ENTRE LETRAS E SORRISOS

Eugênio Maria Gomes é homenageado pelos 20 anos do Salão de Humor de Caratinga

 

 

CARATINGA – “Sou um escritor em construção, uma obra inacabada, sempre em mutação.” A frase de Eugênio Maria Gomes traduz com precisão o espírito criativo e incansável do autor que, neste mês, será o grande homenageado do 20º Salão Internacional de Humor de Caratinga. O evento, que acontece de 21 a 26 de outubro, na Praça Cesário Alvim, celebra duas décadas de história reunindo trabalhos de caricaturas, quadrinhos e cartuns sobre o tema “Sonhos / Desafios – Esperanças / Realizações”, enviados por 456 artistas de quase todo o Brasil e de 59 países.

O Salão também contará com o 5º Festival Jal&Gual, criado em 2021 pelo cartunista Edra, que será o “Caricatura Temática” desta edição. O festival tem como proposta promover a interação entre caricaturistas que retratam uns aos outros — iniciativa inédita no mundo. Além disso, o evento integrará as comemorações do Dia Ziraldo (24 de outubro), data que se tornou lei municipal em homenagem ao ilustre caratinguense.

O homenageado

Reconhecido como Destaque da Cultura Caratinguense, Eugênio soma mais de 80 livros publicados e uma trajetória que une literatura, educação e comunicação. Doutor, professor e cronista de alma, ele reflete nesta entrevista ao DIÁRIO sobre o papel do humor na arte, a evolução de sua voz autoral e a importância de eventos que mantêm viva a chama cultural da cidade.

Ao completar 20 anos do Salão de Humor de Caratinga, qual momento ou episódio do evento mais lhe marcou ao longo dessas duas décadas — e por quê?

Quanta riqueza nessas duas décadas de Salão do Humor de Caratinga! Cada edição tem sua marca e passa a compor a própria história da Cultura de Caratinga e região. O grande destaque de cada uma dessas edições, com certeza, é o EDRA, seu idealizador, não apenas por ser esse artista genial, mas por nos proporcionar esse espetáculo, anualmente. A 18ª edição foi das mais especiais, não apenas pela merecida homenagem à nossa querida escritora Marilene Godinho, mas pelo lançamento do 1º Salão Maluquinho de Humor de Caratinga, envolvendo a criançada na produção artística. A 20ª edição, com certeza, ficará gravada, para sempre, em minha memória e em meu coração.

 

Que relação o humor tem com sua produção literária? O senhor busca inserir elementos de humor (às vezes mordaz, crítico) em suas obras?

Vários textos meus foram abrilhantados com desenhos do EDRA, sempre com muito bom humor. Ademais, o humor – às vezes de forma direta, outras de forma mais discreta – está sempre presente nos meus escritos. É bom usar o humor como forma de provocar reações e reflexões nas pessoas.

 

Em agosto, o senhor celebrou 17 anos de carreira literária com exposição e lançamento de livro. Como o senhor enxerga a evolução da sua voz autoral nesse período?

Eu sempre digo que sou um “escritor em construção, uma obra inacabada, sempre em mutação”. A cada livro, um aprendizado. Quando pego o meu primeiro livro e o comparo com o último, percebo que a minha essência – enquanto “cronista” – está mantida (mantenho-me convicto, do primeiro ao último texto escrito, que “mais que livros, escrevo ideias”), mas que cresci muito, e continuo com fôlego e vontade de crescer, de aprender cada vez mais.

 

O senhor já organizou ou participou de edições anteriores do Salão de Humor como escritor ou curador? Se sim, de que forma isso influenciou sua visão cultural local?

Do Salão de Humor, não. Mas, há um ano, passei a ser curador – ao lado da jornalista Solange Araújo – do Espaço Cultural Funec. Tem sido uma experiência incrível, pois a cada evento, em cada exposição, um assunto novo, um novo aprendizado e uma imersão cultural que “abraça a alma”.

 

Entre suas 81 publicações — 41 autorais e 40 em coautoria ou organização — quais são as que o senhor considera mais desafiadoras ou transformadoras?

