A QUESTÃO NÃO ESTÁ EM PAUTA

Por Margareth Maciel de Almeida Santos
Doutora em Sociologia Política (IUPERJ/Universidade Candido Mendes-RJ)
Membro do Instituto dos Advogados do Brasil/RJ (IAB)

A frase “A questão não está em pauta” significa que o assunto mencionado não está sendo discutido oficialmente naquele momento, evitando responder diretamente algo que pode causar polêmica.

Nesse contexto, em nossa coluna devemos tratar sobre as apostas online e por telefone, que deixaram de ser um problema isolado: tornaram-se uma questão social séria. Muitos trabalhadores acessam sites e aplicativos de apostas durante o expediente, acumulam dívidas e, em casos extremos, cometem crimes para tentar recuperar perdas. Ao mesmo tempo, a exposição constante a propagandas — inclusive em programas de grande audiência — normaliza o jogo e atrai menores de idade. É urgente que sociedade, empresas e poder público enfrentem o tema com políticas eficazes relacionadas às apostas que viciam e, consequentemente, sobre os prejuízos que elas estão causando, sociais e econômicos.

Para parte da população isso é entretenimento; para outra parte, é vício com consequências graves: perda de emprego, endividamento, deterioração das relações familiares e, em situações extremas, comportamentos criminosos. Quando trabalhadores apostam no horário de trabalho, empregadores perdem produtividade e, em casos de conduta grave, demitem por justa causa. Além disso, a veiculação massiva de apostas na mídia contribui para a normalização do jogo entre jovens.

Para entendermos melhor essa questão, convidamos o advogado Dr. Rafael Starling, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e membro do escritório Lacerda Diniz Machado Advogados, para nos ajudar a compreender essa popularização das apostas eletrônicas que transformou o jogo em atividade acessível 24 horas por dia.

 

Vamos às questões:

 

1) Doutor, o que a legislação trabalhista prevê para casos de funcionários que usam o celular para apostar durante o expediente?

 

Inicialmente, é importante destacar que não há uma legislação trabalhista específica para tratar do tema “apostas durante o expediente”, mas há regras gerais que podem ser utilizadas — as mesmas referentes ao uso do celular.

Dito isso, cabe à empresa, dentro do seu poder de dirigir a prestação de serviços, elaborar e divulgar regras claras sobre a utilização do celular durante o expediente, podendo autorizar ou restringir de acordo com sua atividade, observando sempre o princípio da razoabilidade.

Assim, caso o empregado esteja infringindo as regras da empresa ou mesmo tendo baixa produtividade em razão do uso do celular — seja para aposta ou outra razão — estará sujeito às penalidades legais (advertência, suspensão ou justa causa).

Por terem sido citadas e sempre gerarem dúvidas, registre-se que, para aplicação das medidas disciplinares acima, deverão ser avaliados alguns requisitos, como histórico de punições, gravidade e imediatidade, não ficando a critério exclusivo do subjetivismo do empregador, sob pena de invalidação judicial futura.

Recomenda-se sempre consultar um advogado especialista para maior segurança.

 

2) O vício em apostas pode ser considerado uma questão de saúde mental, e as empresas têm algum dever de auxiliar o funcionário nesse caso?

 

Sim, o vício em apostas está relacionado a problemas de saúde mental e, como tal, deve ser tratado.

A empresa possui vários deveres perante o empregado e, dentre eles, o de fiscalizar a prestação de serviços, coibindo tudo o que puder ocasionar danos ao trabalhador e fornecendo um meio ambiente laboral saudável.

Sendo assim, caso perceba que determinado empregado está realizando apostas durante o expediente, deve proibir, orientar e advertir.

Em um cenário em que já há vício em apostas — sendo esta considerada uma doença diagnosticável por médicos — aplica-se a regra geral das enfermidades: cabe à empresa acatar o(s) atestado(s) médico(s) e, se ultrapassados 15 (quinze) dias, encaminhar o funcionário ao INSS.

Tem de ficar de olho.

 

3) É possível alegar dependência em jogo como atenuante ou justificativa em casos de dispensa por justa causa? Nesses casos, o senhor vê um aumento de processos trabalhistas ligados ao uso de plataformas de apostas?

Como toda questão submetida ao Judiciário, o resultado sempre vai depender das alegações trazidas, das provas produzidas e do julgador que apreciará a causa.

