Não se pode mais lucrar a qualquer custo

Por Ricardo Ribeiro Alves

 

No início dos anos 2000, cursar administração era, de certa forma, um mergulho em um único dogma: o objetivo principal de uma empresa é gerar lucros para seus sócios ou acionistas. Essa máxima, repetida em sala de aula e impressa nos livros, soava inquestionável.

Era o mantra que guiava qualquer decisão de negócios: vender o máximo, para o maior número possível de clientes, pelo maior preço que o mercado aceitasse. A ideia de que esse objetivo deveria ser perseguido “a qualquer custo” raramente encontrava resistência, mesmo que esse custo fosse a saúde das pessoas ou o equilíbrio do meio ambiente.

Pouco se discutia sobre o impacto social ou ambiental dos produtos e serviços. O raciocínio dominante era simples e linear: o investidor arriscou seu dinheiro, logo deve ser recompensado, independentemente dos efeitos colaterais da operação. Mas esse modelo, chamado de capitalismo shareholder, já não se sustenta no mundo atual.

 

Como apontam estudiosos como Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, e Peter Vanham, essa mentalidade começou a ganhar força nos anos 1970, espalhando-se globalmente nas décadas seguintes. No entanto, a pressão social e as mudanças no acesso à informação tornaram impossível manter essa lógica intacta.

A popularização da internet e das redes sociais alterou de forma radical a relação entre empresas e consumidores. Antes, o fluxo de informações era controlado por poucos canais: TV, rádio, jornais e sites corporativos. Hoje, qualquer pessoa pode não só acessar dados em tempo real, mas também produzir e divulgar conteúdo para milhares ou, milhões, de pessoas.

O empoderamento do consumidor se tornou real e irreversível. E ele não se restringe apenas aos clientes: comunidades, funcionários, investidores e até governos são parte ativa desse ecossistema de fiscalização e cobrança.

O problema, portanto, não está em gerar lucro. O problema é buscar lucro a qualquer custo, ignorando fronteiras éticas, sociais e ambientais. É nesse ponto que entram os princípios ESG (ambiental, social e governança), que funcionam como limites claros para a atuação empresarial.

Ser uma empresa relevante hoje não significa apenas ter bons produtos ou serviços, mas operar de forma transparente, responsável e alinhada às expectativas de uma sociedade que observa e reage instantaneamente.

A verdade é que as “empresas do passado” não sobreviverão no futuro se insistirem nas velhas práticas. A era da impunidade empresarial está chegando ao fim. A narrativa mudou: não basta vender, é preciso vender de forma ética. Não basta crescer, é preciso crescer de maneira sustentável. Não basta comunicar valores, é preciso vivê-los na prática.

Buscar o lucro continua sendo legítimo, desde que não custe a saúde, o planeta e a dignidade das pessoas. Esse é o único caminho possível daqui para frente.

 

 

Ricardo Ribeiro Alves é administrador, Doutor em Ciência Florestal e autor de ESG Marketing (Alta Books)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Manchete do dia

Últimas Notícias