DA REDAÇÃO – Para saber um pouco dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, o DIÁRIO ouviu Virgílio Guimarães, que à época integrava a bancada petista na Câmara Federal.
Virgílio Guimarães, que após um hiato voltou a vida pública e agora é candidato a uma vaga na Assembleia Legislativa, destaca os avanços da Constituição, mas também aponta as falhas. Para ele, é hora de termos uma nova constituinte para que o Brasil dê esse passo à frente.
O senhor poderia contextualizar o que foi a Assembleia Nacional Constituinte?
O contexto onde se realizou a Assembleia Nacional Constituinte foi do fim da ditadura militar, mas também uma grande onda de participação popular de luta pelos direitos. Foram movimentos sindicais do fim da década de 70 mais os movimentos populares, as pastorais de igrejas, os movimentos estudantis, enfim, havia uma luta pelas liberdades democráticas, pelas eleições diretas para presidente da República, mas também pelos direitos sociais, nesse contexto de participação que ela se realizou. Inicialmente se pensou por parte do governo que a convocou de uma Assembleia Nacional Constituinte controlada, o primeiro efeito foi a Constituinte tomar pra si o próprio controle, não se elevou em conta o modelo elaborado por uma comissão preparatória, nada disso, ela foi feita efetivamente de baixo para cima, e quanto a participação popular, não houve aquilo que se espera e também a democracia direta, os plebiscitos e os referendos. Mas sem dúvida nenhuma foi uma Assembleia Constituinte para consolidar a democracia e os direitos sociais individuais.
À época, o senhor era deputado federal pelo PT. Como foi o seu trabalho na Assembleia Nacional Constituinte?
O meu trabalho foi essencialmente um trabalho coletivo. O PT tinha 16 deputados, eram 16 subcomissões, portanto 16 temas. Nós trabalhamos sempre coletivo, mas também havia um coletivo além do PT dos demais parlamentares progressistas, cerca de 120 parlamentares no contexto ainda de minoria, mas que conseguimos representar os anseios populares, movimentos de pressão popular muito importantes. Eu pessoalmente me dediquei muito na condição de suplente, fui da Comissão de Reforma Agrária. O sistema agrário tinha uma grande participação, eu como economista fui do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) e haviam vários parlamentares que eram sindicalistas, mas fiquei como suplente da questão agrária e como o titular economista que sou, fui para a Comissão de Orçamento de Sistema Tributário, onde conseguimos grandes avanços também. Participei intensamente do movimento municipalista, mas sobretudo dentro de um contexto, um contexto geral do coletivo do PT, e do PT do coletivo da esquerda. Foi um momento de conquistas muito importantes, que obtivemos inclusive nesses temas mais técnicos nos quais eu me dediquei na condição de titular.
Quais os maiores avanços da Constituição Federal de 1988? Quais falhas o senhor apontaria nessa Constituição?
Os avanços sem dúvida nenhuma foram a consolidação das liberdades democráticas, dos direitos individuais e dos direitos coletivos, sobretudo o direito dos trabalhadores que estão consagrados ali de uma maneira muito forte, muito expressiva, muito definitiva. As falhas eu diria que ficaram por conta do sistema político, da reforma política que praticamente não existiu. Eu diria que a grande reforma política da constituinte foi assegurar plena liberdade. Essa foi a principal característica, plano de fundo essencial, inclusive da plena liberdade partidária. Isso aí é a mais importante de todas as reformas, mas o modelo eleitoral não foi modificado pelo contrário, só no pacote de abril ele foi constitucionalizado. Portanto ficou devendo ainda, o sistema tributário nacional também poderia ter sofrido mudanças mais importantes. Houve uma mudança importante da redistribuição das receitas entre as esferas federativas, municípios e estados saíram ganhando, mas o modelo mesmo de sistema tributário não foi alterado, sobretudo, o imposto sobre o consumo, que é o ICMS, ficou muito vulnerável à medida que se restabeleceu a autonomia efetiva dos estados e a guerra fiscal foi a consequência que se seguiu a implantação da nova Constituição. São portanto ainda reformas que estão para ser feitas, que são cobradas com toda razão sobretudo as reformas tributária e política.
Como o senhor se sente sabendo que fez parte de um momento histórico para o Brasil?
Claro que eu tenho consciência de dever cumprido, eu fui constituinte, tenho orgulho disso, mas sobretudo essa experiência me leva a imaginar que ainda temos passos à frente. Hoje temos um sistema eleitoral no contexto de tecnologia que permitiria uma participação popular muito maior através de maior número de consultas diretas a população. Sou defensor de uma nova constituinte, desta feita uma constituinte exclusiva, ou seja, onde os constituintes ficariam inelegíveis por um longo período de tempo, 10, 15 anos, em que não houvesse pressão de demagogia eleitoreira, coisa desse gênero, teríamos que ter também uma participação popular direta maior, nesta nova elaboração, ou seja, os constituintes seriam exclusivos, e a autonomia popular deveria se manifestar através de consultas plebiscitárias e posteriormente referendos parciais e o referendo global, desta constituição.
Acredito que já estamos nos aproximando de uma momento onde uma nova constituinte, um novo momento, deveria ser feito com características mais avançadas para superar as deficiências que foram remanescentes da constituinte de 88, mas também se aproveitando das novas tecnologias que permite hoje através do sistema eleitoral, muito mais simplificado eletrônico, tendo consultas muito mais vezes, com mais facilidade com custo muito menor, que permitiriam uma participação direta da população na elaboração das leis, sobretudo da nova constituição. Creio que já é tempo de darmos esse passo à frente.