* Noé Comemorável de Oliveira Neto
Tornou-se uma tradição entre os estudantes da terceira série do ensino médio os chamados “trotes” ou prendas, que são realizados em quase todas as escolas que atendem a jovens e adolescentes. Geralmente, os trotes são momentos de descontração onde os alunos se caracterizam de algo ou alguém, por algum tempo, e aproveitam esses momentos para se divertir e afastar um pouco o stress do Enem e dos vestibulares que se aproximam.
Um desses eventos “viralizou” as redes sociais nos últimos dias e, infelizmente, não foi por sua criatividade, mas sim pela falta dela. De acordo com as notícias, o trote em questão aconteceu há dois anos em uma escola da rede privada de Belo Horizonte e tinha como tema: “E se nada der certo?”.
O que gerou grande polêmica foi o fato de os alunos se vestirem de atendente de lanchonete, empregada doméstica, porteiro, motorista, gari, entre outras profissões, para expressar que “se nada der certo” na vida deles eles teriam essa profissão.
Refletindo sobre a incoerência da ação, poderíamos levantar vários questionamentos, mas vou me ater apenas a um: “o que é dar certo?”.
Infelizmente, tenho convicção de que se essa pergunta for feita em uma pesquisa, a maioria das pessoas vai dizer que alguém que deu certo é alguém famoso, ou bem sucedido financeiramente, com um bom emprego ou que ocupa um cargo de destaque na sociedade. Em um contexto mais juvenil poderiam dizer que é alguém que conseguiu a vaga em uma boa universidade ou no tão sonhado intercâmbio. Certamente, a maioria das respostas, assim como a atitude equivocada daqueles adolescentes, colocaria o sucesso atrelado a status.
Mas será que ser um destaque, construir grandes impérios ou conquistar vagas disputadíssimas é sinônimo de ter dado certo? A história, inclusive a história recente de nosso país, nos mostra que não. Vemos, diariamente, impérios desmoronando sobre seus donos, muitas vezes os levando à cadeia, ou a se tornarem foragidos ou até mesmo ao triste suicídio. E isso, certamente, não é dar certo.
Assistimos, constantemente, a uma manipulação de famílias, mídias e instituições, que levam nossos jovens a buscarem uma “profissão de sucesso”, entendendo que isso depende apenas de altos salários. E tristemente vemos jovens se tornando profissionais em determinadas áreas com as quais não possuem nenhuma afinidade, deixando de ser autor da própria história, para trilhar um caminho que não é dele, simplesmente em busca de “dar certo”.
Como consequência, cada dia mais se tem visto péssimos profissionais em todas as áreas. É o comerciário que desfaz do cliente, o empresário que maltrata o funcionário, o professor cansado de ensinar, o médico que pouco se importa com a vida – insatisfeitos com seu trabalho, com sua profissão, mas persistentes pelo ter e não pelo ser.
Não estou aqui fazendo apologia a se trabalhar “por amor”. É claro que vivemos em um mundo capitalista, onde ter condição financeira para manter saúde, moradia, educação e outras coisas básicas é necessário para se viver com dignidade. Não seria hipócrita de dizer que dinheiro, estudo e emprego estável não são importantes. O que expresso aqui é que nós devemos governá-los e não sermos governados por eles. Não são esses os fatores que determinam quem deu certo.
Acredito que dar certo é não ter de derrubar ninguém para se erguer. É ser feliz, realizado na profissão que escolheu. Dar certo é reconhecer os meus limites e os do próximo, sem ter de impor barreiras entre nós. É respeitar e ser respeitado dentro das virtudes e das limitações que cada um possui.
A atitude equivocada daqueles adolescentes nos serve de lição, para refletirmos se estamos realmente fazendo nossa vida dar certo, do jeito coerente, com ações corretas. Reflitamos! E se tudo der certo, chegaremos ao final de nossa passagem por esse planetinha azul com a nobre sensação de dever cumprido.
* Noé Comemorável de Oliveira Neto é professor da FUNEC no Centro Universitário de Caratinga e na Escola Professor Jairo Grossi. Graduado em Física pelo UNEC, com especialização em Ensino de Física pela mesma instituição e mestrado em ensino de Física pela Universidade Federal de Viçosa, atua em pesquisa voltada para a Educação de Jovens e Adultos. Apesar da formação voltada ao ensino de ciências, o professor possui algumas publicações também na área literária, com contos e poemas publicados em antologias.
Mais informações sobre o autor(a),acesse: http://lattes.cnpq.br/9593195349973608