Eugênio Maria Gomes
Na manhã daquela sexta-feira, o presidente dos Estados Unidos da América, Dwight Eisenhower, convocou os parlamentares à Casa Branca e, durante duas horas e meia, expôs toda a situação militar e diplomática em várias partes do mundo, com foco na estratégia americana para a Coreia. Mesmo dia em que a Grã-Bretanha anunciou a manutenção do serviço militar obrigatório, por mais cinco anos, destinando vultosos recursos para a área da Defesa e o Brasil, através de decreto do presidente Getúlio Vargas, destinou ao Ministério da Educação e Saúde o crédito especial de Cr$ 300.000,00 (trezentos mil cruzeiros) para atender as despesas com o V Congresso Nacional dos Estabelecimentos Particulares de Ensino.
Neste mesmo dia 20 de fevereiro, precisamente às 23 horas, Inhapim – a terra do pássaro cantor – viu nascer o filho da dona de casa Izoralda de Andrade Souza e do Topógrafo, Antônio de Souza, batizado com o nome de José Carlos de Souza, cujo destino estaria fortemente ligado às áreas de Segurança e Educação, como se o seu nascimento coroasse os importantes fatos ocorridos naquele dia quente de verão de 1953, mundo afora.
Família numerosa – 12 filhos – a do Sr. Antônio, funcionário do extinto DNER – hoje DNIT – e que aprendera Topografia fora dos bancos escolares. No entanto, ele sabia o quanto era importante estudar, o real valor do saber e, mesmo com muitas dificuldades, conseguiu que todos os filhos frequentassem a escola, desenvolvendo neles a vontade de estudar, o gosto em aprender sempre mais, o desejo de ser “alguém na vida”. O garoto José Carlos, devido às adversidades vividas pelas famílias pobres e numerosas daquela época, teve uma infância difícil, mas muito feliz, responsável por boas e doces lembranças.
Por conta de todas as dificuldades, foi oficialmente apresentado aos estudos quando já contava com nove anos de idade. Nessa época, residia em Taruaçu de Minas, distrito conhecido como “Residência”, pertencente ao município de Tarumirim, onde permaneceu até aos dezoito anos. Estudou na Escola Estadual Engenheiro Amaro Ferreira da Silva e, posteriormente, no Colégio da Igreja Presbiteriana de Dom Cavati, onde teve o privilégio de ser aluno dos saudosos professores Celso Simões Caldeira, Boanerges Araújo, José Lacerda da Cunha e Jason Simões Caldeira.
Como todo garoto do interior, brincou de pique, jogou bola de gude, andou de carrinho de rolimã, nadou no rio e fez muitas amizades. Brigou, bateu e apanhou dos outros moleques. Às vezes, era encrenqueiro demais e, por conta disso, a cada dificuldade que criava para os pais sobrava-lhe uma boa sova. Nunca foi bom de futebol, mas sempre gostou de jogar bola. Gostava tanto que, aos catorze anos de idade, participou – ao lado do Sr. Pedro Hilário, funcionário do DNER – da criação do “Real Madrid”, um time de futebol que ainda existe em Residência. De outra feita, jogando contra um time da cidade de Sobrália, nos últimos minutos de jogo, recebeu a bola em frente ao gol e, além de não evitar a derrota de seu time, acertou a cabeça de um senhor que vendia doces na lateral do campo, derrubando o tabuleiro de guloseimas e fazendo a alegria da criançada.
Foi trabalhador rural e professor particular de Matemática. Estudioso, focado nas palavras de seu pai de que “a maior riqueza de um homem é o seu conhecimento”, assim que concluiu o ensino médio, no Colégio Manhuaçu, foi aprovado sem qualquer necessidade de curso suplementar, em três vestibulares. Chegou a cursar Licenciatura em Matemática, em 1977, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caratinga – FAFIC -, desistindo do curso em função de sua aprovação, no ano seguinte, para o CFO – Curso de Formação de Oficiais da PMMG, em Belo Horizonte (MG). Em 1994, já na condição de Major da PMMG, retornou aos estudos e cursou Administração na FACIC – Faculdade de Ciências Administrativas de Caratinga.
Na PMMG permaneceu por trinta anos. Enfrentou muitos desafios e obteve muitas vitórias. Ganhou não apenas o respeito, mas também o bem querer da população das cidades onde exerceu sua nobre missão, alicerçados em sua hombridade, no uso equilibrado de sua patente, em sua simplicidade e, principalmente, no rigor que sempre imprimiu em suas ações e nas de seus comandados, para que fossem justas, éticas e cidadãs. Em Caratinga, na condição de Major, chegou em 1995, assumindo o comando da 74ª Companhia Especial da PMMG, no qual permaneceu até o final do ano de 1996. Retornaria à cidade em 2003, já na reserva da PMMG, escolhendo-a para morar com a sua esposa Rosane e as filhas Ana Laura e Lara Luíza.
