De delegado a promotor: Guilherme Lincoln inicia nova etapa no Ministério Público

DA REDAÇÃO – Após quase quatro anos à frente da Delegacia de Polícia Civil de Inhapim, o agora promotor de Justiça Guilherme Lincoln Rocha Pereira inicia uma nova fase de sua trajetória profissional no Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Aos 25 anos, o jovem que se destacou pela condução de investigações complexas e pelo rigor técnico no combate à criminalidade passa a atuar na defesa dos interesses da sociedade sob uma nova perspectiva — a da promotoria. Em entrevista exclusiva, Lincoln reflete sobre sua passagem pela Polícia Civil, comenta os desafios do novo cargo e compartilha lições de uma carreira marcada pela disciplina, precocidade e vocação para o serviço público.

Natural de Ipatinga, filho do 1º sargento da Polícia Militar de Minas Gerais, Adilson Rodrigues Pereira, e de Cleunice Marilza Rocha Pereira, o promotor foi recentemente homenageado pela Câmara Municipal de Inhapim, em sessão solene que reconheceu os relevantes serviços prestados à comunidade durante seu período como delegado. A cerimônia reuniu autoridades, representantes das forças de segurança e familiares, que celebraram a trajetória do jovem profissional, lembrado pela firmeza, ética e resultados expressivos no combate à criminalidade.

A homenagem ocorreu poucos dias antes de um novo marco em sua carreira: a posse no Ministério Público de Minas Gerais, realizada no dia 22 de outubro, em Belo Horizonte, durante solenidade no Teatro do Minas Tênis Clube. Ao lado de outros 69 novos promotores de Justiça aprovados no LXI Concurso da instituição, Lincoln passa a integrar o quadro do MPMG, levando consigo a experiência adquirida na investigação criminal e o compromisso com a defesa da ordem jurídica e dos direitos da sociedade.

 

Da investigação à Justiça: uma nova missão

A seguir, o novo promotor fala sobre os desafios dessa transição, a importância do serviço público e as lições que o acompanharam desde o início de sua trajetória.

 

O senhor assumiu a Delegacia de Inhapim muito jovem, aos 22 anos, e agora, aos 25, inicia uma nova fase como promotor de justiça. O que mais o motiva nessa transição entre as duas carreiras, ambas voltadas à defesa da sociedade?

O que mais me motiva nessa nova atribuição é a possibilidade de ser um efetivo agente de transformação social, atuando com afinco na defesa dos interesses da sociedade.

Como avalia sua passagem pela Delegacia de Inhapim? Há algum caso ou experiência que tenha sido particularmente marcante na sua trajetória como delegado? Inclusive, um dos casos investigados pelo senhor teve uma reviravolta cinematográfica, podemos assim dizer.

 

Minha passagem pela Delegacia de Polícia em Inhapim foi marcada por inúmeros desafios, mas, felizmente, consegui fazer, junto à equipe, tudo que estava ao meu alcance para apresentar resultados investigativos importantes para a sociedade, da prisão do furtadores em série à captura criminosos de elevada periculosidade, creio que foi possível deixar como marca registrada o rigor na aplicação da lei penal e a redução do índice da criminalidade violenta na área de atuação. Cito como casos de destaque a prisão de um treinador de futebol que atentava contra a dignidade sexual de adolescentes, condenado a mais de 40 anos de reclusão, a Operação Calipe, por meio da qual quatro envolvidos na morte de um jovem foram presos, e a Operação Excisio, deflagrada em maio deste ano, para combater a corrupção administrativa no âmbito de uma secretaria municipal de saúde. Além disso, ainda em 2025 tivemos um caso emblemático, no qual um suspeito de homicídio forjou a própria morte para induzir os investigadores a erro. No entanto, após troca de informações com a Polícia Militar e exames de comparação genética, foi possível identificar a correta vítima do assassinato e viabilizar a responsabilidade criminal do autor do fato, que foi preso no Estado de São Paulo após dois meses.

 

O senhor nasceu em Ipatinga e é filho de um sargento da Polícia Militar. Essa formação familiar influenciou sua escolha pela carreira pública? Houve um momento em que considerou seguir a mesma trajetória militar do seu pai?

Sim, certamente influenciou, justamente pelo propósito de atuar em prol da sociedade, já com um exemplo vindo de casa. Em 2021, quando ainda estava no oitavo período da graduação, fui aprovado no concurso público para admissão no Curso de Formação de Oficiais (CFO) da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG). No entanto, já almejava ser Delegado de Polícia, pois meu objetivo era exercer uma carreira verdadeiramente jurídica, motivo pelo qual, apesar de aprovado no concurso militar, não tinha interesse em assumir o cargo. Em seguida, fui aprovado no concurso de Delegado da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG).

 

Durante sua infância e adolescência, que tipo de estudante era? Já demonstrava interesse pelas leis e pela segurança pública ou essa vocação foi se revelando mais tarde?

Durante a infância e adolescência era um aluno mediano, literalmente. Sofria para alcançar a média necessária para ser aprovado. O início dos estudos se deu após parar de jogar futebol. Até os quinze anos meu objetivo era ser jogador de futebol. Com a idade, percebi que já era mais possível e resolvi estudar. Ainda na escola as notas melhoraram, mas longe de ser destaque. Com dezesseis anos decidi que queria cursar direito, já que tinha interesse em conhecer e aprofundar em problemas jurídicos. Já na faculdade, ingressei com o objetivo de estudar tudo que era possível e assim fiz desde o primeiro dia de aula. Fui destaque no período da graduação e abreviei o curso no nono período comprovando excepcional rendimento, o que é autorizado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação. A providência foi necessária para eu ser empossado como Delegado de Polícia. No ponto, enfatizo que até então não se exigia três anos de atividade jurídica ou policial para ser Delegado de Polícia em Minas Gerais, motivo pelo qual colei grau e, em seguida, tomei posse no referido cargo.

