IldecirA.Lessa
Advogado
O homem contemporâneo vive em um labirinto sem saída. Ele não sabe o valor de sua ação. É incapaz de contemplar ou tomar conhecimento do que ele faz da vida. Afinal, qual a razão da vida? É o que o homem busca continuamente. A insatisfação encontrou morada no coração do homem solitário. Um novo emprego resolve, um carro novo, um novo casamento, uma nova casa. Para escapar da insatisfação, do vazio, é preciso buscar no dinheiro, no poder, na notoriedade ou, até mesmo em divertimento. Realiza-se o desejo, outro está a aguardando para ser realizado. A insatisfação e o vazio, são perenes e por isso, o homem passa a vida na busca dos bens materiais ou bens simbólicos.A inquietação domina por um querer inquieto, cego e irracional. Isso leva a acreditar que o único objetivo da vida humana é destruir a própria solidão.
O homem não consegue viver isolado, precisa da agitação, do reconhecimento, de falar sobre si mesmo. É a busca incontrolada por alguma coisa, que venha proporcionar satisfação e espantar a solidão. A melhor forma de não ficar parado é na busca de, tarefas arriscadas e difíceis; envolver em projetos; conflitos ou conquista que, na maioria das vezes, surgem com a infelicidade. Inexiste espaço para o silêncio. Prevalece a busca incontida do barulho, do ruído e da agitação. Vedado terminantemente, desligar a televisão HD, o smartphone, as comunicações intermináveis no WhatsApp, mesmo quando o homem está sozinho em casa. É a fuga sem fim do estado da solidão.
Pascal no século XVII já havia pensado sobre esse problema. Para ele, o homem é um ser agitado, pois não consegue ficar consigo mesmo, é incapaz de refletir sobre sua condição miserável e mortal. Não quer refletir sobre sua condição humana, permeada pela dor, dissolução e morte, nada o pode consolar. Na mesma linha, sugeriu Platão, o nosso espírito é uma caverna, o que falta ao homem é eternidade. Os homens são seres vazios. Vivem na busca de preencher seu mundo interior com algum entretenimento ou com algum objeto. Todo seu sentido interno se expressa pelo sensível e pelo concreto. Buscam preencher sua interioridade com todo tipo de banalidades. O sistema capitalista serviu muito bem a esse propósito. Esse sistema ofereceu ao homem um mundo de entretenimentos, prazeres e objetos para que ele possa preencher seu vazio interior, o vazio existencial. É por isso que o capitalismo sobreviveu, é por isso que ele se perpetuou. Ele impediu que o homem encarasse o vazio descomunal de sua interioridade. Qual a razão por que o homem teme tanto olhar para o seu vazio interior? Por que ele foge de si mesmo? O ser humano não é um átomo, um ser fixo, acabado, pronto e estável. Não existe uma natureza humana fixa, dado a priori. Ele vem ao mundo como uma tabula rasa, como uma folha em branco. Ele só se torna algo a partir daquilo que ele faz de si mesmo. Ele é um ser determinado pelas circunstâncias, pelas contingências da vida, condicionado no interior das práticas sociais por sua cultura. Significa dizer que ele não é nada. É um ser inacabado. É um ser vazio. O objetivo da vida, portanto, é exatamente preencher esse vazio, esse nada, que é a pura essência humana. Não há uma finalidade para vida, a não ser a morte, o nada. O homem não quer se dar conta que o nada está inscrito em nossa própria carne e em nossa própria alma. O nada surge diante do homem aniquilando todas as coisas que os rodeiam, aniquilando o próprio Eu. É o nada que retira todo o sentido da vida. O homem é o ser da morte.
A descoberta do “nada” da vida humana levaria o homem a reconhecer que a existência é um acidente, é algo casual e efêmero, e que o amanhã não poderá mais existir. O homem recusa a encarar a verdade. Sócrates, bem que tentou escapar de tudo isso, com o “conheça-te a ti mesmo”. Terminou encontrando com a morte. O homem deve refletir que, conhecimento de si mesmo implica em reconhecer a própria finitude. É o nada, que está no interior do homem, que ele não é capaz de encarar, porque o aniquilará. O que falta ao homem é consciência de sua facticidade. O homem foi lançado no mundo como um barco sem rumo. A imanência nas coisas tira a consciência do homem de sua condição finita e o condena a banalidade da vida cotidiana. É somente a consciência da condição finita do homem, é somente a consciência do nada, que o permite transcender e reavaliar a sua própria vida e comportamento, dando sentido e significados ela. O momento atual é de época de incerteza, de insegurança e de superficialidade.
O homem nesse labirinto que vive, tem dificuldade em entender a própria experiência social e não consegue dar conta da relação que há entre a vida do homem e a força que o subjuga. Por isso, o homem não percebe que os seus dramas, conflitos, medos, frustrações são em grande parte causados pelos valores de nossa sociedade ou pelas estruturas sociais que governam o homem. Por causa disso, o homem não tem uma experiência bem definida das suas próprias necessidades, não sabe o que sente ou o que verdadeiramente quer. Todos os dias o homem acorda cedo, vai para o trabalho, almoça com os outros homens, compartilhando as mesmas experiências. Quando volta o homem do trabalho para casa, conversa sobre os mesmos assuntos, faz as mesmas atividades e assiste aos mesmos programas de televisão. Aos finais de semana, o homem busca as mesmas agitações e divertimentos. Ele é incapaz de perceber que está presente uma vida fragmentada, muitas vezes degradada pelo cotidiano da labuta, das transformações econômicas e do consumo. Está sempre em movimento, em busca de um objetivo ou desejo insuflado pela sociedade. Apega-se à verdades, valores ou regras externas que não escolheu conscientemente. Como se o mundo tivesse um sentido ou um significado dado a priori. O homem é um ser despersonalizado pela cultura. Segue padrões. Vive numa Matrix, incapaz de separar a consciência da realidade. É incapaz de contemplar seu mundo interior. É incapaz de reconhecer o nada e dar sentido a sua própria vida. É o homem seguindo seu trajeto de vida, no vazio existencial, sem buscar uma outra medida, que possa o fazer sair desse labirinto de vida e, encontrar o sentido real de sua liberdade de sua finitude. Como diz Montaigne, “meditar sobre a finitude é meditar sobre a liberdade”.