Na primeira gestação de uma mulher, toda a comunidade ao seu redor se enche de júbilo. Todos querem acolher, amparar, preparar aquela mãe que está nascendo. A fragilidade e a falta de experiência fazem brotar a ternura nos corações. Já na segunda gestação, todos se alegram, óbvio, mas ninguém se mobiliza. Impera uma certa solidão. Presume-se que aquela mãe já sabe exatamente o que fazer e não precisa de conselhos ou palavras de carinho. É comum ouvir frases do tipo: “o trabalho é o mesmo”; ou: “agora você está mais tranquila e experiente e será mais fácil”.
Há um inexplicável esforço para minimizar o desafio que é a experiência da segunda maternidade. O máximo de advertência que se ouve é: cada gravidez é única e cada bebê é único, então não espere muita previsibilidade. O conselho é válido, mas insuficiente.
Quando engravidei do meu segundo filho, ao lado da alegria imensa, o sentimento era de absoluta tranquilidade e serenidade por trilhar um caminho que já estaria traçado. Pensava que, com a experiência acumulada da primeira viagem, a única novidade com a qual precisaria lidar seria com o ciúme do irmão mais velho. Eu estava enganada e não era pouco.
Imagine uma família que já se encontrava consolidada em torno de três figuras bem delimitadas. Todos sabiam qual papel desempenhar. Havia relativa estabilidade naquele núcleo. Daí chega um quarto ser humano para fazer parte deste arranjo. Naturalmente, ele mexe com todo o tabuleiro, reconfigura o jogo, embaralha os papéis. É como transformar um triângulo em um quadrado. Puxa, estica, até formar um quarto vértice.
Nesse novo cenário, delegar tarefas é uma necessidade incontornável. A figura paterna assume mais relevância nos cuidados e na atenção ao filho mais velho. E adivinha? A mãe vai morrer de ciúmes da cumplicidade que cresce ligeira entre os dois. Eles terão suas próprias brincadeiras, suas piadinhas, sua forma única de dialogar. Entre uma mamada e uma troca de fraldas do caçula, a mãe se vê excluída desse jogo. Isso dói e faz cócegas ao mesmo tempo. É triste se sentir à margem, mas ver esta amizade entre pai e filho se fortalecer é um bálsamo para a alma.
Sabe aquela história de trabalho dobrado? É um mito que precisa ser derrubado. Quem dera a lógica matemática se aplicasse aqui. O trabalho se multiplica exponencialmente e quanto mais estreita a faixa etária entre os filhos, mais complicado é. Os padrões alimentar e de sono não são os mesmos. O resultado: caos real e oficial. O cansaço acumulado contribui decisivamente para tornar tudo muito mais difícil.
Há uma obviedade que nem precisaria ser dita: o filho mais velho sente muito porque perdeu seu lugar de filho único. Mas o que quase ninguém fala é que a mãe também sente muito por perder sua condição de mãe de filho único. É aterradora a sensação de não poder cuidar do filho mais velho com a mesma dedicação e exclusividade. Ele chora, você quer consolar, mas tem que fazer o caçula dormir. Ele se agarra nas suas pernas querendo brincar, mas você não terminou de amamentar. Aquela pobre mulher que todos julgavam pronta para maternar sofre com a difícil missão de se dividir em duas e continuar inteira para cada um dos filhos. Pitágoras seria capaz de formular um teorema sobre isso?
Já o segundo filho nunca será filho único. Nunca experimentará de fato a exclusividade. Mas todo filho, seja ele o primeiro, o segundo ou o terceiro, precisa ter um tratamento único, um olhar único, um lugar só seu no coração materno. Essa foi a premissa que eu adotei desde o princípio, mas não foi fácil chegar a este lugar.
A romantização da maternidade torna algumas verdades difíceis de serem ditas por medo de julgamento. Há que se ter coragem para jogar luz onde impera uma cômoda escuridão. Essa coragem vem do amor imenso e visceral que se tem pelos filhos. Não tem medida a alegria de olhar para eles brincando juntos e ver brotar neste mundo árido o mais puro dos sentimentos: o amor fraternal.
Greyce Silveira Carvalho é caratinguense, escritora e advogada pública
@greycecarvalho
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