*Por Nohemy Peixoto e Adenilson Geraldo
No dia 21 de outubro de 2016 o casamento de um homem de 94 anos com uma mulher de 80 anos chamou atenção na cidade. Domingos Martins de Oliveira e Maria Ester Teixeira deram o primeiro passo rumo ao altar no casamento civil e no dia seguinte, a cerimônia religiosa aconteceu na Igreja Assembleia de Deus, no distrito de Santa Luzia. Ela ficou viúva por seis anos, ele ficou casado por pouco mais de 63 anos, ficando viúvo depois por 11 anos.
O mais impressionante é como essa história começou. A partir de um sonho da romântica Ester, com um homem de camisa xadrez. O homem dos sonhos de Ester rapidamente foi encontrado, graças à neta de seu Domingos, Aline Viana, que reconheceu as características informadas por ela e lhe mostrou uma foto, confirmando que ele tinha realmente sido localizado.
Dois meses se passaram e o DIÁRIO DE CARATINGA esteve na casa onde o casal está morando, no Córrego Rio Claro, distrito de Santa Luzia. O local é propício para o clima de romance, com as belezas naturais e a vida na roça. Logo que a reportagem chegou, Ester cumprimentou e disse satisfeita: ‘Vou chamar o Domingos pra vocês verem, como ele está ainda mais bonito’.
Enquanto seu Domingos não aparecia, ela conversou com a repórter Nohemy Peixoto e o fotógrafo Adenilson Geraldo. Questionada se já pensava em se casar novamente, respondeu de forma sincera. “Eu já pensava em outro esposo, já é o quinto. Não nasci pra viver sozinha. Quer me matar, é me pôr dentro de um lugar sozinha. E os meninos cresceram, foram embora. Eu não quero acompanhar, porque gosto muito das minhas coisas, se eu como uma coisa hoje, amanhã já não quero aquilo. Um dia eu como numa hora e outro dia em outra; não funciona na casa dos outros. Foi o que mais me fez pensar nisso”.
Sobre a história com seu Domingos, dona Ester afirma que surgiu como um sonho. Literalmente um sonho, não somente no sentido figurado. “Até hoje pra mim é um sonho. Eu nunca tinha visto, sabia nem se existia, nem Antônio, nem Aline ou Domingos. Nunca tinha visto, nem morei perto. Foi uma coisa que surgiu por Deus. Ela me viu contando que eu tinha sonhado que eu tinha feito uma viagem, estava sentada e a pessoa quando sentou esbarrou a mão em mim e meu coração sentiu uma coisa estranha, um amor. Eu amo na mente, vem do coração, toda vida amei assim. O dia que vi ele, a primeira vez; vi com a roupa xadrez, falei: ‘É essa pessoa’. Nosso amor foi um sonho, num belo domingo. E estou muito feliz”.
Ester já se preparava com a esperança de seu desejo acontecer. Ela conta que estava programando uma festa de 80 anos, mas, logo mudou de ideia e o planejamento da festa ganhou um novo foco. “Seria para juntar os parentes, filhos, netos, bisnetos e comer uns carneiros assados. Depois conversei com Deus de madrugada e pensei, sou evangélica, uma membra do senhor, vou patrocinar essa festa e não posso segurar o povo. Eles falam que não tem importância beber social, mas isso pra mim não serve. Por isso desmanchei aquilo, porque não queria a festa, queria casar. Falei com uma irmã, que eu queria casar. Ela falou: ‘Você pensa nisso? Meu Deus, você pra mim está doida’. Falei: ‘Nada. Não tem doideira nenhuma. Quando Deus tem de fazer, ele faz. Não manda recado’. Na minha mente eu já estava com tudo preparado, mas sem saber. Era Deus que estava preparando pra mim”.
Muito religiosa, a idosa foi buscar mais um aconselhamento na Igreja. “Fui buscar a palavra e tinha um irmão daqui de Carapicuíba, eu estava muito aborrecida. E antes de ir conversei muito com Deus, falei: ‘Senhor, me responde. Tem misericórdia de mim’. Eu ia embora pra lá de São Paulo, morar com meu filho mais velho, mas eu não queria. Queria sair de lá, mas era pra minha casa. Cheguei na igreja, o Espírito Santo falou na boca do irmão, que tinha uma irmã que estava com um pedido com Deus, ela conversou muito com Ele e Deus ia responder ela. Até hoje quando falo fico arrepiada. Ele falou ainda: ‘Ela fica satisfeita, que Deus não vai dar ela o que pediu, mas muito mais’”.