Mas, respondendo ao questionamento: sim, é possível alegar que a prática de jogos de azar se trata de vício, assim como o alcoolismo, a ponto de, por exemplo, buscar invalidar uma justa causa.

A utilização de tal argumento dependeria de estar clinicamente comprovado que o empregado é viciado — que se trata de efetiva doença e não apenas de uso recreativo.

Nesse caso, em um processo judicial, normalmente é marcada perícia médica com profissional de confiança do juiz para avaliação.

Vale dizer que, atualmente, diferentemente do alcoolismo, o vício em apostas continua sendo algo recente e novo para a Justiça do Trabalho, com tendência de aumento de casos. Ambos, no entanto, devem receber o mesmo tratamento pelos juízes, pois a gravidade é similar.

 

4) Há algo mais que queira complementar sobre o tema?

Gostaria de agradecer à Dra. Margareth Maciel pela oportunidade de trazer informações às pessoas da região, ressaltando que toda decisão importante deve ser acompanhada por um profissional especialista. Não é recomendável seguir orientações aleatórias que aparecem na internet, pois, literalmente, “cada caso é um caso”.

Podemos concluir que, nos últimos anos, as apostas esportivas e jogos online se espalharam pelo país com uma força assustadora. O que antes parecia apenas uma forma de entretenimento virou um problema social de grandes proporções.

Milhares de pessoas — especialmente trabalhadores — têm se tornado dependentes dessas plataformas, apostando durante o expediente e colocando em risco o emprego, a família e até a própria dignidade.

***

Conforme nos foi colocado pelo Dr. Rafael, a questão é mais grave do que se imagina. Muitos trabalhadores, movidos pela ilusão do “ganho fácil”, passam a apostar no celular durante o trabalho, comprometendo suas tarefas e sendo demitidos por justa causa. Quando as perdas financeiras se acumulam, surgem o desespero e a busca por dinheiro rápido. Casos de furtos, roubos e até tragédias familiares começam a aparecer como consequência direta do vício.

O problema não para aí. A televisão e as redes sociais têm papel central nesse cenário. Casas de apostas patrocinam programas populares — inclusive de grande audiência nacional, como o de Luciano Huck —, estimulando a ideia de que apostar é divertido, inofensivo e lucrativo. Essa exposição constante, sem alertas claros sobre os riscos do vício, normaliza o comportamento e atinge também os menores de idade, jovens que passam a acreditar que as apostas são uma forma legítima de ascensão financeira.

Enquanto isso, milhões de famílias enfrentam as consequências: dívidas, conflitos, desemprego e, em muitos casos, o rompimento de laços afetivos. As empresas também sofrem com queda de produtividade, absenteísmo e fraudes internas motivadas pelo descontrole financeiro.

É urgente que o poder público, a mídia e as empresas tratem o tema com a seriedade que ele merece. Precisamos de regulação rigorosa da publicidade de apostas, especialmente nos horários e programas voltados ao público jovem. É essencial incluir mensagens de alerta sobre o risco de vício, como já ocorre com bebidas alcoólicas e cigarros.

As empresas, por sua vez, devem adotar políticas internas que proíbam o uso de aplicativos de apostas no ambiente de trabalho e ofereçam apoio psicológico a quem enfrenta dependência.

As plataformas de apostas também precisam assumir sua responsabilidade social. Ferramentas de controle, como limites de gasto, verificação de idade e autoexclusão, devem ser obrigatórias. O lucro não pode estar acima da saúde mental das pessoas.

As apostas viciam, destroem carreiras e desestruturam famílias. Fingir que se trata apenas de “diversão” é fechar os olhos para um problema que já está corroendo o tecido social.

É hora de agir, regular e conscientizar — antes que mais vidas sejam perdidas em nome do lucro fácil!

Obrigada, Dr. Rafael, pela brilhante colaboração com o Diário de Caratinga, esclarecendo os prejuízos sociais e econômicos que as apostas causam à sociedade.

Gostaria de deixar uma reflexão: Seriam as bets uma questão de saúde pública?

PAZ E BEM!

Dr. Rafael Starling

(31) 98878-1309

Advogado especialista em Direito do Trabalho

Membro do escritório Lacerda Diniz Machado Advogados

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