*Wilson Guilherme Acácio
Através do Diário de Caratinga, por duas vezes, me manifestei sobre o desastre ambiental ocorrido no dia 5 de novembro em Mariana – “A lama e o drama” e “Meninos, eu vi”; este, baseado no que presenciei no local da catástrofe. Agora, volta às folhas deste prestigiado Diário de Caratinga para narrar o que presenciei em Regência, na Foz do Rio Doce, Espírito Santo, quando lá estive no último dia 12.
Como já revelei nos dois artigos anteriores, tenho acompanhado as consequências do desastre ambiental provocado pela Samarco. Visitei também algumas cidades no Vale Médio do Doce (Governador Valadares, Aimorés e Conselheiro Pena) verificando a situação das águas do rio.
Infelizmente, passados quase oitenta dias desta “ecocatástrofe”, as águas do Rio Doce, bem como as do mar, continuam muito avermelhadas por ainda seguirem recebendo a lama vinda de Mariana, há mais de 650 km!
Por ironia do destino, bem próximo à foz, deparei-me com o Centro Ecológico de Regência, onde educadores e estagiários fazem um bonito trabalho de Educação Ambiental com as crianças residentes em Regência. Lá, vimos várias placas que nos trazem mensagens positivas de preservação da natureza, coisa que, infelizmente, a Samarco destruiu!
Conversei com algumas crianças que participavam de atividades neste Centro Ecológico e, pelos seus depoimentos, detectei a tristeza delas pela situação em que se encontram as águas do rio e do mar naquele local. Conversei com alguns pescadores e, também, percebi a tristeza e a revolta deles pela tragédia provocada pela Samarco. Todas as atividades pesqueiras na área estão proibidas e os equipamentos de pesca encontram-se literalmente abandonados, com forte impacto na economia local.
Recebi lá na Foz do Doce um panfleto da Samarco intitulado “Fazer o que deve ser feito – esse é o nosso compromisso”, que faz uma apologia do que a empresa está realizando “para salvar” o desastre por ela provocado. No momento, deu-me vontade de rasgar o tal folheto, mas, não quis ser indelicado com a pessoa que me entregou. Não ficarei aqui repetindo “as besteiras” que estão escritas neste folder.
Na verdade, o que a Samarco deveria e teria que fazer era ouvir o aconselhamento do engenheiro Joaquim Pimenta de Ávila que projetou a barragem de Fundão, rompida no dia 5 de novembro. Em depoimento à Polícia Federal, Ávila afirmou que desde 2014 alertava que a situação era grave e necessitava de providências urgentes e maiores do que a Samarco estava tomando. Como se pode detectar, infelizmente, as orientações do engenheiro projetista não foram levadas em consideração pela empresa!
Trabalho com questões ambientais desde meados de 1970 e, jamais, imaginei poder e ter que investigar uma tragédia como esta. Depois de lutar por décadas pela preservação do Rio Paraibuna (Juiz de Fora) quis o destino que, agora, como integrante da diretoria do CBH-Caratinga, fazer parte da triste história deste belo rio (Doce) que, agora, “chora lágrimas de sangue” por imprudência de uma empresa capitalista que coloca o lucro acima de tudo!
Que todos os (i) responsáveis e criminosos por esta tragédia sejam, dentro da legislação em vigor, punidos exemplarmente e que os órgãos públicos sejam menos negligentes, mais responsáveis e exigentes quando da liberação das chamadas “Licenças Ambientais”, bem como por todo o processo de fiscalização. Recomendo que todos eles deem um pulo lá no Centro Ecológico de Regência para, como eu, constatar a tristeza estampada nos rostos das crianças por esta desgraça provocada pela Samarco!
*Wilson Guilherme Acácio, professor aposentado (UFJF), mestre em Geografia (UFRJ), ex-superintendente de Meio Ambiente (Prefeitura de Caratinga), vice-presidente do CBH-Caratinga. Geógrafo da Doctum.