Com o coração em paz e as respostas que buscava, os dois se conheceram e começaram a conversar sobre o casamento. Seu Domingos impôs suas condições e Ester aceitou. “Eu era da Igreja Cristã do Brasil, mas quando vim conversar com ele, que nós afirmamos o casamento, ele falou assim: ‘Ester, tudo bem. Estou agradando muito de você, fiquei feliz de te conhecer, mas têm umas coisas que nós precisamos falar sério. Não mudo de doutrina e nem daqui. Se você quiser passar da sua igreja pra minha e vir morar aqui, se ver que compensa, nós vamos tomar a providência de ir até o casamento. Se você quiser pensa, volta pra casa’. Mas, antes de vir conversar com ele, eu já tinha conversado com Deus. Porque na minha igreja a gente vai buscar a palavra, se você tem que fazer uma viagem, qualquer uma decisão que tem que tomar na sua vida, tem que primeiro buscar a Deus. Sem conversar com Deus não saio”.
Para a idosa, tudo que deixou pra trás, não lhe faz falta, nessa nova etapa de sua vida. “Deixei uma casa com quatro quartos, suíte, onde morei há 40 anos, porque pra mim nem precisava mais ter isso depois que eu achei o Domingos. Eu podia ter dado isso tudo para os outros (risos)”.
VIDA NOVA
O clima na casa do casal é de vida nova. Ester partilha um dos casos registrados no dia a dia e que mostra a sintonia nos primeiros meses de casados. “O Domingos é uma pessoa muito sábia, espirituosa, pura. Religioso, ele tem os seus preceitos diante de Deus, mas não é de emocionar, demonstrar. Mas, ele está muito satisfeito. Ainda hoje (segunda-feira) mesmo de manhã, levantou brincando, nós rindo. Cascamos um pouquinho de alho, depois ele falou: ‘Hoje eu quero frango com angu’. Eu falei: ‘Pois, eu quero é frango com farinha’. Mas, está ali o angu e eu comi o frango do jeito que eu queria”.
Ela aconselha que em nome da harmonia, às vezes, é preciso saber ceder. “Acho que se a gente quer conviver com a pessoa, tem que obedecer. As coisas que eu acho mais importantes no mundo é a obediência e a paz. Porque se você não for obediente, não encontra a paz. Se for uma pessoa que não obedecer, seja sua mãe, seu marido, irmão, amigo. Às vezes tem hora que você vai fazer alguma coisa e seu amigo fala: ‘Não faz isso’ ou ‘Deixa pra depois’. Você nunca que teima. Estou nessa idade, tenho 80, quase 81 anos, e pode ser uma criança de cinco anos, se falar comigo, acabou. Não que eu teimo”.
Dona Ester ressalta que a natureza dá o tom de sua história com seu Domingos, marcando uma etapa mais alegre e tranquila em sua vida. “Agora mudou tanto, que Deus perdoa se estou pecando, mas parece que já saí desse mundo. E aconteceu. Cumpriu na minha vida, porque nunca pensava de passar uns dias como tenho passado aqui. Eu vi esses cafezais floridos, coisa que eu nunca tinha visto; a jabuticaba ali ficou a coisa mais linda de flor. Vi florir, crescer, amadurecer e estou aqui na maior alegria. Essa água de biquinha pra mim é um encanto. O varal, como é que está de paninho de prato. Fico só lavando, vendo aquela água, aquilo pra mim é uma benção muito grande que poucas pessoas têm. Aquilo é uma água pura, santa, vem encanada, ali a gente lida com ela, toma banho, o cabelo parece que afina, eu nem estou passando mais produto no cabelo, nem nada não (risos)”.
Os dias têm sido de intensa alegria e celebração. Paciência e amor contribuem para os momentos que ela considera marcantes. “Fizemos uma surpresa de aniversário pra ele. Deixamos ele inocente igual um menino. Ele falou: ‘Vou com essa camisa aqui’. Falei: ‘Se você for com essa camisa, então eu vou com o fofão. Que são umas calças de frio que eu tenho muito feias’. Ai ele falou: ‘Você vai arrumar pra nós sair, Ester’. Eu falei: ‘Você sabe que eu não gosto de teimar e eu não posso teimar. Então tira essa camisa. Põe ou aquela verde ou a mostarda’. Ele colocou a que eu queria e nós fomos, ficamos o dia inteiro fora. Voltamos para a surpresa e ele tocou muita sanfona, foi uma coisa linda. Ele é uma pessoa muito alegre, estou muito satisfeita. Pra eu ficar mais satisfeita agora, só o dia que eu chegar lá na porta do céu e Deus me entregar a minha coroa. Eu terei uma alegria maior do que estou aqui, mas na terra, não tenho não”.
No final da entrevista seu Domingos chegou sorridente. Logo, Ester exclamou: “Aí, ele não está mais bonito? Ele engordou quatro quilos depois do casamento”. “Casamento de bobo né (risos)?”, brincou Domingos.
O casal comentou sobre o amor, que tem sido esquecido por muitas pessoas nos dias de hoje. Seu Domingos afirmou: “Não tem amor mais, é vaidade”. Dona Ester logo respondeu: “Não senhor, eu amo muito o senhor. Não fala isso perto de mim não”. Ele logo tratou de corrigir a frase: “É no mundo”. Apaixonada, a amada se declara novamente: “Não acabou nada, eu te amo na alma”. E Domingos encerrou: “Pois é, mas é raro”.