 

Sua trajetória acadêmica é notável — concluiu o curso de Direito de forma antecipada, foi aprovado em concursos muito jovens e já possui duas pós-graduações. Que fatores acredita terem contribuído para esse desempenho tão precoce?

O foco e a determinação, aliado a uma boa disciplina. Não deixei viver minha juventude, mas tinha o compromisso de conciliar com a minha rotina acadêmica. Mesmo atuando como Delegado de Polícia em uma região movimentada, nunca deixei de exercer com dedicação minha atribuição. Em razão disso, acordava de madrugada para estudar antes do serviço e utilizava o horário de almoço para continuar os estudos, além de aproveitar os dias de folga.

 

Muitos jovens têm o sonho de ingressar em carreiras jurídicas, mas esbarram nas dificuldades dos concursos. Qual é, na sua opinião, o principal segredo ou diferencial para conquistar uma aprovação em alto nível como a sua?

A disciplina. O estudo para concurso exige renúncias, mas é possível conciliar o dia a dia comum com o empenho nos estudos. Cada um possui uma realidade própria. A ideia é saber encaixar os estudos na rotina e se adaptar à dinâmica, por mais difícil que seja.

 

O senhor sempre demonstrou grande proximidade com a comunidade inhapinhense e com as forças de segurança locais. Que legado acredita deixar para a cidade após quase quatro anos de atuação?

Creio que deixo como legado a firmeza na aplicação penal e o senso de justiça, sempre pautado pela ética, integridade e honestidade. Do atendimento ao cidadão com dúvidas jurídicas à prisão de criminosos, sempre pautei minha atuação pela legalidade e o respeito. Isso certamente colaborou para o bom relacionamento com os demais órgãos e o reconhecimento da sociedade.

O que muda na forma de servir à sociedade ao sair da Polícia Civil e ingressar no Ministério Público? Quais desafios o senhor espera encontrar na função de promotor de justiça?

R: A essência do serviço à sociedade permanece a mesma: o compromisso com a justiça, com a verdade e com a proteção do cidadão. No entanto, a forma de servir muda de maneira significativa. Na Polícia Civil, o trabalho é voltado para a investigação e a coleta de elementos de informação e provas, com foco na materialidade e autoria dos delitos. Já no Ministério Público, a missão se amplia — passa-se a exercer uma função de controle, de defesa da ordem jurídica, dos interesses sociais e individuais indisponíveis, com uma visão mais abrangente do sistema de justiça. Entre os desafios esperados estão a responsabilidade de equilibrar rigor técnico com sensibilidade humana, a necessidade de decisões rápidas e justas diante de realidades complexas e, sobretudo, o dever de manter a independência funcional diante das pressões inerentes à função. Também é um desafio inspirador compreender que, mais do que acusar, o Promotor de Justiça atua para que a lei seja instrumento de transformação social e de proteção à dignidade humana.

 

Como o senhor avalia o papel do servidor público — especialmente o de quem atua diretamente na aplicação da lei e da justiça?

O papel do servidor público que atua diretamente na aplicação da lei e da justiça é, a meu ver, um dos mais relevantes dentro do Estado Democrático de Direito. Ele representa, de forma concreta, a presença do Estado na vida do cidadão e a efetivação dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição. Trata-se de uma função que exige não apenas conhecimento técnico e preparo jurídico, mas também um profundo senso de responsabilidade, ética e compromisso com o interesse público. O servidor que aplica a lei — seja policial, promotor, juiz ou defensor — deve atuar buscando sempre equilibrar a autoridade estatal com o respeito à dignidade humana. Mais do que cumprir normas, sua missão é garantir que a justiça se realize de maneira concreta e acessível, assegurando que o poder público atue de forma legítima, transparente e voltada à proteção da sociedade. É, portanto, um papel que transcende o exercício burocrático e se aproxima de uma verdadeira vocação de serviço e compromisso com o bem comum.

 

Por fim, qual mensagem deixaria para os jovens que hoje sonham com uma carreira pública ou jurídica, mas se sentem desanimados diante da concorrência e das dificuldades do caminho?

Eu deixaria uma mensagem de esperança e perseverança. O caminho para a carreira pública e jurídica realmente não é fácil — exige estudo, disciplina, paciência e, acima de tudo, propósito. Mas é justamente nas dificuldades que se forma o caráter de quem servirá à sociedade. Cada obstáculo, cada reprovação, cada dúvida é parte do processo de amadurecimento que prepara o futuro servidor para lidar com as responsabilidades da função. É importante lembrar que o concurso é apenas uma etapa; o verdadeiro desafio começa depois, quando se assume o compromisso diário de agir com ética, justiça e empatia. Por isso, aos jovens que hoje se sentem desanimados, eu diria: não desistam. Mantenham a fé, a constância e a humildade para continuar aprendendo. O serviço público precisa de pessoas vocacionadas, comprometidas com o bem comum e dispostas a fazer a diferença. A caminhada pode ser longa, mas o propósito de servir à sociedade e promover a justiça torna todo o esforço profundamente recompensador.

Momento da assinatura do termo de posse (Foto: Eric Bezerra/MPMG)
Durante coletiva concedida a imprensa de Caratinga (Foto: arquivo)
Familiares do homenageado participaram da solenidade na Câmara de Inhapim (Foto: Arquivo)
Quando delegado, em uma das várias operações que coordenou (Foto: arquivo)

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