O livro “Mosaico de Asas”, produzido por quatro autores será lançado esta semana com workshops acadêmicos
CARATINGA– “Fruto de pesquisa e experiências pessoal e profissionais, ‘Mosaico de Asas’ é um mergulho no universo do estranhamento, cuja população invisível é o retrato sem retoques da perversa realidade brasileira, profundamente marcada pelo largo e profundo fosso das desigualdades sociais”.
Assim os quatro autores Angelita Lelis, Igor Siqueira, Juarez Gomes de Sá e Maria Inês da Rocha Pena definem a obra ‘Mosaico de Asas’, que de hoje até a quinta-feira (16) será objeto de dois workshops acadêmicos, com professores e estudantes do Centro Universitário de Caratinga (Unec) e da Rede Doctum/FIC, com o objetivo de se discutir/divulgar as reflexões contidas no livro: a falta de diálogo entre aqueles que estão “do lado de lá e do lado de cá” das grades da mesma cela.
Hoje, a programação acontece a partir de 19h, no Anfiteatro ‘Professor Celso Simões Caldeira’ – do Centro Universitário de Caratinga (Unec), com professores e alunos dos cursos de Magistério. Já nos dias 25 e 26 de outubro, a partir de 19h – o debate acontece no ‘Casarão das Artes’, com professores e alunos da Rede Doctum/FIC.
A OBRA
Os autores afirmam que a desinformação só tem feito “aumentar a esquizofrenia desse Corpo Social doente” e defendem a Educação como “ponte que nos tire do preconceito e nos conduza à consciência humanizadora”. E a partir da crítica ao sistema prisional brasileiro, ‘Mosaico de Asas’ sugere uma avaliação social madura sobre “equívocos cometidos pelo Estado em seu papel punitivo, previsto legalmente da mesma forma que legitimado pelos clamores da sociedade. Por sua vez, ela (nós) tem clamado por ‘Justiça ou Vingança’?”.
Na reflexão de que “ao denunciar a nossa ignorância quanto às próprias mazelas sociais”, afirmando ser a temática prisional uma das “mais tristes”, o trabalho apresenta sugestões no sentido de a sociedade ter a ousadia de pelo menos tentar o exercício de um olhar novo, na direção oposta à usual, ao lugar comum “(e perigoso) do discurso de bandido bom é bandido morto.” E reforçam a proposta do Modelo APAC, cuja filosofia é “matar o crime sem matar o criminoso”.
“Lembrando que ao proferir sentença determinado o encarceramento de uma pessoa – condenada ou aguardando julgamento- o Estado (representado pelo Juiz, em nome da Sociedade) não pode ir um milímetro que seja além da Lei. Assim, ‘apenas’ o direito à Liberdade pode ser suspenso”, acrescentam os autores.
O “cerne” da discussão trazida pelo livro é exatamente falar sobre os direitos que, “a continuarem sendo desrespeitados, criam uma falsa sensação de Justiça, mantendo a sociedade refém do medo E ela precisa enfrentar esse medo de frente”, defendem os autores de ‘Mosaico de Asas’.
Contendo uma breve introdução e cinco capítulos – além de quatro anexos – ‘Mosaico de Asas’ vai da “marginalidade à seletividade” em sua abordagem do sistema prisional brasileiro, fala da “(in)condição feminina nos presídios”, adentra o “campo minado dos direitos humanos” da pessoa privada de liberdade, e sugere um conjunto de medidas –tendo por referência o presídio de Caratinga- consideradas “simples e possíveis” pelos autores.
Os quatro autores ainda acreditam que estas medidas em nada diminuem a autoridade estatal, muito pelo contrário, sustentam os autores, “na medida em que estamos defendendo políticas públicas em setores como Educação, Trabalho e Saúde – por exemplo-, sem perder de vista o engajamento social no desafio da desconstrução de preconceitos, a partir de um viés humanista na relação com as pessoas privadas de liberdade”.
Mesmo afirmando um “caos instalado”, os autores mantêm a esperança – “não a espera à beira do caminho, mas crença na mudança feita enquanto se caminha. Como a que tem sido realizada pelo modelo APAC, alternativa, sim, ao sistema prisional. E são experiências como a vivenciada por Caratinga que nos permitem sustentar, repetindo o lema APAC: Somos todos recuperandos! Todos, inclusive a sociedade”.
DEBATE
Os autores pretendem fomentar o debate, especialmente junto à comunidade acadêmica no entorno da Comarca – onde aproximadamente 600 pessoas estão privadas de liberdade. A expectativa é a redação da “Carta de Caratinga”.
O documento nascerá dessas discussões e será encaminhado às autoridades do Estado. Ele conterá questões levantadas pelo livro, entre elas a defesa da criação na região de uma APAC “feminina, uma Unidade Básica de Saúde no presídio de Caratinga e a garantia do ensino médio para as mulheres que lá cumprem pena.
Sobre os debates que acontecerão esta semana, os autores enfatizam que é vital o papel das universidades no processo de “reeducação social”, a partir da formação de profissionais que tenham a noção exata da realidade prisional e do quanto ela espelha a “exclusão social, pela qual estamos todos contaminados, independente de estarmos do lado de lá ou do lado de cá de uma cela”.