são distintos entre algumas regiões.
Desta forma, desde que se iniciaram as observações deste fenômeno e seus impactos no Brasil, acredita-se que eventos de temperaturas elevadas e secas intensas são observadas nas regiões norte, sudeste e nordeste. Enquanto que para a região sul pode ser observados aumento de chuvas.
Em relação a tal fenômeno, o que mais me intriga é saber que eventos que estão em desenvolvimento atualmente são desconhecidos, como o surgimento de quatro furacões alinhados no Oceano Pacífico a cerca de duas semanas. A situação é considerada de tamanha urgência que já foi elaborada uma extensa rede de estudo entre os principais centros de pesquisa climática dos EUA, como nos do LBL, a NOAA, NASA e dentre outras instituições.
Se a crise do último verão foi oriunda da supressão da umidade proveniente da Amazônia e, também, do enfraquecimento da entrada de umidade proveniente do Oceano Atlântico Sul. Hoje as expectativas são de que a crise hídrica, mesmo não sendo totalmente superada, pode ter origem inicialmente pela incapacidade dos nossos governantes e pelo desenvolvimento deste El Niño que promete ser o mais forte da historia.
Em momentos como estes penso como as pessoas que vivem da atividade agrícola da nossa região irão passar por este período de escassez, em que invernos mais quentes e verões mais secos serão mais frequentes.
A grande diferença que vejo entre a população da zona urbana e rural na nossa região é a questão do acesso ao saneamento.
Para a população que vive na zona urbana, acredito que para a cidade de Caratinga e região o povo irá pagar pelo erro de estratégia dos seus líderes através do racionamento de água e com um aumento no preço das contas residenciais. Algo que denota uma falta de planejamento, seja da esfera municipal, estadual e/ou federal, pois evidencia a necessidade de investimento e ampliação dos serviços prestados à população.
Para os moradores da zonal rural, acredito que serão os mais impactados, pois dependem do humor do clima para produzir e sobreviver. Penso que chegará um momento que o clima será tão inconstante e imprevisível que as chuvas sazonais, como as “águas de março fechando o verão” de Tom e Elis só serão frequentes nas memórias de quem viveu para ver do que somos capazes. Desta forma, vejo que num futuro bem próximo, ou mesmo desde já, será necessário implantar cisternas para armazenamento da água de chuva até mesmo em propriedades rurais.
Por fim, meu objetivo aqui não é desempenhar um papel de pessimista frente aos fatos, mas sim tratar da conscientização de todos interessados e de propor formas de atenuar ou solucionar os atuais problemas. Sendo assim, acho que esta na hora de colocar aquele projeto de coleta e tratamento de água da chuva como prioridade.
Caso tenha dúvidas e/ou sugestões envie um email: [email protected]
Paulo Batista Araújo Filho é formado em Ciências Biológicas e Recursos Naturais pela UFES. Atualmente trabalha no renomado Lawrence Berkeley National Laboratory (LBNL), Berkeley – Califórnia/EUA