Foram muitas as suas realizações como membro da corporação. Dentre elas, comandou a 97ª Companhia Especial de Polícia na cidade de Viçosa, assumindo o posto exatamente no dia da declaração da morte de Tancredo Neves, em 21 de abril de 1985, sendo o primeiro comandante militar a dirigir uma operação policial no ambiente interno da UFV – policiamento do Viçosa In Rock -, justamente numa época em que os estudantes, na ânsia de confrontar a ditadura que então terminava no país, achavam que podiam fazer qualquer coisa; participou da criação do Comando Educativo Antidrogas do 11º BPM da cidade de Manhuaçu; participou da criação da Instrução à Distância dos Policiais Militares do 11º BPM de Manhuaçu, no ano de 1989, que se tornou uma referência organizacional e, pela qual, foi agraciado individualmente, pelo Comandante Geral da PMMG, com um reconhecimento público da instituição; participou do planejamento e implantação das torres de observação do Parque Estadual do Rio Doce, na região metropolitana do Vale do Aço, que até então era alvo de constantes incêndios florestais; comandou as Operações Policiais na rebelião da Penitenciária de Unaí/MG no ano de 1999; foi condecorado com o Troféu Alferes Tiradentes do Clube dos Oficiais da PMMG, considerada uma das maiores honrarias concedidas aos profissionais de segurança pública e cidadãos que contribuem para o desenvolvimento e preservação da ordem pública e comandou as Operações no enfrentamento e no controle dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, que, no ano de 1999, tentaram invadir a fazenda de propriedade do então Presidente da República Dr. Fernando Henrique Cardoso.
Em outro momento, já na reserva da PMMG, participou, em 2002, na condição de gerente regional de segurança da Prosegur – Transportadora de Valores S/A – da Comissão de Gestores responsáveis pela revisão dos procedimentos operacionais da empresa, que depois de revisados foram aplicados nas empresas da holding em toda a América Latina; no exercício da função de Secretário Municipal de Serviços Urbanos e Meio Ambiente do município de Caratinga (MG) coordenou o Projeto do Sistema de Alerta contra as cheias do Rio Caratinga, sendo condecorado pelo governo de Minas Gerais, em 2005, com a medalha de mérito da defesa civil; na condição de Secretário Municipal de Controle Interno do município de Ipatinga (MG), participou do grupo de trabalho que desenvolveu o “Programa Ipatinga Segura”, com a implantação do sistema de monitoramento eletrônico conhecido como “Olho Vivo”, que se tornou uma referência de gestão pública e, recentemente, atuando como professor universitário nas áreas de Administração, Marketing, Turismo, Agronegócio, Contabilidade, Engenharia da Produção e Engenharia Civil, nas faculdades Doctum de Caratinga (MG) e Iúna (ES) e FACIG – Faculdades de Ciências Gerenciais de Manhuaçu (MG) e como Coordenador do Curso de Administração da FACIG, ministrou workshop sobre Metodologias Ativas de Aprendizagem no IV Congresso das instituições de ensino superior, que participam do programa de certificação de qualidade da FGV – Fundação Getúlio Vargas, realizado em Foz do Iguaçu no mês de setembro de 2015.
O Coronel José Carlos de Souza, que tem entre os seus irmãos outros seis militares e um procurador federal, cidadão honorário de Caratinga e Manhuaçu, professor querido por seus alunos, mestre em Administração, exemplo a ser seguido por todos aqueles que se aventuram na carreira militar, admirado e respeitado por todos, é também o marido dedicado, o pai amoroso, o filho querido de D. Izoralda, por quem tem grande admiração, respeito, sendo um dos principais admiradores de sua culinária.
O homem que ainda se entristece, com a lembrança do tabuleiro de doces ao chão, naquele fatídico dia em que perdeu um gol e a chance de evitar a derrota de seu time; que se alegra com a lembrança de um preso que facilitou o seu trabalho em uma rebelião, em Unaí, por conta de uma ocorrência antiga, onde ele, segundo relato do preso, teria evitado o seu suposto espancamento após a prisão, é também alguém que sofre, muito, com uma das maiores dores que pode transpassar o coração do ser humano, a dor da perda de um filho. Galeno Carlos Miguel de Souza, jovem oficial da PMMG (filho de seu primeiro casamento com Vera Lúcia Miguel, com quem teve também a filha Marília Aparecida Miguel de Souza), partiu para o outro Plano em 2012, imprimindo ao forte soldado uma tristeza sem fim. Homem de fé, valente, de princípios sólidos, tem carregado a sua dor com dignidade e esperança.
O avô do Artur, nascido no último mês de agosto, tem levado a vida com bravura, alegria e dedicação à família, ao trabalho e aos amigos. Tem vivido um dia após o outro, com as lembranças alegres e tristes do passado, com a força que o presente exige e com muita fé em Deus e no futuro.
Um “viva” ao nosso querido amigo Coronel José Carlos de Souza!
- Eugênio Maria Gomes é professor e pró-reitor de Administração da Unec – Centro Universitário de Caratinga. Escritor, membro das Academias de Letras de Caratinga e Teófilo Otoni.
2 Comentários
Leonardo
Mundo pequeno, ou esse braço da tecnologia é que possui essa excelente ferramenta para encurtar distâncias!
Conheci o Coronel José Carlos aqui em Unaí no ano 2000, juntamente com a família descrita na matéria!!
Família linda, de pessoas nobres com uma educação que atravessa década!!
Reverência ao Coronel! Abraço a Marília!!
José Carlos
A bondade do meu amigo Professor Eugênio e o carinho a este pai, esposo, filho e irmão, que se orgulha muito de ter pertencido aos quados da multissecular corporação de Tiradentes e ser ainda hoje professor universitário, me encantam muito. Obrigado meu querido amigo e colega da sala de aula no Mestrado em Administração.