 

Na verdade, já são 83 (risos). É que a editora já me enviou exemplares de duas novas obras, e em poucos dias faremos o lançamento do 12º volume da série ‘Sem Data de Validade’ e o 12º volume da série infantil, com o título Gabriel na Caverna dos Dragões. Mas, respondendo à sua pergunta, eu gosto muito do último livro publicado (Cotidiano – Crônicas, Editora Viseu); do livro ‘O Filho de Maria’, que tem um significado muito especial para mim; do ‘Pensamentos de um Confinado’, escrito no período de maior isolamento, na pandemia; e separo também dois volumes da série infantil: ‘A Pureza dos Pequenos Corações’, onde abordo o racismo de forma muito leve e lúdica; e Piter – a estrelinha, que é uma linda homenagem ao nosso saudoso Piter.

 

Como foi o processo de elaboração da série Cotidiano – Crônicas (lançada no evento)? O que motivou a escolha desse formato?

Cotidiano é o primeiro volume de uma nova série de crônicas (a terceira série), que chega em um formato diferente, com temas mais abrangentes, sem foco em questões mais locais, com lançamento nos formatos impresso e digital, em várias plataformas. O livro saiu bem, tenho tido boa avaliação e o retorno tem sido muito bom por parte dos leitores. É uma série que, certamente, irá substituir definitivamente a atual, que será encerrada com esse 12º volume que lançarei em alguns dias.

 

Em eventos como esse, há interação com leitores, exposições visuais etc. De que modo essas aproximações alimentam novas ideias para sua escrita?

São momentos de grande inspiração. Às vezes, da reação em um olhar, ou na forma de alguém fazer alguma observação, o texto vai surgindo. Costumo sair desses encontros com uma crônica praticamente pronta. É assim que funciona o cronista: a cabeça não para, e tudo serve de motivação para um bom “causo”.

 

O senhor costuma planejar, antecipar conteúdo ou temas, ou sua escrita surge mais espontaneamente, conforme observa o mundo ao seu redor?

Interessante essa pergunta. Além de crônicas, “passeio” por outros gêneros literários. Quando escrevo um livro técnico ou um infantil, tenho sempre uma ideia na cabeça, planejo o que vou escrever e entregar ao leitor. Mas sou essencialmente um cronista e, nessa condição, o “cotidiano” é que vai me conduzindo na escrita. Para você ter uma ideia, acabei de escrever uma crônica depois de ligar para um consultório médico e marcar uma consulta. Você já percebeu como algumas secretárias se apresentam como mais “importantes” que o próprio médico? A qualidade do nosso relacionamento com algumas pode significar um dia, ou alguns meses, para a consulta acontecer (risos).

 

Como professor, como concilia suas atividades didáticas com uma produção literária tão extensa? O senhor considera que ambas as tarefas se enriquecem mutuamente?

 

As duas atividades sempre andaram juntas, com uma sendo facilitadora da outra. Aliás, organizei e sou coautor de várias obras escritas com meus alunos e colegas professores. Este ano, me aposentei definitivamente da sala de aula. Mas estou totalmente envolvido com outra atividade, a Comunicação, que também só tem facilitado a produção literária. Neste livro que lançarei brevemente há um texto intitulado Arroz de Festa, que é a síntese da minha “introspecção” literária, depois que um amigo me disse que é preciso desacelerar. De fato, acho que está na hora de publicar menos… (risos). Não sei se deixarei de escrever, mas certamente vamos diminuir o ritmo das publicações. Este ano será fechado com a entrega de seis livros… Realmente, fica parecendo “arroz de festa”… (risos).

 

Para os jovens escritores de Caratinga e região, qual mensagem o senhor gostaria de deixar ao participarem de eventos culturais como o Salão de Humor?

Eventos como o Salão de Humor de Caratinga são também campos férteis para a criatividade dos visitantes, uma oportunidade de uma “catarse” cultural. O escritor, ele também um agente cultural, se aprimora por meio das diversas formas de a arte se apresentar; nos encontros, nas trocas de experiências e informações que costumam acontecer nesses eventos. Participem do Salão e de todos os eventos culturais que puderem. E escrevam, para o nosso deleite e para o engrandecimento da nossa Literatura!

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