Goleada não é coincidência

Quem tem o hábito de, pelo menos, passar os olhos por esta humilde coluna, publicada às terças e sábados, provavelmente irá se lembrar do assunto Disparidade, abordado no dia 16 do mês passado, quando tratei do tema Jogos Estudantis. Na oportunidade, fiz questão de elogiar a iniciativa do Departamento de Esportes em mais uma vez promover os Jogos; elogios também à fala do superintendente, ao anunciar que ônibus seriam colocados à disposição das escolas da zona rural para o transporte dos alunos em dias de jogos. Sem dúvida alguma, sem esse trabalho seria impossível a participação das escolas dos distritos.

Porém, na mesma coluna, no segundo parágrafo, escrevi o seguinte: os ônibus resolvem a distância geográfica, mas, infelizmente, não irão solucionar a distância técnica entre as escolas da sede do município e a grande maioria das escolas dos distritos. Enquanto na cidade os alunos contam com estrutura física, como quadras de qualidade, e profissionais de educação física com especialização em diversas modalidades – como o futebol, por exemplo –, na zona rural algumas escolas não contam nem mesmo com o mínimo, como uma quadra. O resultado dessa disparidade: jogos com placares superelásticos a favor de escolas privadas e até mesmo públicas da sede do município. Porém, esse é um debate muito mais profundo.

Logo na primeira rodada, tivemos um resultado de 14 a 0, curiosamente entre duas escolas do município: privada x pública. Como disse naquele sábado, o debate é profundo e, pior, a maioria das pessoas não está preparada para ele.

 

Goleada: normal ou humilhação?

Só quem já competiu, independente da modalidade, sabe o tamanho do peso de uma derrota. Quando transportamos esse resultado para o universo infantil, esse peso se torna ainda maior. Afinal, estamos falando de seres humanos em formação. A experiência de uma criança que sofre uma derrota acentuada no esporte, como perder por 14 a 0 no futebol, e passa a ser ridicularizada pelos colegas, pode ter efeitos emocionais significativos. O sentimento de vergonha diante do grupo compromete sua autoestima e pode levá-la a desenvolver uma percepção negativa de si mesma. Além disso, a repetição das piadas reforça o medo de errar e pode gerar evasão da atividade esportiva, como forma de autoproteção.

Do ponto de vista do desenvolvimento socioemocional, situações de humilhação nessa fase tendem a fragilizar competências como autoconfiança, pertencimento e resiliência. Entretanto, a mediação dos adultos – sejam pais, professores ou treinadores – pode ressignificar o episódio. Ao valorizar o esforço, promover a cooperação e contextualizar a derrota como parte natural do processo de aprendizagem, abre-se espaço para que a criança desenvolva maturidade emocional e habilidades sociais, transformando uma experiência negativa em oportunidade de crescimento.

Uma pergunta para reflexão: o que é mais importante, conquistar títulos ou formar cidadãos?

 

Pais de castigo

 

Uma decisão da Federação Paulista de Futebol chamou atenção nesta semana:

“PORTÕES FECHADOS!

O futebol de crianças deve ser sinônimo de aprendizado, convivência, diversão e alegria. Quando atitudes de torcedores ameaçam este ambiente, precisamos agir. Por causa do mau comportamento dos adultos, as crianças do Paulista Sub-11 e Sub-12 jogarão com portões fechados por duas rodadas. A medida, em caráter educativo, é uma decisão da Federação Paulista de Futebol por recomendação do Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol Paulista, em decorrência do crescente número de casos de violência, hostilidade e até ofensas racistas e homofóbicas contra as crianças.”

 

Rogério Silva

abrindoojogocaratinga@gmail.com

@rogeriosilva89fm